Apuração de crimes de contrabando/descaminho. Pretendido trancamento de inquérito policial. Impossibilidade. Necessidade de exame probatório incabível em sede de habeas corpus.
Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro
- Cuida-se de habeas corpus, com pretensão liminar, impetrado por Paulo Roberto de Oliveira, em favor de ÉLIO ASTRISSI, objetivando o trancamento do inquérito policial nº 2006.70.02.010814-3 (IPL nº 1557/2006) em trâmite perante à 2ª Vara Federal Criminal de Foz do Iguaçu/PR. Segundo se depreende, o referido procedimento foi instaurado em decorrência da prisão do paciente e outros investigados (efetivada na data de 25.11.2006) pela prática, em tese, do delito previsto no artigo 334 do Código Penal. Os fatos foram assim narrados pelo condutor do flagrante, APF Orli Ernesto Davies (fl. 08) verbis: “Na data de hoje, por volta das 18:00 horas, policiais lotados no Núcleo de Operações receberam denúncia anônima, por telefone, dando conta de atividade de contrabando e tráfico de drogas em portos clandestinos de Itaipulândia. No mesmo instante, foi montada equipe para deslocamento até a região. Chegando lá, começaram a fazer buscas nos portos da região. (...) Próximo à base náutica daquele Município, detectaram movimentação suspeita, decidindo realizar abordagem. Verificaram um barco e caixas de mercadorias de procedência estrangeira que acabaram de ser descarregadas. Nesse momento deram voz de prisão a SIDNEI PRINCE, que estava no local, ajudando a descarregar as mercadorias, e a LORENILDO JÚNIOR GEBAUER, que pilotava a embarcação. Posteriormente à abordagem, chegaram no local, em um veículo Fiat/Strada e um VW/Gol, MAICON DIOGO BEN, ÉLIO ASTRISSI e LUIZ RODRIGO DIAS, sendo que ÉLIO afirmou ser o dono das mercadorias, tendo sido dada voz de prisão também a eles três. Quando se retiravam do local, chegou outra lancha pequena, carregada com mercadorias, pilotada por CLAUDINEI FERREIRA DE SOUZA, que também foi preso. (...) Restaram apreendidas duas embarcações, também um veículo Chevette, um Strada e um Gol.“ Sustenta o Impetrante, em síntese, ausência de justa causa para o prosseguimento do inquérito policial, ao fundamento de que “a favor do réu vertem provas de que ele não participou do contrabando de mercadorias.“ Aduz também que os bens foram apreendidos com os outros investigados, nada tendo sido encontrado em poder do paciente. Diante disso, requer a concessão liminar da ordem e sua posterior confirmação pela Turma para que seja trancado o referido inquérito. Ab initio, mister salientar que a utilização do writ nas hipóteses em que se pretende obter - exclusivamente - o trancamento de inquérito policial e/ou ação penal, é apenas admissível (conforme entendimento consolidado na doutrina e jurisprudência) quando o fato narrado na denúncia não configura, nem mesmo em tese, conduta delitiva, ou seja, o comportamento do réu é atípico ou não há certeza sobre a materialidade do crime; quando resta evidenciada a ilegitimidade ativa ou passiva das partes (podendo ser representada pela própria inocência do acusado ou pela falta de indícios suficientes de autoria do delito) e, finalmente, se incidir qualquer causa extintiva da punibilidade do agente. De outro lado, é cediço que a via estreita do habeas corpus se caracteriza por sua sumarização vertical. Por isso, não comporta dilação probatória ou exame aprofundado de provas, e sua instrução deve ser composta por elementos pré-constituídos. Logo, as alegações nele vertidas devem ser comprovadas prontamente, de forma incontroversa e indubitável. Do contrário, correr-se-ia o risco de invadir área própria da ação penal, que é a do contraditório. Em resumo, no âmbito do writ não se mostra admissível a produção e/ou o exame aprofundado de provas, que somente podem ser realizadas no decorrer do regular e ordinário processo criminal. Nesse sentido, veja-se a ementa do seguinte julgado: HABEAS CORPUS . APURAÇÃO DE CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, ESTELIONATO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRETENDIDO TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE EXAME PROBATÓRIO. ORDEM DENEGADA. 1. Em sede de habeas corpus, conforme pacífico magistério jurisprudencial, somente se admite o trancamento de inquérito policial ou da ação penal, por falta de justa causa, quando desponta, induvidosamente, sem a necessidade de avaliação aprofundada de fatos, indícios e provas, a inocência do indiciado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade, circunstâncias não demonstradas na hipótese em exame. 2. Uma vez não demonstrada, de plano, a ausência de justa causa para o inquérito policial, é descabido o seu trancamento. 3. Ordem denegada. (STJ, Quinta Turma, HC nº 59750/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, public. no DJU de 04.12.2006, p. 346). No caso dos autos, primeiramente cabe referir que o writ não se encontra devidamente instruído, pois somente consta do feito cópia do auto de prisão em flagrante, não tendo sido anexado qualquer outro documento referente ao apontado inquérito policial. A par disso, ao contrário do alegado na impetração, do auto de prisão em flagrante constata-se a existência de indícios suficientes de autoria em relação ao paciente, restando demonstrada a sua efetiva responsabilidade ao menos sobre parcela das mercadorias apreendidas, conforme admitido por ele próprio em seu depoimento, verbis: “(...) Na data de ontem se dirigiu às margens do lago de Itaipu para buscar três caixas de brinquedo que seriam de sua responsabilidade; as caixas estariam sendo atravessadas por barco; deixou seu carro, um veículo GOL de placas GSD-2225, à beira da estrada e se dirigiu em uma Strada, em companhia de MAICON e LUIZ para buscar os brinquedos. Quando chegavam às margens do lago, foram abordados por policiais federais. Naquele momento, identificou-se como proprietário de três caixas, sendo preso (...) entregaria os brinquedos para uma pessoa de nome MILTON, em São Miguel do Iguaçu. Apenas foi buscar as mercadorias, não sendo responsável pela travessia (...).“ Aliás, segundo as declarações dos demais investigados (fls. 12-20) o paciente “era o responsável pelo transporte dos brinquedos até uma cidade próxima“. Esse suporte fático é suficiente para justificar a instauração do procedimento investigatório, não se verificando, destarte, a alegada falta de justa causa. Ante o exposto, em face da ausência dos requisitos legais, indefiro a liminar. Solicitem-se informações à digna autoridade impetrada, que as prestará no prazo de 05 (cinco) dias. Após, abra-se vista dos autos à douta Procuradoria Regional da República. Intimem-se. Publique-se. Porto Alegre, 06 de novembro de 2007.
Outras Publicações
41 Responses