Apelação criminal. Tráfico internacional de entorpecentes. Direito de recorrer em liberdade. Prejudicado. Erro de tipo. Não comprovado. Estado de necessidade exculpante. Afastado. Dosimetria da pena. Pena-base. Majorada em menor proporção. Mantida a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da lei n. 11.343/06 no percentual mínimo. Regime inicial de cumprimento de pena. Alterado para o semiaberto. Exclusão da pena de multa. Impossibilidade. Substituição da pena privativa de liberdade. Requisitos não preenchidos. Recurso da defesa parcialmente provido. I - Prejudicado o pedido de concessão do direito de recorrer em liberdade, em razão do julgamento do presente recurso. II - A materialidade do delito restou demonstrada pelo auto de apresentação e apreensão, pelo laudo preliminar de constatação e pelo laudo de exame de substância definitivo, os quais atestam que a substância apreendida, com a apelante, por ocasião do flagrante, trata-se de cocaína. III - A autoria e o dolo restaram claros e demonstrados. A apelante foi presa em flagrante, no dia 18 de agosto de 2011, nas dependências do Aeroporto Internacional de Guarulhos, quando tentava embarcar com destino a Lisboa/Portugal, trazendo consigo 2.725g (dois mil setecentos e vinte e cinco gramas) peso líquido - de cocaína. IV - É imprescindível que a defesa comprove a caracterização do erro sobre elementar do tipo penal - o que não ocorreu no caso dos autos - não sendo suficiente mera alegação isolada da ré sobre desconhecimento da empreitada criminosa. Os elementos carreados aos autos apontam para o fato de a apelante ter agido dolosamente, sendo que a defesa não se desincumbiu do ônus de comprovar a alegação de erro de tipo. V - O “estado de necessidade exculpante“, defendido pela teoria diferenciadora e de divergente aceitação doutrinária e jurisprudencial, é fundamentado na inexigibilidade de conduta diversa, requisito sem o qual inexiste culpabilidade. Seus adeptos pregam que se for sacrificado um bem de valor maior ao preservado, deve ser analisado o perfil subjetivo do agente e perquirido se diante de seus atributos pessoais era possível ou não lhe exigir conduta diversa da perpetrada. Em caso negativo, exclui-se a culpabilidade com base no estado de necessidade exculpante. Se, no entanto, era de se lhe exigir outro comportamento, subsiste a punição do crime, podendo o magistrado reduzir a pena. Contudo, nosso ordenamento jurídico adotou a teoria unitária, e assim, ou se trata de causa excludente da ilicitude ou de causa de diminuição de pena. E ainda que assim não fosse, melhor sorte não restaria à defesa, tendo em vista que a prática de tráfico internacional de entorpecentes não era a única alternativa de sobrevivência de Ana Paula, pessoa jovem (tinha 32 anos na data dos fatos), com perspectivas de melhora em sua vida. VI - A apelante é primária e não ostenta maus antecedentes, bem como as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis. A quantidade razoável de entorpecente (quase três quilos - peso líquido), bem como a qualidade da droga apreendida (cocaína), justificam a exasperação da pena-base, entretanto, em percentual menor (de 1/6). VIII - A apelante realmente faz jus à aplicação da causa de redução de pena, prevista no § 4º do art. 33 da Lei n.º 11.343/06, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), devido às circunstâncias objetivas e subjetivas do caso concreto, em que a apelante veio de Portugal para o Brasil, a pretexto de buscar um computador, apenas para transportar quase três quilos de cocaína, ocultos em sua mochila. IX - Considerando que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, deve ser fixado o regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, “b“, do Código Penal. X - O princípio da isonomia, garantia pétrea constitucional extensível aos estrangeiros, impede que o condenado não nacional pelo crime de tráfico ilícito de entorpecentes seja privado da concessão dos benefícios previstos em lei, no caso, de regime inicial mais brando de cumprimento de pena. XI - O pleito da defesa, concernente à exclusão da pena de multa, é totalmente descabido. Isso porque se o apelante foi condenado pela prática do delito tipificado no art. 33 da Lei n.º 11.343/06, deve incidir nas penas nele cominadas, quais sejam, pena privativa de liberdade, cumulativamente, com a pena de multa. Trata-se, portanto, de elemento inerente ao tipo penal que não pode deixar de ser aplicado pelo magistrado em razão de eventual estado de miserabilidade do acusado. XII - Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos do art. 44 do Código penal, porquanto a pena privativa de liberdade aplicada supera 4 (quatro) anos de reclusão. XIII - Recurso conhecido em parte e, na parte conhecida, parcialmente provido para majorar a pena-base em menor proporção e alterar o regime inicial de cumprimento de pena para o semiaberto. Prejudicado o pedido de recorrer em liberdade.
Rel. Des. Fernando Mendes
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