ACR – 12162/RN – 0000475-31.2013.4.05.8404

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA -

Penal e processual penal. Apelação criminal. Ex-prefeito. Sentença absolutória. Dispensa de licitação sem observância das formalidades (artigo 89 da lei nº 8.666/93). Elemento subjetivo. Dolo específico. Ausência de demonstração. Prejuízo ao erário. Não ocorrência. Absolvição mantida. Apelação improvida. 1-O Ministério Público Federal apelou de sentença que absolveu o réu, ex-prefeito do Município de Francisco Dantas/RN, pela prática da conduta descrita no art. 89 da Lei nº8.666/93, consubstanciada no fato de ter contratado serviços de transporte escolar, com verba federal, sem observar o cabível procedimento licitatório. 2-Para a caracterização do delito tipificado no art. 89 da Lei nº 8.666/1993, não basta a inobservância das regras procedimentais pertinentes à licitação/dispensa de licitação, sendo necessária a demonstração de efetivo dano ao erário. Neste sentido, há precedente do STF (Inq nº 2.482/MG) e do STJ (REsp nº 1374278), bem como deste Tribunal (ACR 10516/PE, Relator Desembargador Federal Marcelo Navarro, DJE 13-05-2014). 3-A sentença foi pautada nos seguintes argumentos: I - Do conjunto probatório tem-se que o valor gasto pela edilidade com os itens em comento em muito ultrapassa o valor que tornaria legal a dispensa de licitação que, conforme o disposto no artigo 24, II, da Lei 8.666/93 é de R$ 8.000,00 (oito mil reais). Foram gastos pelo réu R$ 9.695,00 (nove mil seiscentos e noventa e cinco reais), no exercício de 2008. II - Do depoimento do acusado observa-se que, orientado pela Comissão de Licitação, e verificando que as compras eram decorrentes de necessidades temporárias, que comportavam valores baixos, não atingindo o teto de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acreditava que não estava ultrapassando o limite legal imposto pelo artigo 24 da Lei 8.666/93. III - Verifica-se que houve falta de consciência, pois o acusado acreditava que a aferição do valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) deveria ocorrer a cada depósito/repasse recebido e não sobre o montante total (anual). IV - As circunstâncias de inexistir percepção cumulativa das verbas em um único momento e o parecer da comissão de licitação nesse sentido legitimam a verossimilhança de que o réu realizou raciocínio inadequado, mas possível. V-Não é possível concluir que a comissão de licitação somente obedeceu a ordens do Chefe do Executivo, ao elaborar tais pareceres, porque a acusação não se desincumbiu do ônus da prova ao não arrolar seus membros como testemunhas de acusação. VI- De outro lado, o MPF não demonstrou superfaturamento, existindo recibos nos autos que denotam se coadunar com a realidade dos preços que se aplicam na atualidade. VII- No que se refere ao dano ao erário, o STJ tem firmado entendimento dominante de que o crime do artigo 89 da Lei 8.666/93 somente é punível quando produz resultado danoso ao erário. 4-Sentença apelada em consonância com o que vem sendo adotado nas cortes superiores, mormente o fato de que deve haver demonstração de dolo específico e de efetivo prejuízo ao erário para haver o crime de dispensa indevida de licitação (art. 89 da Lei nº 8.666/93). (STJ: AgRg no REsp 1304179/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 18/09/2014, DJe 25/09/2014) 5-Desacolhe-se o argumento do apelante de que o entendimento que vem sendo adotado nas instâncias superiores de haver demonstração do dolo específico e de efetivo prejuízo ao erário para haver o crime de dispensa de licitação, previsto no artigo 89 da Lei nº 8.666/93, pode causar um completo esvaziamento da exigência constitucional prevista no artigo 37, XXI, da Constituição Federal, e legal, prevista no artigo 2º da Lei nº 8.666/93 de licitação. 6-Caso concreto onde os recursos federais recebidos foram efetivamente gastos em transporte escolar, para atenderem necessidades dos estudantes do Município de Francisco Dantas - RN, tendo inclusive sido aprovadas as contas pelo Ministério da Educação, o que denota a impossibilidade de quantificação de efetivo prejuízo ao erário ocasionado pela não realização, de fato, do certame licitatório. 7-Ausência de efetiva demonstração pela acusação de que o acusado tenha direcionado especificamente a ordem de dispensa de licitação à Comissão do Certame, cujos membros sequer foram arrolados como testemunhas pela acusação, ou mesmo de demonstração de superfaturamento. Existência nos autos que os valores pagos se coadunam com a realidade dos preços aplicados na atualidade. 8-Em situação assemelhada, esta Corte Regional já se posicionou no sentido de confirmar a absolvição por ausência do dolo específico para a configuração do crime previsto no artigo 89 da Lei de licitações, a despeito de ter sido demonstrada nos autos irregularidades na contratação direta e na dispensa de licitação para contratação de empresas para elaboração do projeto avençado no convênio: ((TRF - 5ª REGIÃO, ACR8719/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ÉLIO WANDERLEY DE SIQUEIRA FILHO (CONVOCADO), Terceira Turma, JULGAMENTO: 18/12/2014, PUBLICAÇÃO: DJE 08/01/2015 - Página 130); (TRF - 5ª REGIÃO, ACR11000/PB, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL GERALDO APOLIANO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 06/11/2014, PUBLICAÇÃO: DJE 11/11/2014 - Página 70); (TRF - 5ª REGIÃO, ACR10515/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 05/12/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 09/12/2013 - Página 84) 9-Ausência de qualquer elemento probatório a indicar que a dispensa dos processos licitatórios foi pautada pela má-fé, no escopo específico de favorecer terceiros ou de violar intencionalmente os preceitos de moralidade, impessoalidade, eficiência ou qualquer outro princípio constitucional, não tendo sido demonstrado, também, que as aquisições diretas de serviços de transporte escolar provocaram prejuízo ao erário, fato esse que, por si só, não impede a condenação por ato de improbidade administrativa, mas que, no presente caso, somada à falta de dolo pela mera falta de formalização de um procedimento, induz, conforme concluiu o juiz de primeiro grau, à absolvição do réu. 10-Sentença absolutória confirmada. 11-Apelação do Ministério Público Federal improvida.  

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