Penal. Apelações criminais. Tráfico de drogas. Flagrante preparado: inocorrência. Crime impossível: inocorrência. Materialidade e autoria delitiva demonstradas. Desclassificação para uso: rejeitada. Causa de diminuição de pena do traficante ocasional: afastada. Associação para o tráfico: não caracterizada. Elevação da pena-base. Redução da pena aquém do mínimo: inviável. Internacionalidade delitiva. Delação premiada: inocorrência. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos: descabimento. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Regime inicial fechado: possibilidade. 1. Apelações criminais interpostas pela Acusação e pela Defesa contra sentença que condenou os réus como incursos no artigo 33 c/c o artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006, às penas de 04 anos, 08 meses e 20 dias de reclusão e 05 anos, 08 meses e 01 dia de reclusão, bem como absolveu os réus da imputação quanto ao crime de associação para o tráfico, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. 2. Rejeitada a preliminar de nulidade do flagrante preparado, retardado ou controlado. O flagrante retardado ocorre quando a autoridade policial já tem o conhecimento do delito e retarda a prisão. Não há que se falar em flagrante retardado ou ação controlada, porque a polícia não sabia se tratava realmente de tráfico de drogas. 3. Não procede a alegação de ocorrência de crime impossível em decorrência do monitoramento policial. O crime impossível somente se caracteriza quando o agente jamais poderia consumar o crime pela ineficácia absoluta do meio empregado ou pela absoluta impropriedade do objeto material. A conduta criminosa já estava consumada nas modalidades guardar ou trazer consigo. Eventuais vícios do inquérito policial não se projetam na ação penal para contaminá-la. Precedentes. 4. A materialidade e a autoria delitivas encontram-se demonstradas pelas provas produzidas nos autos, sob o crivo do contraditório e ampla defesa. 5. Não comporta acolhimento o pleito de desclassificação do crime de tráfico de drogas para uso. O acusado não se declarou dependente de drogas, manifestando seu desejo de permanecer calado. Ademais, a quantidade de entorpecente apreendida em seu apartamento em muito se distancia daquela transportada para consumo próprio, razão pela qual não se enquadra no disposto no artigo 28 da Lei 11.343/2006. 6. Afastada a causa de diminuição de pena do traficante ocasional. A atividade daquele que age como “mula“, transportando a droga de sua origem ao destino, na verdade pressupõe a existência de uma organização criminosa, com diversos membros, cada qual com funções específicas. O acusado faz parte da organização criminosa, sendo o responsável pela estadia da corré no Brasil, pela entrega da droga e troca de passagem aérea da acusada para garantir seu o retorno ao exterior, tendo inclusive entregue telefone celular para manter contato com ela, tudo a serviço da organização maior. Ainda havia a participação da corré, que atuou como “mula“ para transportar a droga para o exterior, e uma terceira pessoa no destino iria recebê-la. 7. Não comporta acolhimento o pedido de condenação do réu pelo crime de associação para o tráfico. Para a caracterização do crime tipificado no artigo 35 da Lei de Drogas é necessária a presença dos seguintes elementos: duas ou mais pessoas; acordo prévio dos participantes; vínculo associativo duradouro; finalidade de traficar substâncias entorpecentes ou que causem dependência física ou psíquica. O conjunto probatório é insuficiente para a demonstração de que tenha havido associação estável entre o apelado e a corré ou o indivíduo não identificado, ou sua efetiva ligação com o tráfico de drogas. 8. No crime de tráfico de drogas, a natureza e a quantidade da substância, a personalidade e a conduta social do agente devem ser considerados na fixação das penas, com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Código Penal. Quanto maior a quantidade da droga traficada maior o potencial lesivo e o perigo de dano à saúde pública, a justificar uma maior reprovabilidade da conduta empreendida e, consequentemente, a elevação da pena-base. Precedentes. 9. Inviável a minoração da pena aquém do mínimo, porque válido o entendimento sumulado nº 231 do Superior Tribunal de Justiça que aduz que “a incidência da circunstância atenuante não pode coincidir à redução da pena abaixo do mínimo legal“. Precedente do Supremo Tribunal Federal. 10. Presente a causa de aumento da internacionalidade delitiva, pois patente a intenção da apelante de internar a droga em território estrangeiro. Configura-se a internacionalidade do tráfico quando o agente está transportando o entorpecente e prestes a sair do território nacional. Precedentes. 11. Para a concessão da delação premiada, faz-se imprescindível a eficácia da delação, com a indicação precisa de demais autores do crime aliada à efetiva facilitação ao desmantelamento da estrutura criminosa, não bastando meras indicações do réu para reconhecer o benefício do perdão judicial ou da redução da pena. 12. Os §4° do artigo 33 da Lei 11.343/2006 não deve ser interpretado de modo a possibilitar a sua aplicação às assim chamadas “mulas“ do tráfico de drogas, porquanto tal interpretação favoreceria sobremaneira a operação das organizações criminosas voltadas para o tráfico internacional, o que certamente contraria a finalidade do citado diploma legal, que visa à repressão dessa atividade. Há elementos que permitem concluir que a ré se dedicava a atividades criminosas. Contudo, à míngua de recurso da acusação quanto ao ponto e em virtude da proibição da reformatio in pejus, mantida a causa de diminuição no patamar da sentença. 13. A acusada não faz jus à substituição da pena de reclusão por penas restritivas de direitos, uma vez que não preenchido o requisito do inciso I do artigo 44 do Código Penal. 14. Apesar do regime inicial ser estabelecido, a princípio, em função da quantidade da pena, nos termos do §2º do artigo 33 do Código Penal, o §3º do citado dispositivo estabelece que “a determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código“. Foram consideradas desfavoráveis as circunstâncias do artigo 59 do CP, fixando a pena-base em patamar superior ao mínimo legal, e dessa forma não há que se falar em ilegalidade no estabelecimento do regime inicial fechado. 16. Apelos da Defesa improvidos. Apelo da Acusação parcialmente provido.
Rel. Des. Márcio Mesquita
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