Penal e processual penal. Crime tipificado no art. 183 da lei n.º 9.472/92. Compartilhamento de conexão de internet via rádio. Distinção entre as condutas de Transmitir sinais de radiofrequência fora dos parâmetros legais e regulamentares E de compartilhar conexão de internet. Compartilhamento de acesso à internet via Radiofrequênia que não se confunde com o serviço de comunicação multimídia nem Com o serviço de valor adicional. Atipicidade da conduta de compartilhar acesso à Internet, desde que obedecidas as prescrições legais quanto ao uso do meio. Apelação provida. 1. Apelação criminal interposta contra sentença que julgou procedente a denúncia para condenar o acusado pela prática de crime previsto no artigo 183 da Lei nº 9.472/97 à pena de 2 (dois) anos de detenção, em regime aberto, e 18 (dezoito) dias-multa. 2. Caso em que, segundo a denúncia, fiscais da ANATEL teriam constatado o funcionamento, sem a devida autorização, de uma estação de serviços de comunicação multimídia, instalada e administrada pelo denunciado, mediante provedor situado em empresa de nome fantasia Tecno Lan. 3. A partir da interpretação do art. 215, I, da Lei n.º 4.117/62 conclui-se que o art. 70 da Lei n.º 4.117/62 continua a reger a conduta de desenvolver atividade de telecomunicação sem prévia autorização enquanto que o art. 183 da Lei n.º 9.472/97 é aplicável aos casos em que a atividade de telecomunicação, embora previamente autorizada, é exercida sem observância do disposto na lei e nos regulamentos. Precedentes do STJ. 4. Existência nos autos de provas suficientes de que a conduta imputada ao Réu, qual seja, o compartilhamento de conexão de Internet via rádio com outros usuários, não foi objeto de prévia autorização pela ANATEL, conforme se constata do Termo de Apreensão de Equipamentos, do Relatório de Fiscalização da Anatel e do interrogatório do Réu em Juízo. 5. Termo de Apreensão lavrado pela ANATEL constatando, por ocasião da fiscalização, a ocorrência das seguintes práticas atribuídas ao Réu: 1) Serviço de Comunicação Multimídia, sem a devida autorização da Anatel (art. 131 da Lei n.º 9.472/97 c/c o art. 10 da Resolução n.º 272/2001); 2) Uso de radiofreqüência sem prévia autorização da Anatel (art. 163 da Lei n.º 9.472/97 c/c o art. 80 da Resolução n.º 259/2001); 3) Equipamentos instalados ou utilizados clandestinamente (art. 208, inciso V, da Resolução n.º 270/2001); 4) Utilização de Produto sem a devida certificação/homologação (art. 55, V, “a“, c/c o art. 63 da Resolução n.º 242/2000). 6. São distintas as condutas de fornecer acesso à Internet por meio de radiofreqüência e de oferecer acesso à Internet como serviço de valor adicionado. Precedentes desta Corte. 7. O uso de equipamentos de radiofreqüência para viabilizar o compartilhamento da conexão à Internet é suscetível de configurar pelo menos em tese a prática do crime previsto no art. 183 da Lei n.º 9.472/97. 8. Diferentemente do que ocorre em relação às rádios comunitárias, em que a simples falta de autorização para sua instalação e funcionamento, configura o crime descrito no art. 183 da Lei n.º 9.742/97, na modalidade de uso indevido de radiofrequência para estabelecimento de rede entre equipamentos de informática, exige-se para sua caracterização a prova de que os equipamentos não atendem as exigências da lei e dos regulamentos (art. 163, § 2º, inciso I, da Lei n.º 9.472/97 c/c arts. 1º e 3º da Resolução n.º 506/2008 da Anatel). 9. O fato de constar do Anexo ao Termo de Apreensão que dois dos três equipamentos apreendidos (cabo UTP e placa acrescida de transceptor com fonte) não haviam sido certificados/homologados pela Anatel, por si só, não é suficiente para reconhecer que tais equipamentos não se enquadram como sendo de radiação restrita, ou que mesmo sendo de radiação restrita não atendem as prescrições dos incisos I, II e III do parágrafo único do art. 3º da Resolução n.º 506/2008 da Anatel, sendo indispensável para tanto a realização de prova pericial. Incidência da regra do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (absolvição em razão da ausência de prova suficiente para a condenação). 10. O Serviço de Comunicação Multimídia - SCM é uma das modalidades do serviço de telecomunicações, sujeito, portanto, a autorização da Anatel, como, aliás, consta expressamente dos art. 3º e 10 da Resolução n.º 272/2001. 11. A conduta de oferecer acesso à Internet mediante compartilhamento da conexão OI/VELOX, embora de alguma forma possibilite a transmissão, emissão e recepção de informações multimídia, difere do Serviço de Comunicação Multimídia - SCM, pois somente as Entidades Exploradoras de Serviços Públicos de Telecomunicações (ESSPT) estão habilitadas a prestar esse serviço (SCM). 12. Prática desenvolvida pelo Réu que também não pode ser enquadrada como sendo de Provedor de Serviço de Conexão à Internet - PSCI, seja porque ele apenas compartilhava a conexão contratada com o Provedor de Serviço de Conexão à Internet -PSCI (OI/VELOX), seja porque as atividades de Provedor de Serviço de Conexão à Internet - PSCI, também nos termos da Norma n.º 004/95 da Anatel, exigem uma série de equipamentos, programas de computador (hardwares e softwares) e rotinas que não foram utilizados no mero compartilhamento da conexão entre usuários externos. 13. Ainda que fosse possível equiparar o compartilhamento do acesso à Internet às atividades dos provedores de acesso, caberia levar em conta que “O serviço de conexão à Internet, por si só, não possibilita a emissão, transmissão ou recepção de informações, deixando de enquadrar-se, por isso, no conceito de serviço comunicacional“. Entendimento do STJ e desta Quarta Turma. 14. A diferença entre o compartilhando do acesso final à Internet, devidamente contratado, pelos meios permitidos, segundo as especificações da Anatel, que não caracteriza crime, e o compartilhamento de conexão de Internet que configura ilícito penal está justamente no meio utilizado e em sua forma de utilização, e não no compartilhamento em si. 15. Apelação provida para absolver o Réu da imputação de instalação e utilização de equipamentos de radiofreqüência fora das prescrições legais e regulamentares (Lei n.º 9.472/97 c/c a Resolução n.º 506/2008 da Anatel), em face da insuficiência de provas, nos termos do art. 386, VII, do CPP, bem como da imputação exploração de Serviço de Comunicação Multimídia, sem prévia autorização Anatel, diante da atipicidade da conduta verificada no caso concreto (CPP, art. 386, III).
Relator : Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira
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