RELATORA : Des. Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI -
DIREITO PENAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO VANGUARDA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. ART. 35 C/C ART. 40, INC. I, AMBOS DA LEI Nº 11.343/2006. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, INC. I, AMBOS DA LEI Nº 11.343/2006. PRELIMINARES DE MÉRITO. COMPETÊNCIA. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. PROVA TESTEMUNHAL DOS AGENTES POLICIAIS. AMPLA DEFESA. DEFESA PRÉVIA. MÉRITO. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. MEDIDA DE SEGURANÇA. TEMPO DE DURAÇÃO. DOSIMETRIA. DISCRICIONARIEDADE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. CAUSA DE AUMENTO. TRANSNACIONALIDADE. ART. 40, INC. I, DA LEI Nº 11.343/2006. QUANTUM. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, §4º, DA LEI Nº 11.343/2006. GRAU DE REDUÇÃO. CONCURSO MATERIAL DE CRIMES. REGIME DE CUMPRIMENTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. EXECUÇÃO IMEDIATA DAS PENAS. PERDIMENTO DE BENS. . Para o reconhecimento da transnacionalidade delitiva, basta, que haja indícios de que a droga procede de país estrangeiro ou a ele se destina, firmando-se a competência da Justiça Federal; . Ainda que a descoberta simultânea de crimes não caracterize necessariamente conexão probatória, está devidamente caracterizada a hipótese do inciso III do art. 76 do Código de Processo Penal, porquanto descrita a relação existente, lícita ou não, entre os investigados e os policiais rodoviários federais, justificando-se o julgamento conjunto. Inteligência do enunciado nº 122 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça; . A Lei nº 9.296/1996 é explícita quanto ao prazo de 15 (quinze) dias, bem assim quanto à renovação. No entanto, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, essa aparente limitação do prazo para a realização das interceptações telefônicas não constitui óbice à renovação do pedido de monitoramento telefônico por mais de uma vez; . Não há limite ao número de deferimentos das medidas de modo sucessivo, afastando a interpretação literal do art. 5º da Lei nº 9.296/96, desde que as decisões sejam devidamente fundamentadas, a fim de evitar abusos. Jurisprudência do STF e STJ; . As interceptações telefônicas, por se tratarem de procedimento investigatório, são obviamente executadas pela polícia judiciária, sob responsabilidade da autoridade policial, nos limites da autorização judicial, sendo que comentários efetuados por agentes policiais não traduzem nulidade processual, até porque, no caso vertente, a íntegra dos áudios interceptados se encontra juntada aos autos e pode ser apreciada tanto pelo magistrado julgador quanto pelas partes, as quais podem se manifestar livremente sobre seu conteúdo; . As interceptações telefônicas constituem prova hábil à condenação, mormente quando corroborada por outros elementos de prova constantes nos autos; . É assente na jurisprudência o entendimento de ser desnecessária a transcrição integral do conteúdo da quebra do sigilo das comunicações telefônicas, bastando que se tenham degravados os excertos necessários ao embasamento da denúncia oferecida e que se confira às partes o acesso aos diálogos interceptado, assim como a degravação pode ser feita por policiais sem conhecimentos técnicos específicos ou que tenham a qualificação de perito; . Não há na Lei nº 9.296/96 previsão sobre a necessidade de realização de perícia técnica para comprovar a autoria das conversas interceptadas, sendo prescindível sua realização; . A prova testemunhal oriunda dos agentes policiais que procederam às investigações ou à prisão em flagrante, mediante o compromisso de dizer a verdade e sob o crivo do contraditório, são válidas para embasar o decreto condenatório; . A palavra dos policiais que trabalharam na apuração do crime merece tanto crédito quanto a de qualquer testemunha idônea, não havendo nenhuma razão lógica para desqualificá-los só porque são servidores públicos, muito menos quando vêm testemunhar em juízo, mediante compromisso e sob o crivo do contraditório, prestando depoimento coerente e harmônico com o conjunto das provas. A defesa não demonstrou qualquer inconsistência nas declarações dos policiais arrolados como testemunhas pela acusação que apontasse motivação pessoal no sentido de lograr a condenação dos réus; . A interpretação sistemática dos art. 55 e 56 da Lei nº 11.343/06 indica que se já há advogados constituídos, como na hipótese, a notificação pode ser feita na pessoa destes. No caso, tendo havido a notificação dos procuradores, que apresentaram a defesa prévia, atendendo aos interesses dos acusados, descabe qualquer alegação de nulidade, dada a ausência de prejuízo; . Restam comprovadas a materialidade e autoria delitivas, assim como o dolo, em relação ao tráfico transnacional de drogas, consoante revela o conjunto probatório produzido em juízo; . A prisão em flagrante gera a presunção da autoria, a qual, por ser relativa, comporta prova em contrário, o que é ônus da defesa, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal. A negativa de autoria, dissociada do contexto probatório, não tem o condão de afastar a responsabilidade criminal quando demonstrada a atuação do réu no crime; . Eventual ignorância voluntária quanto ao conteúdo da carga transportada e sua ilicitude não exime o apelante da responsabilidade pela prática do delito; . Na hipótese de concurso de pessoas, não se exige que o coautor tenha a posse direta da droga para o reconhecimento do crime previsto no art. 33 da Lei nº 11.343/06, bastando demonstração de que contribuiu para a execução da prática criminosa; . Todavia, não se pode inferir a prática de conduta típica, unicamente porque alguém tem ciência de que seu cônjuge ou companheiro a realiza. Assim, se a prova produzida contra a companheira do réu, traficante confesso, é tênue e não se mostra suficiente para lhe imputar a prática do crime de tráfico internacional de entorpecentes ou de associação para o tráfico, impõe-se a absolvição com base no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal; . O tipo do art. 35 da