APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001056-33.2010.4.03.6003/MS

REL. DES. ANDRÉ NEKATSCHALOW -  

Penal. Processo penal. Delitos do art. 334, § 1º, b, do código penal, e do art. 183 da lei n. 9.472/97. Transporte de cigarro. Tipificação. Atividade de telecomunicação. Art. 70 da lei n. 4.117/62 e art. 183 da lei n. 9.472/97. Atividade clandestina de telecomunicação. Crime formal. Art. 70 da lei n. 4.117/62. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Materialidade. Autoria. Dosimetria. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Exasperação da pena-base do delito de contrabando. Imposição de regime inicial semiaberto. Substituição da pena privativa de liberdade. Não cabimento. Apelação da defesa desprovida. Apelação da acusação parcialmente provida. 1. A alínea b do § 1º do art. 334 do Código Penal dispõe que incorre na pena prescrita para o delito de contrabando ou descaminho aquele que praticar fato assimilado, em lei especial, a contrabando ou descaminho. Por sua vez, o art. 3º, c. c. o art. 2º, ambos do Decreto n. 399/69 equipara a esse crime a conduta de transportar cigarro de procedência estrangeira. Por essa razão, a jurisprudência dispensa, para configuração do delito, que o agente tenha antes participado da própria internação do produto no País. Precedentes. 2. O exercício de atividade de telecomunicação desprovida de adequada autorização, concessão ou permissão constitui ilícito penal. O fato era tipificado pelo art. 70 da Lei n. 4.117, de 27.08.62, e atualmente pelo art. 183 da Lei n. 9.472, de 16.07.97, cuja aplicação decorre da revogação dos dispositivos da lei anterior, nos termos do art. 215, I, da nova lei. Cumpre esclarecer que a Lei n. 4.117/62 foi revogada "salvo quanto a matéria penal não tratada" na Lei n. 9.472/97, como diz o último dispositivo mencionado. Logo, como há tipo penal que rege a matéria, entende-se que o anterior ficou superado, incidindo tão-somente quanto aos fatos ocorridos anteriormente à nova lei, por ser esta mais gravosa (CP, art. 2º). Grosso modo, telecomunicações significa comunicação à distância; radiodifusão seria, assim, tal comunicação procedida mediante ondas eletromagnéticas. Seria difícil sustentar que a comunicação feita por rádio, ainda que o receptor não possa responder, não encerre um serviço de telecomunicação. Assim, o uso de equipamento de estação de serviço limitado privado configura atividade de telecomunicação, uma vez que se trata de instrumento hábil a transmitir, emitir ou receber sons por processo eletromagnético, não exigindo o tipo penal que o sujeito ativo seja empresa que explore economicamente o ramo das telecomunicações. Precedentes. 3. O crime do art. 183 da Lei n. 9.472/97 tem natureza formal, de modo que prescinde de resultado naturalístico para a sua consumação. É despiciendo, assim, que a conduta do agente cause efetivo prejuízo a outrem. O delito se consuma com o mero risco potencial de lesão ao bem jurídico tutelado, qual seja, o regular funcionamento do sistema de telecomunicações, bastando para tanto a comprovação de que o agente desenvolveu atividade de radiocomunicação, espécie de telecomunicação, sem a devida autorização do órgão competente. Precedentes. 4. Não é aplicável o princípio da insignificância ao crime do art. 70 da Lei n. 4.117/62, pois, independentemente de grave lesão ou dolo, trata-se de crime de perigo, com emissão de sinais no espaço eletromagnético à revelia dos sistemas de segurança estabelecidos pelo Poder Público. O simples funcionamento de aparelho de telecomunicação sem autorização legal, independentemente de ser em baixa ou alta potência, coloca em risco o bem comum e a paz social. Precedente. 5. Materialidade e autoria comprovadas. 6. Contrabando. A culpabilidade e a personalidade do réu, voltada ao cometimento de delitos - uma vez que ele já foi preso em flagrante em duas outras ocasiões, também transportando cigarros e utilizando rádio de maneira irregular - são fatores que lhe são desfavoráveis. Note-se, entretanto, que mesmo na hipótese de tais fatos não serem considerados, cumpre majorar a pena, em razão da elevada quantidade de cigarros apreendidos (mil caixas) e da estratégia de servir-se de aparelho de comunicação para baldar a fiscalização, revelando sofisticação no modo de perpetrar o delito. Assim, a pena-base deve ser exasperada. 7. Atividade clandestina de telecomunicação. A pena aplicada deve ser mantida. Embora o acusado tenha confessado a prática do delito, tal atenuante não tem o condão de reduzir a reprimenda abaixo do mínimo legal. Não há elementos indicativos de que o réu tem significativa capacidade econômica. 8. Embora o tempo das condenações autorize o estabelecimento do regime inicial aberto, o art. 59 do Código Penal também deve ser considerado neste momento, nos termos do art. 33, § 3º, da mesma lei. Assim, pelos motivos acima, imponho ao acusado regime mais gravoso para o início de cumprimento das penas, qual seja, o semiaberto. Da mesma forma, incabível a substituição da pena privativa de liberdade, nos termos art. 44, III, do Código Penal. Como consequência do estabelecimento do regime inicial semiaberto, não merece acolhida o pedido ministerial relativo ao restabelecimento da prisão preventiva. 9. Recurso da defesa improvido. Recurso da acusação parcialmente provido.    

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