APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007209-69.2007.4.03.6106/SP

REL. DES. MÁRCIO MESQUITA

Penal. Apelação criminal. Apropriação indébita previdenciária. Preliminar de ausência de processo administrativo rejeitada. Alegação de inépcia da denúncia após a prolação da sentença: preclusão. Cerceamento de defesa: inocorrência. Materialidade a autoria comprovadas. Dolo específico: inexigibilidade. Estado de necessidade ou inexigibilidade de conduta diversa: não demonstrados. Recurso desprovido. 1. Apelação da Defesa contra sentença que condenou os réus como incursos no artigo 168-A, §1º, inciso I, na forma do artigo 71, do Código Penal às penas de 02 anos e 08 meses de reclusão. 2. Consta da representação fiscal para fins penais que o débito foi levantado com base, exclusivamente, em valores declarados em GFIP - Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social. Se o contribuinte apresenta a GFIP, reconhece a obrigação de pagar a contribuição declarada. Se esta não for paga integralmente, é o quanto basta para a inscrição do débito em dívida ativa, independentemente de notificação, processo administrativo ou qualquer outra formalidade. A notificação do contribuinte somente se fará necessária no caso de o Fisco discordar dos valores ou de outros elementos ou circunstâncias declaradas pela contribuinte, hipótese em que deverá efetuar o lançamento de ofício das diferenças que entender devidas. Precedentes.  3. No caso dos autos, não houve discordância do Fisco com os valores declarados em GFIP pela empresa devedora. Com as apresentações das GFIPs relativas a cada competência o crédito tributário já se encontrava definitivamente constituído. Sem qualquer substância a alegação de ausência de processo administrativo - já que os valores foram apurados com base em declarações da própria empresa, que apesar disso foi devidamente notificada e não apresentou qualquer impugnação, tanto que houve inscrição em dívida ativa. 4. A prova documental obtida no processo administrativo, são submetidas ao contraditório diferido, podendo as partes sobre elas manifestarem-se na fase judicial. Assim, a condenação baseada em prova documental produzida na fase investigativa não é pautada exclusivamente em elementos colhidos na investigação, posto que o artigo 155 do CPP ressalva expressamente as provas "cautelares, não repetíveis e antecipadas". E as provas documentais são provas, pela sua própria natureza, irrepetíveis, mas que, no entanto, são submetidas ao contraditório judicial. 5. Os documentos produzidos no processo administrativo foram submetidos ao contraditório no processo penal, podendo os réus examiná-los e sobre eles livremente se manifestar. E não houve, por parte dos réus, nenhuma argüição de falsidade ou inexatidão, formulada de forma específica, com relação a qualquer documento que seja produzido na fase investigativa.  6. Rejeitada alegação de inépcia da denúncia. Descabida a alegação de inépcia da denúncia após a prolação da sentença condenatória, em razão da preclusão da matéria. Precedentes. 7. Ainda que se entenda que a argüição é de nulidade da própria sentença condenatória, não merece acolhimento. Tratando-se de crime societário, como o do artigo 168-A do Código Penal, não se pode exigir que o órgão de acusação tenha, no momento de oferecimento da denúncia, condições de individualizar a conduta de cada co-réu, eis que tal participação somente será delineada ao cabo da instrução criminal, sendo devidamente considerada na r. sentença apelada. Precedentes. 8. Em se tratando do crime tipificado no artigo 168-A do Código Penal, a prova pericial é desnecessária para a comprovação da materialidade do delito. O crime se configura com o não repasse com o não repasse, à Previdência Social, das contribuições descontadas dos segurados empregados, não sendo portanto exigível o exame de corpo de delito, a teor do artigo 158 do Código de Processo Penal. Precedentes. 9. A não determinação de prova não implica ilegalidade, na medida em que a aferição da necessidade da produção da prova é mister do juiz da causa, que tem ampla visão sobre o desenrolar da ação penal. O juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as inúteis e meramente protelatórias. Precedentes. 10. Não há que se falar em cerceamento de defesa, considerada a ausência de decisão indeferindo a realização de prova pericial que sequer foi requerida pelas partes. 11. Materialidade comprovada pela NFLD, apontando a falta de recolhimento de contribuições previdenciárias, a cargo da empresa, bem como pelas cópias da folhas de pagamento, evidenciando que o desconto do valor relativo à contribuição previdenciária foi efetuado. Autoria restou demonstrada pelas cópias dos contratos sociais e declaração dos réus em interrogatório. 12. No crime de apropriação indébita previdenciária, tipificado no artigo 168-A do Código Penal, exige-se apenas o dolo genérico. Não é de exigir-se intenção de apropriar-se das importâncias descontadas, ou seja, não se exige o animus rem sibi habendi. Precedentes. 13. Não há que se falar em exclusão da ilicitude, por estado de necessidade ou em exclusão da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa. A prova das alegadas dificuldades financeiras incumbe ao réu, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal. Caberia à Defesa trazer aos autos a prova documental de suas dificuldades financeiras. Apenas a declaração do réu em interrogatório, ou mesmo depoimentos de testemunhas, ainda mais com declarações genéricas, não constituem prova suficiente para ter-se como cabalmente demonstradas as alegadas dificuldades financeiras. Precedentes. 14. Não são dificuldades financeiras de qualquer ordem que justificam a configuração de causa de exclusão da ilicitude, por estado de necessidade, ou em causa de exclusão da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa. Estas devem ser tais que revelem a absoluta impossibilidade da empresa efetuar os recolhimentos. Precedentes. 15. A alegação de que o não recolhimento das contribuições deveu-se a dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa não restou suficientemente comprovada nos autos. 16. Apelo desprovido. 

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