RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA -
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE CONCUSSÃO. NULIDADE DE PROVAS. FLAGRANTE PREPARADO. CRIME IMPOSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR AFASTADA. INTERROGATÓRIO VALIDAMENTE REALIZADO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI 11.719/2008. TESTEMUNHA NÃO LOCALIZADA: FALTA DE INTIMAÇÃO DA DEFESA. EXPEDIENTE PROTELATÓRIO. PENA DE MULTA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO. 1. Apelações criminais da acusação e da defesa contra sentença que condenou os réus como incursos nas penas do artigo 316 do Código Penal. 2. Nulidade de provas. Flagrante esperado. Inocorrência. O crime de concussão de consumou com a mera exigência por parte dos réus da vantagem indevida, antes mesmo da gravação do vídeo. Depreende-se da gravação audiovisual que os réus já estavam esperando o pagamento da alegada "ajuda de custo" e que os acusados queriam receber os valores em espécie, não em cheque. 3. Não houve instigação pela vítima ou pelos policiais para a prática do ilícito por parte dos réus, pois eles já o havia cometido quando da exigência dos valores, sendo a entrega do numerário mero exaurimento do crime do artigo 316 do CP. Crime impossível não configurado. Preliminar afastada. 4. Rejeitada preliminar de nulidade do interrogatório policial, pois antes de serem formalmente interrogados, aos acusados tomaram ciência dos direitos constitucionais. 5. Inocorrência de cerceamento de defesa, pois a defesa teve acesso à mídia antes da prolação da sentença. Ademais, seu conteúdo já era de conhecimento da defesa, tendo a ré assistido ao vídeo quando de seu interrogatório na fase policial, constando ainda a transcrição do diálogo nos autos. Acrescente-se que conteúdo da transcrição se coaduna com o vídeo constante nos DVDs. 6. Desnecessidade de as transcrições dos diálogos captados serem realizadas por peritos judiciais, diante da não determinação legal para a transcrição por perito oficial. 7. A orientação pretoriana é no sentido de ser despicienda a realização da transcrição integral de todas as gravações. 8. Rejeitada a preliminar de nulidade, ao argumento de não ter sido o interrogatório do réu realizado após a oitiva das testemunhas. O interrogatório foi realizado anteriormente à vigência da Lei nº 11.719/2008, sendo absolutamente regular porquanto realizado de acordo com o rito processual então vigente. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. 9. Rejeitada preliminar de nulidade ao argumento de que não houve desistência nem desinteresse na produção da prova, causando prejuízo à defesa. Ao contrário do alegado pela defesa, a acusada não compareceu pessoalmente em audiência, mas somente o representante do MPF e os defensores nomeados para o ato, à vista da ausência dos defensores constituídos. Ademais, intempestiva a manifestação da defesa. Desarrazoado prolongar o andamento do processo à procura de testemunha que comparece esporadicamente no endereço indicado. Precedentes. 10. Tipicidade da conduta. Restou comprovado nos autos que os acusados exigiram o pagamento de R$ 2.500,00, supostamente a título de ajuda de custo, a fim de que, além de terem custeadas despesas do trabalho, omitissem atos de ofício, consistente em impor as devidas sanções ou realizar providências diante das irregularidades cometidas pelo frigorífico. Observa-se do diálogo travado entre os acusados e a vítima que houve sim a efetiva exigência dos valores para que a empresa não fosse devidamente fiscalizada, exigindo ainda os valores devidos pela administração anterior do frigorifico. 11. Desde o ano de 1991 há a orientação do CIPOA de que a cobrança de ajuda de custo baseado no artigo 102 do Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal - RIISPOA (Decreto n . 30.691, de 29/03/1952) para a alimentação e moradia é indevida. 12. Não obstante a acusada JULIANA afirmar que tinha valores em atraso a receber, depreende-se dos autos que a acusada não exigia apenas o pagamento da ajuda de custo e das verbas salariais atrasadas, mas também exigia valores, juntamente com o acusado Djalma, para que a empresa não fosse autuada por conta de irregularidades do frigorifico, tal como a inserção de água e gelo na mercadoria por eles produzida, sendo esse valor dividido entre os acusados. 13. A pena-base deve ser fixada acima do mínimo legal, tendo em conta as circunstâncias que envolveram a prática do fato e as consequências do crime. Com efeito, as atitudes perpetradas pelos acusados merecem uma reprovação social maior que o mínimo legal estipulado. As circunstâncias em que o crime foi praticado ensejam um aumento na pena-base, uma vez que, além de exigirem a vantagem indevida, já caracterizando assim o crime de concussão, os acusados efetivamente receberam os valores da vitima e efetuaram a divisão do numerário entre si. Verifico, igualmente, que a consequência de suas ações foi de intensa relevância, pois os acusados exigiam o recebimento de vantagem indevida para acobertar as fraudes da empresa por eles fiscalizada em detrimento aos consumidores de frangos. 14. Agravante do artigo 62, I, do CP configurada. Oo acusado Djalma tinha papel de liderança sobre a acusada Juliana, pois era ele quem marcava encontros, negociava valores e fazia as ameaças à vítima, e Juliana acompanhava a negociação. 15. A aplicação da pena de multa enseja a imposição de um valor pecuniário de caráter penal bastante para a censura do comportamento praticado, sendo que, para a estipulação do valor da pena de multa, deve ser observada a situação do réu, conforme o artigo 60 Código Penal. 16. Merece reparo a pena substitutiva consistente na limitação de fim de semana, uma vez que a pena de prestação pecuniária é mais conveniente ao caso concreto, pois, por se fundar em valor econômico a ser suportado pelos réus, se mostra a alternativa mais adequada para atingir as finalidades preventiva e repressiva deste tipo de crime.
Para ler o documento na íntegra, clique aqui!