Apelação Criminal Nº 0007564-87.2003.4.03.6181/sp

Penal e processual penal. Apelação criminal. Estelionato previdenciário. Ausência de correlação entre denúncia e sentença. Direito ao benefício previdenciário reconhecido judicialmente. Recebimento de vantagem indevida: inocorrência. Apelação provida. 1. Apelação da Defesa contra sentença que condenou o corréu EDUARDO à pena de quatro anos de reclusão como incurso no artigo 171, § 3º, do Código Penal; condenou o corréu WALDOMIRO à pena de um ano, nove meses e dez dias de reclusão como incurso no artigo 171, § 3º, do Código Penal; e absolveu o corréu JOÃO PEDRO da imputação de prática do delito tipificado no artigo 171, § 3º, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, incisos VII, do Código de Processo Penal. 2. A denúncia imputou aos acusados EDUARDO e WALDOMIRO a conduta de requererem junto ao INSS benefício para o acusado JOÃO PEDRO, benefício esse posteriormente cassado à vista da comprovação de que houve concessão irregular no período de 29/07/1999 a 23/08/2002, causando ao INSS um prejuízo de R$ 54.937,74. 3. Nos termos da denúncia, o benefício previdenciário era totalmente indevido, e foi percebido indevidamente desde a concessão até agosto de 2002. Contudo, a sentença apelada condenou os réus EDUARDO e WALDOMIRO por fraude no recebimento do benefício, mas em circunstâncias totalmente diversas. 4. Nos autos da apelação cível nº 1999.03.99.086598-2, originário da ação ordinária nº 98.0711851-4 da 1ª Vara Federal de São José do Rio Preto-SP, a Primeira Turma deste Tribunal reconheceu que o segurado desempenhou atividades rurícolas, em regime de economia familiar, no período de 22.06.1966 a 30.04.1971, determinando a expedição a respectiva certidão de tempo de serviço, com trânsito em julgado. 6. Cientificado do cancelamento do benefício, o réu JOÃO PEDRO impetrou mandado se segurança objetivando o restabelecimento da aposentadoria, que tramitou pela 4ª Vara Federal Previdenciária de São Paulo/SP, processo nº 2002.61.83.003383-8. A liminar foi deferida determinando “o imediato restabelecimento do pagamento do benefício no valor a que teria direito se contabilizado como tempo de serviço seu período de 22/06/66 a 30/04/71, em que exerceu atividade rural“. 7. A sentença concedeu a segurança e determinou o restabelecimento do benefício previdenciário, entendendo-se expressamente que “o cômputo do período de atividade rural faz com que o Impetrante acumule tempo de contribuição suficiente para a obtenção do benefício integral“. 8. Encaminhados os autos do mandado de segurança a este Tribunal Regional Federal da 3ª Região, o processo foi julgado extinto, sem apreciação do mérito, prejudicada a remessa oficial. Opostos embargos de declaração foram acolhidos, “para dar parcial provimento à apelação da autarquia, e determinar o restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de serviço proporcional, nos termos do art. 53, II da L. 8.213/91.“ O acórdão transitou em julgado. 9. O réu JOÃO PEDRO trouxe aos autos histórico de créditos do benefício em questão em que se verifica que o benefício foi restabelecido, sem diminuição do valor. 10. Restou comprovado nos autos que não houve concessão irregular do benefício desde 07/1999 a 08/2002, nem tampouco é correto o valor apontado como prejuízo sofrido pela autarquia previdenciária. Contudo, a sentença condenou os réus dando como ocorridos fatos de forma totalmente diversa da apontada na denúncia, ou seja, não há correlação entre os fatos narrados na denúncia e a sentença condenatória, fato que por si só já seria suficiente para a absolvição. 11. O crime de estelionato exige para sua consumação a obtenção, para si ou para outrem, de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, com atos de induzimento ou manutenção de alguém em erro, mediante qualquer meio fraudulento. 12. É certo que no momento da concessão administrativa do benefício, a ação em que se discutia o tempo de serviço rural ainda não havia transitado em julgado. Contudo, a ação de reconhecimento de tempo de serviço rural tem natureza declaratória e não constitutiva, tanto que o benefício foi restabelecido desde o início. Não se pode concluir, como consta da sentença, de que o benefício foi concedido indevidamente, ainda que por curto período. 13. Desde o protocolo do requerimento, o segurado fazia jus ao benefício que lhe fora concedido, de modo que não se pode falar em recebimento de vantagem indevida em prejuízo aos cofres do INSS. Mesmo com o afastamento do tempo relativo à Indústria Corpel, o valor do beneficio não foi diminuído. O próprio segurado confirmou em seu interrogatório judicial não ter sofrido redução do beneficio, afirmando que “ainda mantém a aposentadoria inicialmente concedida recebendo mensalmente dois mil reais“. 14. Aparentemente a autarquia previdenciária não deu cumprimento integral ao acórdão proferido no mandado de segurança, mas apenas e tão somente à sentença, que foi parcialmente reformada. Ainda que isso ocorra, não há como precisar qual seria o prejuízo que teria sofrido a autarquia. Mas o certo é que não foi o quanto apontado na denúncia. 15. Apelação provida.

Rel. Des. Marcio Mesquita

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