ACR – 13031/RN – 0000469-24.2013.4.05.8404

RELATOR : DES. ÉLIO WANDERLEY DE SIQUEIRA FILHO -  

Penal. Processual penal. Sentença condenatória. Apelos dos réus e do Ministério público federal. Condenação de ex-prefeito do município de marcelino Vieira/rn, além de três membros da comissão de licitação, pela prática da conduta Típica prevista no art. 1º, inc. I, do decreto-lei nº 201/67. Convênio da união com a Municipalidade, através do repasse de verbas do fundo nacional de educação - fnde, Para contratação de empresa de fornecimento de gás de cozinha para as escolas, no Bojo do programa de apoio a estados e municípios para educação de jovens e adultos - eja. Verba repassada para o convênio, no montante de r$ 24.083,36 (vinte e quatro mil E oitenta e três reais e trinta e seis centavos), irregularmente levantada - na "boca Do caixa" - pelo então prefeito, através de cheques nominais em favor da tesouraria Da edilidade. Não execução do objeto contratado. Procedimento licitatório Forjado, a posteriori, para conferir aparência de legalidade à contratação, fictícia, De empresa fornecedora. Denúncia respaldada em tomada de contas especial, Deflagrada pelo tribunal de contas da união. Impõe-se a manutenção da Condenação do então prefeito, pela conduta prevista no art. 1º, inc. I, do decreto-lei Nº 201/67, absolvendo-se os demais réus, quanto ao crime de responsabilidade, mas Impondo-lhes, como também ao então prefeito, apenação pela prática do crime de Falsificação dos documentos públicos utilizados no simulacro licitatório (art. 297, §1º, do código penal). Apelação do ex-prefeito improvida. Provimento dos recursos Dos demais réus, integrantes da comissão de licitação, para absolvê-los da Imputação de crime de responsabilidade. Provimento, em parte, do recurso Ministerial, para condenar todos os réus pela prática do crime do art. 297, §1º, do cp. 1.Os autos da ação criminal correspondente aos presentes apelos dizem respeito à persecução penal deflagrada com o fito de apurar a responsabilização dos ora apelantes, no que tange à condução, havida como irregular pelo órgão acusatório, de procedimento licitatório realizado no Município de Marcelino Vieira/RN, em razão de desvio e apropriação irregular de verbas públicas federais voltadas, originariamente, ao financiamento de Programa de Apoio a Estados e Municípios para Educação Fundamental de Jovens e Adultos - EJA, no valor, à época dos fatos, nos anos de 2003/2004, de R$ 24.083,36 (vinte e quatro mil e oitenta e três reais e trinta e seis centavos). 2. A necessidade de responsabilização penal dos 04 (quatro) réus decorreu de percepção irreprochável do julgador monocrático, à vista de robusto acervo probatório, este constituído, principalmente, por Procedimento Investigatório Criminal - PIC (volumes apensos) que supedaneou a Denúncia, valendo realçar que o órgão acusatório se desincumbiu, mui satisfatoriamente, de seu exclusivo ônus de comprovar, na instrução processual, a procedibilidade do apurado administrativo, que, por sua vez, constituiu-se de documentação oriunda de Tomada de Contas Especial, emanada do Tribunal de Contas da União - TCU, no sentido de comprovar tanto o não perfazimento do objeto conveniado com o Município de Marcelino Vieira-RN, a partir de verbas repassadas pela União, em 2003, voltadas a financiar Programa de Apoio a Estados e Municípios para Educação Fundamental de Jovens e Adultos - EJA, quando o ora apelante F.I.O. detinha a condição de Prefeito, quanto o desvio do numerário em tela e, ainda, a simulação de procedimento licitatório para encobrir a apropriação indébita de tais valores públicos. 