Apelação Criminal Nº 0000393-98.2012.4.03.6105/sp

Penal. Apelação criminal. Tráfico transnacional de drogas: art. 33, caput, c/c art. 40, i da lei 11.343/06. Materialidade, autoria e dolo comprovados. Condenação mantida. Dosimetria da pena: natureza e quantidade da droga: pena-base majorada. Confissão: prisão em flagrante: irrelevância: fundamento da condenação: aplicação da atenuante. Causa de aumento do inc. I do art. 40 da lei 11.343/06: distância entre países: ausência de provas de distribuição da droga por mais de um pais: aplicação da causa de aumento da transnacionalidade no patamar mínimo. § 4º do art. 33 da lei 11.343/06: inaplicabilidade aos “mulas“: provas de envolvimento com organização criminosa. Exclusão. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e direito de recorrer em liberdade: impossibilidade: vedação decorrente de preceito constitucional e de lei especial: cf art. 5º, xliii, art. 2º, ii, da lei 8.072/90, arts. 33, § 1º, 34, 37 e 59 da lei 11.343/06. 1 . Comprovadas nos autos a materialidade, autoria e dolo do crime previsto no art. 33, caput, c/c o art. 40, I, da Lei 11.343/06 praticado pela ré, presa em flagrante no Aeroporto Internacional de Viracopos/SP, quando prestes a embarcar em vôo para Lisboa/Portugal, trazendo consigo, no interior do organismo, cápsulas contendo 1.220 g. de cocaína. 2 . Condenação mantida. 3 . O julgador, na individualização da pena, deve examinar detidamente os elementos que dizem respeito ao fato, segundo os critérios estabelecidos pelo artigo 59 do CP. No caso de tráfico de drogas, há ainda que observar o artigo 42 da Lei 11.343/06, o qual determina expressamente que o Juiz, na fixação da pena, deve considerar, com preponderância sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do CP, a natureza e quantidade da droga, bem como a personalidade e conduta do agente. Apesar da primariedade e bons antecedentes, considerando-se a natureza e quantidade da droga que transportava, bem como as circunstâncias dos fatos, em que a droga foi ingerida causando sérios riscos à vida, justifica-se a aplicação da pena-base em um ano acima do mínimo lega. Pena-base elevada para seis anos de reclusão. 4 . Ainda que a ré tenha sido presa em flagrante e que a autoria criminosa seja conhecida, a atenuante da confissão deve ser aplicada quando efetivamente confessou os fatos perante a autoridade judicial, contribuindo para a formação do convencimento do Juiz acerca da autoria delitiva. Precedentes. Pena reduzida para cinco anos e seis meses de reclusão. 5 . Comprovada a transnacionalidade do tráfico, incide a causa especial de aumento de pena do inc. I do art. 40 da lei de drogas. Porém. a mera distância entre países não justifica a aplicação em patamar acima do mínimo, admitida apenas nos casos em que a droga deixe o território nacional para ser distribuída em mais de um país no exterior. O legislador previu, nos incisos desse artigo, uma série de causas de aumento de pena, que justificam um aumento variável de um a dois terços, porém não estabeleceu os parâmetros para a quantificação do percentual. O índice de aumento deve ser calculado de acordo com as circunstâncias especificamente relacionadas com a causa de aumento, (e não às do crime), e variar de acordo com a quantidade de majorantes que estiverem presentes, de forma que na incidência de apenas um inciso não se justifica a elevação do percentual mínimo. Caso em que o réu foi preso com a droga ainda em território brasileiro e, em que pese sua intenção de levá-la a outro continente, não está comprovado que pretendesse difundi-la em mais de um país. Mantida a aplicação da causa de aumento em sexto, elevando a pena para 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão. 6 . Excluída a aplicação da causa de redução de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. Ainda que não se dedique a atividades criminosas e não haja notícias de ter praticado anteriormente algum crime, a ré, ao transportar a droga, integrou, de maneira voluntária, uma estrutura criminosa voltada à prática do tráfico transnacional de drogas, pois promoveu a conexão entre os membros da organização, de forma que não preencheram um dos requisitos necessários para gozar do benefício, que é o de “não integrar organização criminosa“. 7 . Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. A conversão não se mostra como medida social recomendável, diante do estímulo para a prática do tráfico de drogas, crime que causa grave lesão ao bem jurídico tutelado (saúde pública), sendo insuficiente para a prevenção e repressão do delito. Ainda que se admita a substituição das penas pelo fato de os estrangeiros serem iguais aos brasileiros perante a Constituição Federal, para a concessão será necessário que não estejam em situação irregular no país e que nele possuam residência fixa. 8 . O Plenário do STF declarou, através do “habeas corpus“ 97256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos“ contida no parágrafo 4º do art. 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão “vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos“, constante do art. 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição, mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão. 9 . Caso em que as particularidades do crime não recomendam a substituição, tendo em vista o grau elevado de culpabilidade da ré, com provas contundentes de que participou de uma organização criminosa complexa. 10 . A proibição da liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e assemelhados, decorre da própria proibição de fiança imposta pela CF, art. 5º, XLIII. O art. 2º, II, da Lei nº 8.072/90 nada mais fez do que atender à norma constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos. 11 . A Lei nº 11.343/2006, que é específica para os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, no artigo 44 estabelece que os crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º e 34 a 37 são insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória. Dispõe ainda o artigo 59 da mesma lei que, nos crimes de tráfico , o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória. Contudo, não tem o direito de recorrer em liberdade o acusado que permaneceu justificadamente preso durante a instrução criminal, por força de prisão em flagrante ou preventiva, ainda que seja primário e de bons antecedentes. Sobrevindo sentença penal condenatória, um de seus efeitos é a manutenção da custódia do réu para apelar, o que não constitui ofensa à garantia constitucional da presunção de inocência, nos termos da Súmula 09 do STJ, de forma que eventuais condições favoráveis do agente, como primariedade e bons antecedentes, não são garantidoras de direito subjetivo à liberdade provisória, quando outros elementos recomendam a prisão. 12 . A vigência da Lei nº 11.464/07, que deu nova redação ao artigo 2º, II, da Lei 8.702/90 afastando a vedação à liberdade provisória aos crimes equiparados a hediondos, não revogou o disposto no artigo 44 da lei 11.343/06 em relação à liberdade provisória, já que a Lei 11.343/06 se trata de legislação especial, que expressamente veda essa concessão aos acusados de tráfico de drogas, não se havendo que falar que o artigo 44 da lei de drogas foi derrogado tacitamente pela Lei 11.464/2007, ou em inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, uma vez que é fruto da regra constitucional prevista no art. 5º, inc. XLIII da Constituição Federal, e de uma política criminal mais rigorosa de repressão aos crimes de tráfico . 13 . Caso em que a acusada foi presa em flagrante e assim permaneceu durante toda a instrução criminal. Ademais, é estrangeira, sem vínculos com o distrito da culpa, com fortes possibilidades de se evadir se for solta, razão pela qual sua prisão tem por finalidade assegurar a aplicação da lei penal e o próprio resultado do processo, com o cumprimento integral da pena. 14 . Apelação ministerial a que se dá parcial provimento para aumentar a pena-base da ré e excluir, da dosimetria da pena, a causa de redução do § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06. 15 . Apelação da defesa a que se dá parcial provimento para reconhecer a atenuante da confissão espontânea, fixando a pena da ré definitivamente em 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e pagamento de 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa).

Rel. Des. Luiz Stefanini

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