APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007086-35.2010.4.03.6181/SP

RELATOR: DES. WILSON ZAUHY -  

DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. ESTELIONATO. FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONSUNÇÃO DO CRIME DE FALSO PELO ESTELIONATO. OCORRÊNCIA DE CONSUNÇÃO DO CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO PELO CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS NEGATIVAS DO ARTIGO 59 DO CP. OCORRÊNCIA DE CONCURSO MATERIAL NOS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA. EMENDATIO LIBELLI. RECURSO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO. APELAÇÃO DEFENSIVA IMPROVIDA. 1. O réu foi denunciado em razão de ter falsificado documentos públicos e utilizado alguns deles para a prática de estelionato em detrimento de empresas privadas. 2. Imputado à parte ré a prática de estelionato, falsificação de documento público e falsificação de selo ou sinal público (artigo 171, caput, artigo 296, § 1º, III, e artigo 297, todos do Código Penal), todos em concurso formal e de forma continuada (artigos 70 e 71 do Código Penal). 3. Materialidade, autoria e dolo devidamente comprovados no curso da instrução criminal. 4. Quanto ao crime de estelionato comprovam-no os ofícios falseados de fls. 71, 112/113 e 127/128, mais o depoimento de Roberto Eliasquevici (fls. 761/762), que comprova que a empresa de táxi aéreo para a qual trabalhava foi induzida a erro para fazer crer que ROBERTO exercia função pública de destaque, porém sigilosa. Os prejuízos decorridos de referidos crimes encontram-se documentados a fls. 91, 95, 97, 101, 136/137, 362 e 364/365. 5. Restou devidamente constatada a falsidade dos documentos de fls. 71, 108, 109, 110/111, 112/113, 114/115, 116/120, 121/123, 127, 129/130 e 131/134, inclusive em razão da conclusão do laudo pericial de fls. 377/379. 6. O próprio réu confessou os fatos criminosos em sede policial e em juízo, tendo asseverado que inventou um suposto Procurador-Chefe da Fazenda Nacional em São Paulo, com o nome de "Edson Frias Pinto". 7. Não há que se falar em absorção do crime de falsidade pelo estelionato. Do interrogatório do réu, resta cristalino que o réu confeccionou os documentos citados para a prática da falsidade ideológica, não sendo seu objetivo final a prática de crime contra o patrimônio. A potencialidade lesiva dos ofícios utilizados para reserva de transporte e estadia restou exaurida nos estelionatos praticados. Não restou exaurida a potencialidade lesiva do contrato de trabalho de assessoria jurídica e do parecer atestando a dispensa de licitação para sua contratação, bem como das autorizações de fls. 108/109. 8. Quanto aos crimes de falsificação de sinal público e falsificação de documento público, na esteira do quanto asseverado pelo juízo de origem, os fatos enquadrados no primeiro crime encontram-se absorvidos pelo segundo, na medida em que toda documentação apreendida com o réu, tratam-se de documentos públicos contrafeitos íntegros, sendo a falsificação de sinais e carimbos públicos meios pelos quais o acusado se utilizou para a confecção da documentação falsa. A contrafação de sinais públicos e carimbos perpetrados pelo réu serviram-se à falsificação, no todo, de documento público, consoante previsto no caput do artigo 297 do Código Penal, restando, portanto, o crime do artigo 296 do Código Penal absorvido por aquele, mais amplo. O MPF não aponta critério nítido de distinção acerca do que constituiria documento público, para fins de enquadramento num ou noutro tipo penal. Todos os documentos podem ser entendidos como documentos públicos, posto que dotados de timbre, carimbo e assinatura, sendo íntegros e completos em suas finalidades falseadas, a despeito em dois terem sido digitados e impressos por meios informáticos e outros dois serem manuscritos. 9. O quanto descrito na denúncia enquadra-se no caso de concurso material (art. 69 do CP), e não formal (art. 70 do CP). Com efeito, o réu elaborou parte da documentação em momento prévio, com o fito de demonstrar a familiares e amigos um suposto sucesso profissional e financeiro derivado de influência político-social, tendo cometido os crimes de estelionato quase que como elementos acidentais, uma forma prática encontrada para dar mais concretude às falsidades inseridas no papel. Extrai-se da mesma descrição fática a prática de crimes diversos, com objetos jurídicos diversos, cometidos em momentos distintos, de tal sorte que o enquadramento no instituto do concurso material é de rigor, posto que presente recurso do órgão acusador, configurando-se caso de emendatio libelli, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal. Precedentes do C. STJ. 10. Dosimetria. Estelionato. A pena-base deve ser fixada em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 30 (trinta) dias-multa, ante a culpabilidade, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime - quatro circunstâncias do artigo 59 do Código Penal. Ausentes agravantes, presente a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, d, do CP), deve ser a pena reduzida em 1/6 (um sexto), para 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa. Dada a reparação do dano (art. 16, do CP), reduzida em 1/3 (um terço), para 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa. Configurada a Continuidade delitiva (art. 71, do CP), dado o número de infrações cometidas (04), incrementada a pena em 1/4 (um quarto), para 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão e 20 (vinte) dias-multa. O valor do dia-multa deve ser fixado em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, dada a ausência de elementos para inferir a capacidade financeira do réu. Pena definitivamente fixada em 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente. Falsificação de documento público. A pena-base deve ser fixada em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa, ante os motivos do crime - uma circunstância do artigo 59 do Código Penal. Ausentes agravantes, presente a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, d, do CP), deve ser a pena reduzida em 1/6 (um sexto), para 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Configurada a Continuidade delitiva (art. 71, do CP), dado o número de infrações cometidas (02), incrementada a pena em 1/6 (um sexto), para 02 (dois) anos, 05 (cinco) meses e 05 (cinco) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa. O valor do dia-multa deve ser fixado em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, dada a ausência de elementos para inferir a capacidade financeira do réu. Pena definitivamente fixada em 02 (dois) anos, 05 (cinco) meses e 05 (cinco) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente. Cúmulo material. Dada a ocorrência de concurso material entre os crimes praticados, nos termos do artigo 69 do Código Penal, devem ser somadas as penas aplicadas a cada crime, totalizando 04 (quatro) anos, 06 (seis) meses e 05 (cinco) dias de reclusão e 31 (trinta e um) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente. 11. Fixado o regime inicial semiaberto de cumprimento de pena, em consonância com o artigo 33, §2º, "b", do Código Penal. Afastada a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, dada a ausência dos requisitos autorizadores do artigo 44 do Código Penal após a revisão da condenação. 8. Apelação da defesa improvida. Apelação ministerial parcialmente provida.  

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