Lei nº 11.343/06, pelo qual o agente e outros foram condenados, configura-se quando pelo menos duas pessoas se associam para o fim de praticar, reiteradamente ou não, quaisquer dos crimes previstos nos art. 33, caput e parágrafo 1º, e 34 daquela lei. Basta a comprovação do vínculo associativo, ainda que os agentes visem apenas a prática de uma única operação de tráfico de entorpecentes. O dispositivo, inclusive, não faz referência alguma ao modo de atuação da associação ou sua organização interna; . A dosimetria da pena se reveste de certa discricionariedade, porquanto o Código Penal não imprime regras absolutamente objetivas para sua fixação (cf. STJ, AgRg no AREsp nº 499.333/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, julgado em 07/08/2014); . Na fixação da medida de segurança, por não se vincular à gravidade do delito perpetrado, mas à periculosidade do agente, é cabível ao magistrado a opção por tratamento mais apropriado ao inimputável, independentemente de o fato ser punível com reclusão ou detenção, em homenagem aos princípios da adequação, da razoabilidade e da proporcionalidade. O tempo de duração da medida de segurança, contudo, não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado (Súmula nº 527 desta Corte); A natureza e a quantidade da droga foram erigidas à condição de circunstâncias autônomas e preponderantes pelo artigo 42 da Lei de Drogas, de modo que autorizam o aumento da pena-base em quantum superior ao dos outros vetores previstos pelo artigo 59 do Código Penal. É possível, portanto, o aumento da pena-base com fundamento na quantidade da droga. O quantum de aumento da pena-base, contudo, não é genérico ou matemático, pois deve considerar as particularidades do cometimento de cada delito, de modo a cumprir o preceito constitucional da individualização da pena; . Quando correta a valoração negativa da vetorial maus antecedentes, não cabe a realização de acréscimos nas demais circunstâncias judiciais, fundadas apenas em outras condenações transitadas em julgado. Ou seja, não é possível cindir e distribuir entre as vetoriais do art. 59 do Código Penal as condenações transitadas. Vencida na parte a Relatora; . A circunstância judicial conduta social, prevista no art. 59 do Código Penal, compreende o comportamento do agente no meio familiar, no ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos. Vale dizer, os antecedentes sociais do réu não se confundem com os seus antecedentes criminais. São vetores diversos, com regramentos próprios. Assim, revela-se inidônea a invocação de condenações anteriores transitadas em julgado para considerar a conduta social desfavorável, sobretudo se verificado que as ocorrências criminais foram utilizadas para exasperar a sanção em outros momentos da dosimetria; . A existência de condenação definitiva também não é fundamento idôneo para desabonar a personalidade do paciente, sob pena de bis in idem. Ademais, não é possível que o magistrado extraia nenhum dado conclusivo, com base em tais elementos, sobre a personalidade do agente. Assim, não havendo dados suficientes para a aferição da personalidade, mostra-se incorreta a sua valoração negativa, a fim de supedanear o aumento da pena-base; . Se a confissão realizada na fase inquisitiva serviu como supedâneo à condenação, deve ser reconhecida a atenuante prevista no artigo 65, III, "d", do Código Penal; . Se o agente não é mero partícipe, senão que se trata do próprio autor do crime, não pode se beneficiar da causa especial de diminuição da pena referente à participação de menor importância (artigo 29, §1º, do Código Penal); .Comprovada a transnacionalidade do delito, na dosagem da majorante inserta no art. 40, I, da Lei 11.343/06, deve ser sopesada a origem da substância, o percurso percorrido pelo agente com ela e seu destino final. Não deve ser aplicado aumento em fração superior ao mínimo legal sem que se verifique, no fato, elementos sobre a transnacionalidade mais elaborada. Na hipótese, elementos apresentados nos Fatos 1 e 16 não refogem ao usual, impondo-se a redução para o mínimo legal. Vencida na parte a Relatora; . A causa de diminuição de pena do parágrafo 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06 objetivou privilegiar o pequeno traficante, geralmente um mero transportador que não está envolvido com os fornecedores e receptores ou com grupos criminosos. O réu reincidente não faz jus à referida causa de diminuição de pena; . Por se tratar o tráfico de drogas e a associação para o narcotráfico de crimes autônomos, que decorrem de desígnios independentes entre si, está caracterizado o concurso material de delitos, ex-vi do artigo 69 do Código Penal; . Na pena de multa, o número de dias-multa deve guardar proporcionalidade com o quantum da pena privativa de liberdade estabelecida. Já o valor do dia-multa deve ser fixado de acordo com as condições econômicas do condenado; . Na fixação do regime prisional ao condenado pela prática do crime de tráfico de drogas serão observados os requisitos do artigo 33 do Estatuto Repressivo, atentando-se, à luz do artigo 42 da Lei 11.343/2006, para a natureza e a quantidade de droga, bem como às circunstâncias judiciais do artigo 59 do Codex Penal; O tempo de prisão processual deve ser considerado quando da análise da possibilidade de progressão para o regime menos gravoso, e não no momento em que fixado o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; . Aplica-se o perdimento do veículo apreendido no transporte da droga, por força do art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal, e do artigo 91 do Código Penal; . Para o decreto de perdimento, não se exige comprovação de utilização reiterada do bem na atividade ilícita ou mesmo que possuía compartimento adrede preparado para transporte irregular de mercadorias, bastando que tenha sido voluntária e conscientemente usado para a prática criminosa; . Compete ao Juízo da Execução examinar o pedido de isenção de custas, porquanto aquela é a fase adequada para aferir a real situação financeira do condenado, ao tempo do cumprimento da pena.
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