RELATOR : Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS -
Penal. Processual penal. Crimes descritos nos artigos 298 e 304 do código penal. Desclassificação. Impossibilidade. Subsunção dos fatos aos elementos do tipo penal. Materialidade e autoria comprovadas. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Majoração da pena. Apelação da defesa desprovida. Apelação da acusação provida. 1. Preliminar de prescrição retroativa. Não prospera a alegação da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, uma vez que, no caso dos autos, a sentença condenatória não transitou em julgado para o órgão acusador, que interpôs recurso de apelação, sendo inviável, portanto, a apreciação da prescrição considerando a pena aplicada na r. sentença, nos termos do artigo 110, § 1º, do Código Penal, posto que passível de majoração. 2. Da materialidade delitiva. A materialidade dos delitos definidos nos artigos 298 e 304, ambos do Código Penal, ficou demonstrada pelas peças do Processo n.º 2001.61.02.012120-3; pelo Termo de Declaração de Leonora Aparecida Casagrande Dias; pelo Termo de Declaração de Francisco Tadeu Pelin; pelo Auto de Busca e Apreensão; pelos depoimentos de Pedro de Almeida Nogueira, Dorival Alcântara Lomas, Jefferson Fernandes Negri, Lucy Eugenia Bendrath e Fabio Luiz Stabile; pelos interrogatórios do acusado e pelo Laudo de Exame Documentoscópico (Grafotécnico), os quais demonstram que o acusado protocolizou nos autos n.º 2001.61.02.012120-3 petições por ele elaboradas, nas quais subscreveu como advogado de Alessandro Doná, utilizando-se do número de matrícula na Ordem dos Advogados do Brasil pertencente a outro causídico, bem como falsificando a assinatura do advogado Francisco Tadeu Pelin. 3. As testemunhas ouvidas em Juízo, por sua vez, confirmaram os fatos tal como narrados na denúncia, sendo uníssonas no sentido de que o acusado se apresentava como advogado, patrocinando ilegalmente ação judicial sem capacidade postulatória para tanto, mediante a utilização fraudulenta do número de matrícula na Ordem dos Advogados do Brasil de outros causídicos e falsificação da assinatura de terceiro, restando demonstrada a materialidade delitiva dos crimes tipificados nos artigos 298 e 304, ambos do Código Penal. 4. Princípio da insignificância. É inaplicável o princípio da insignificância ao delito de falsidade, por se tratar de crime formal, que visa à proteção do bem jurídico fé pública, insuscetível de quantificação. Neste sentido, a jurisprudência é assente quanto à inaplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes contra a fé pública. 5. Crime impossível. Não prospera a tese do acusado quanto ao crime impossível. Isto porque as petições reputadas como falsas não foram subscritos por Pedro de Almeida Nogueira, bem como restou comprovado nos autos que a assinatura do advogado Francisco Tadeu Pelin nos referidos documentos não correspondem à sua firma, conforme Laudo de Exame Documentoscópico (Grafotécnico). 6. Da autoria delitiva. A autoria restou cabalmente demonstrada. Os depoimentos judiciais das testemunhas atestam a responsabilidade penal do réu, bem como demonstram que o mesmo agiu de forma livre e consciente ao praticar o delito narrado na denúncia, não se admitindo falar na ausência de dolo e desconhecimento da ilicitude. Ademais, o réu sequer se insurgiu quanto a essa questão, de modo que é incontroversa nos autos. 7. Da desclassificação. A defesa argumenta que os fatos delitivos imputados ao acusado se enquadram no previsto no artigo 47 da Lei n.º 3.688/41, razão pela qual deve ser efetuada a desclassificação e, por conseguinte, reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal em relação a este delito. Todavia, não prospera tal alegação, pois a conduta do acusado não se limitou ao exercício da advocacia sem preencher as condições previstas em lei, tendo o réu confeccionado e protocolizado petições falsas, violando não apenas a organização do trabalho, mas também a fé pública, incidindo, deste modo, nas condutas delitivas previstas nos artigos 298 e 304 do Código Penal. Desta feita, rejeita-se o pedido de desclassificação, restando prejudicado o pedido de decretação da extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado em razão do intervalo superior a dois anos entre a data dos fatos e o recebimento da denúncia. 8. Da dosimetria da pena. O Juízo a quo, com fulcro no artigo 59 do Código Penal, considerando a negativa valoração da culpabilidade do agente, tendo em vista o elevado grau de reprovabilidade da conduta e diante de circunstâncias merecedores de maior censura que cercaram a prática das infrações penais, notadamente as falsidades praticadas em juízo, fixou a pena-base acima do mínimo legal, sendo 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa para o delito previsto no artigo 298 do CP e, 2 (dois) anos e 20 (vinte) dias-multa para o delito previsto no artigo 304 do CP. Não foram reconhecidas agravantes ou atenuantes genéricas. Na terceira fase de aplicação da pena, foi reconhecida causa de aumento do artigo 71 do Código Penal, restando definitiva a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, e 23 (vinte e três) dias-multa. Foi fixado o regime inicial aberto para cumprimento da pena, nos termos do art. 33, § 2º, alínea c, do Código Penal. Por fim, a pena privativa de liberdade aplicada ao réu foi convertida em duas restritivas de direitos, a saber, uma pena de prestação de serviços para entidade de amparo gratuito a idosos carentes, pelo período correspondente à pena substituída e à razão de uma hora por dia, e em uma pena de prestação pecuniária, consistente no pagamento a uma entidade de amparo gratuito a menores carentes de uma cesta básica mensal no valor de um salário mínimo, durante período idêntico ao de cada uma das penas substitutas, conforme preconizam os arts. 44, § 2º, e 45, do Código Penal, observada a advertência do § 4º do primeiro artigo, ou seja, a possibilidade de restabelecimento das penas privativas de liberdade em caso de descumprimento das restritivas de direitos. 9. Majoração da pena. Nos termos do artigo 59 do Código Penal, pesam contra o acusado as seguintes circunstâncias desfavoráveis: a) a culpabilidade exacerbada; b) a personalidade do agente; c) as circunstâncias do crime; e, d) as consequências do crime. Desta feita, e tendo em vista a absorção do crime de falsidade documental pelo delito de uso de documento falso, deve ser fixada a pena-base de 03 (três) anos de reclusão e 30 (trinta) dias-multa. Ausentes agravantes ou atenuantes e causas de diminuição da pena. Consoante decisão do Superior Tribunal de Justiça, caso haja 7 (sete) ou mais infrações, deve-se aplicar o patamar de majoração em 2/3 (dois terços). Portanto, majorando a pena em 2/3 (dois terços), resulta definitiva a pena do réu em 05 (cinco) anos de reclusão e 50 (cinquenta) dias-multa, devendo ser fixado o regime inicial de cumprimento da pena no semiaberto, consoante o artigo 33, § 2º, alínea b, do Código Penal. No tocante à pena de multa, à vista da informação de que é empresário no ramo de prestação de assessoria de radiofusão e proprietário da empresa Adencon Representações e Consultoria Sociedade Civil Ltda., é razoável a fixação o valor unitário do dia-multa em um salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizado quando do efetivo pagamento. No mais, ressalta-se que a pena privativa de liberdade superior a 04 (quatro) anos, bem como a existência de circunstância judicial negativa, obstam a substituição por restritivas de direitos, nos moldes do artigo 44, inciso I, do Código Penal, razão pela qual deve ser afastada. 10. Matéria preliminar rejeitada. Apelação da defesa a que se nega provimento e apelação da acusação a que se dá provimento.
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