ACR – 11972/PE – 0002830-35.2013.4.05.8300

RELATOR : DESEMBARGADOR EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR - 

Constitucional e penal. Apelações criminais. Art. 273, §§ 1º e 2º, do código penal. Aplicação a terceiros, por profissionais da medicina, da toxina fine tox. Inexistência De registro pela anvisa. Não demonstração de que tal produto tem, em tese, aptidão Para provocar prejuízo à saúde humana. Ausência de tipicidade. Provimento da Apelação da acusada e improvimento do apelo da acusação. I - É de se afastar a alegação de erro de proibição, pois, a despeito da toxina Fine Tox ter sido assiduamente aplicada, o que em parte decorria da situação de credibilidade usufruída pelo representante comercial que a revendia, compete ao profissional da medicina o conhecimento mínimo sobre o medicamento que aplica ou prescreve, a revelar negligência no caso concreto. II - O direito penal, na atualidade, não pode se dissociar dos valores que informam o Estado constitucional, surgido e expandido depois da segunda metade do século XX, ao qual rende vassalagem o Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição de 1988. Desse modo, o legislador penal não pode desprezar, na produção de normas jurídicas, os postulados constitucionais, não sendo necessária, para as incriminações, a só presença de um bem jurídico, mas, igualmente, que a conduta reprovável cause uma efetiva lesão ou dano sobre aquele. III - Mesmo em se tratando de crime de perigo abstrato o delito tipificado no art. 273, §§ 1º e 2º, do Estatuto Punitivo, a sua configuração não se manifesta pela só ausência de registro do medicamento na ANVISA, havendo, igualmente, a necessidade da demonstração de uma probabilidade de lesão, por mínima que seja, isto é, que o produto em causa seja idôneo, em tese, para ofender o bem jurídico tutelado pelo ordenamento, consistente na saúde humana. IV - No caso concreto, o laudo pericial, elaborado por integrantes do Laboratório de Imunopatologia Keizo Azami (LIKA) da Universidade Federal de Pernambuco, e representativo de uma análise global do material apreendido, não informou, nem de passagem, que o emprego da toxina Fine Tox é capaz, ao menos em tese, de causar ofensa à saúde humana. V - A inexistência de prova de que a malsinada toxina é hábil para causar ofensa à saúde humana afasta a tipicidade da conduta narrada na denúncia, harmonizando a aplicação do art. 273, §§ 1º e 2º, do Código Penal, aos valores consagrados pelo Estado de Direito Democrático (art. 1º, caput, CF de 1988). VI - Ao contrário do sustentado pelo Ministério Público, não se afigura possível a incidência do art. 7º, IX, da Lei 8.137/90, seja em razão da hipótese, por se tratar de medicamento, envolver conflito aparente de normas, apenas podendo, conforme o caso, retratar eventual ofensa ao art. 273 do CP, seja por conta do laudo pericial não ser conclusivo quanto à impropriedade do produto ao consumo. VII - Apelação da acusada provida, para o fim de ser exarado édito absolutório. Recurso do Ministério Público Federal a que se nega provimento. 

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