APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0011947-54.2016.4.03.6181/SP

Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS -  

DIREITO PENAL. PROCESSUAL PENAL. FURTO SIMPLES TENTADO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS INCONTROVERSAS. ESTADO DE NECESSIDADE NÃO RECONHECIDO. ALEGAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS E VÍCIO EM DROGAS QUE NÃO RETIRAM A ILICITUDE DO ATO e não restaram comprovadas nos autos. PRECEDENTES. DOSIMETRIA DA PENA. PRIMEIRA FASE. PENA-BASE. REDUÇÃO. CULPABILIDADE QUE SE CONSIDERA NEUTRA. SEGUNDA FASE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA BEM COMPENSADA COM A REINCIDÊNCIA. TERCEIRA FASE. TENTATIVA BEM RECONHECIDA. REGIME INICIAL ABERTO, POR FORÇA DA DETRAÇÃO. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR UMA RESTRITIVA DE DIREITOS BEM APLICADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA, EM PARTE.- Materialidade e Autoria delitivas. Ressalte-se que não houve impugnação quanto à autoria e a materialidade do delito previsto no artigo 155, caput, c.c. o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, pelo que incontroversas. Não se verifica, tampouco, a existência de qualquer ilegalidade a ser corrigida de ofício por este E. Tribunal. De rigor, portanto, a manutenção da condenação do recorrente, aliás, como não poderia deixar de ocorrer, ante o enorme arcabouço fático-probatório constante destes autos em seu desfavor.- Para fazer jus à escusa do estado de necessidade, é imprescindível que o agente se encontre diante de uma "situação de perigo atual", que tenha gerado a "inevitabilidade da conduta lesiva". Este egrégio TRF-3 já pacificou sua jurisprudência no sentido de que meras alegações de dificuldades econômicas e financeiras não caracterizam o estado de necessidade para fins penais. Além disso, quanto ao ônus da prova, consoante preconiza o art. 156, 1ª parte, do Código de Processo Penal, a prova da alegação incumbirá a quem a fizer, de modo que, se a realidade adversa não for suficientemente demonstrada por quem a alega, não haverá fundamento para se afastar a reprovabilidade da conduta.-Dosimetria da pena. Primeira fase. É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal no sentido de que, inquéritos e processos penais em andamento, ou mesmo condenações ainda não transitadas em julgado, não podem ser negativamente valorados para fins de elevação da pena-base, sob pena de malferimento ao princípio constitucional da presunção de não culpabilidade. A propósito, esta é a orientação trazida pelo enunciado na Súmula 444 do STJ Corte: "é vedada a utilização de inquéritos policiais e de ações penais em curso para agravar a pena-base". Assim, utilizar outras prisões em flagrante do réu, sem prova de sua condenação, para afirmar que ele fazia do furto o seu meio de vida e, consequentemente, exasperar-se a pena-base, vai de encontro à orientação dos Tribunais Superiores.- A "premeditação" e a "frieza" para realizar a subtração de uma televisão que estava no interior de uma agência bancária, trancada a chaves, são inerentes ao dolo exigido para configurar o delito de furto qualificado, motivo pelo qual não se admite que tal circunstância seja valorada para exasperar a pena-base.- Afastada a avaliação negativa de sua culpabilidade, fixa-se a pena-base no patamar mínimo legal de 01 (um) ano de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa.- Segunda fase. Os institutos da reincidência e da confissão espontânea foram corretamente compensados, nos termos do REsp nº 1.341.370/MT, julgado em 10/04/2013, pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que pacificou o entendimento no sentido da inexistência de preponderância, sendo possível a compensação das duas circunstâncias.- Terceira fase. Corretamente reconhecida a tentativa (art. 14, inciso II, do Código Penal), já que o réu foi preso em flagrante saindo da agência bancária em posse do televisor que visava subtrair. Adotando-se o patamar de 1/3 (um terço) estabelecido na sentença, fixa-se a pena total e definitiva em 08 (oito) meses de reclusão e pagamento de 06 (seis) dias-multa.- Regime inicial. Embora o réu seja reincidente em crime doloso, a magistrada sentenciante estabeleceu o regime ABERTO como forma inicial do resgate prisional, já que considerou a detração entre a data da prisão em flagrante delito (29.08.2016) e a data da prolação da r. sentença (11.01.2017), o que se mantém, porque não há recurso da acusação.- Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, consistente em "frequentar pelo tempo restante da pena, programa educativo relativo ao efeito nocivo das drogas, assim como modos e maneiras de se efetivar a desintoxicação e afastamento do uso", utilizando-se como fundamento legal o artigo 28 da Lei de Drogas. A medida adotada pela magistrada mostra-se mais adequada ao caso concreto, eia que, das informações de sua vida pregressa e do interrogatório judicial, o réu informou que é usuário de Crack e cometeu este e outros delitos para sustentar o seu vício. Inclusive, indagado pelo r. juízo monocrático, o apelante manifestou vontade de curar-se do vício que lhe acomete e seguir uma nova vida.- A medida restritiva imposta pela magistrada atende ao princípio da individualização da pena, na justa medida em que amolda-se às exatas necessidades do réu para alcançar sua ressocialização.- Em adição, como bem ressaltou a douta Procuradoria Regional da República citando precedente do Supremo Tribunal Federal, ninguém melhore do que o juiz natural da causa para saber, no caso concreto, qual o tipo alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo, recuperar socialmente o apenado, prevenindo comportamento do gênero (HC 110.078/SC, 2ª T., Rel. Ayres Britto, 29.11.2011, v.u.).- Apelação defensiva parcialmente provida.

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