3. A par da necessidade de responsabilizar penalmente os réu - e isto é inquestionável -, obrou, contudo, em equívoco, o magistrado sentenciante, ao estabelecer, inadequadamente, a subsunção de algumas das condutas praticadas, a tipos penais diversos das reais figuras delitivas perpetradas pelos mesmos. No que diz respeito às razões recursais produzidas pela defesa do réu F.I.O., a insuficiência técnica dos seus argumentos, assim compreendida em razão da ausência de qualquer elemento fático-jurídico pontual, minimamente servível a desconstituir a comprovação das irregularidades associadas a não aplicação das verbas públicas à finalidade conveniada, faz-se sentir, também, pela genericidade das assertivas, voltadas a alegar, tão-somente, a ausência de dolo na conduta do apelante, e, por vezes, em vagas declarações de cumprimento do objeto contratado, em sentido contrário, portanto, às provas dos autos. Assim, in casu, restou acertadamente fixada a responsabilização penal do então Prefeito aos ditames do art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 201/67. 4. Deve ser conferida total ênfase ao fato, por vezes considerado pelo Acórdão proferido na referenciada Tomada de Contas Especial, de haver sido sacado, "na boca do caixa", através da emissão, pelo gestor municipal, de cheques nominais à Tesouraria da Prefeitura do Município de Marcelino Vieira-RN, todo o numerário dos recursos aportados em conta corrente do Banco do Brasil, destinados a garantir a implementação do objeto do convênio público para contratação de empresa fornecedora de gás de cozinha para as escolas, no bojo do Programa do EJA, com aporte de verba advinda do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE. Deve subsistir, em relação ao apelante F.I.O, a sua responsabilização penal nos idênticos moldes em que decretada no veredicto aqui recorrido, como sendo, pelo cometimento do crime do art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 201/67, à pena de 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, além da pena de inabilitação para o exercício de função e cargos públicos, pelo prazo de 05 (cinco) anos. É, então, de se afirmar ter o réu causado dano ao erário, a partir da apropriação da verba pública destinada ao convênio e, na sequência, não haver executado o objeto do programa dirigido pelo FNDE. Inegável, assim, que a aplicação da sanção corporal ora referenciada, sustenta-se, também, pela observância, fundamentada, dos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e, também, da discricionariedade, esta nos limites regulados pela lei, como in casu verificado. 5. No que diz respeito aos apelos interpostos pelas defesas dos três réus integrantes da comissão licitante, deve-se seguir idêntico parâmetro defendido pelo Ministério Público Federal, ora em sede de contrarrazões recursais, como também no corpo do Parecer, apresentado sob o entendimento, por demais plausível, da não configuração, nas condutas desses apelantes, do tipo penal do art. 1º, I, do Decreto-lei nº 201/67, visto que suas ações não foram de molde - não há constatação neste sentido - a concorrer para o saque fraudulento da verba repassada ao município, crime este de autoria exclusiva do então prefeito; também não houve, muito menos, prova de desvio ou locupletação (já anteriormente efetivada pelo gestor municipal) do numerário público, atribuível a estes mesmos apelantes. Com efeito, descabe a subsunção típica operada pelo sentenciante, no que diz respeito ao agir dos apelantes da comissão às elementares do tipo penal do crime de responsabilidade antes aludido, visto que inexiste comprovação de apropriação ou de desvio da verba pública por tais servidores, ainda que em prol de terceiros, in casu, o também apelante ex-prefeito, associada ao convênio estabelecido entre a municipalidade de Marcelino Vieira- RN e a União, através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE. 6. Quanto ao apelo do Ministério Público Federal, verifica-se que restou positivada a fraude consistente na confecção de documentos que compuseram o fictício procedimento licitatório, com o firme propósito de conferir ares de legalidade ao certame, e, como inafastável móvel delituoso, driblar a fiscalização dos poderes públicos. Nítido, pois, do cotejo dos documentos e testemunhos reunidos nos autos, a inexistência de licitação, pois não observado o figurino legal preconizado para tanto, visto que ausentes os parâmetros exigidos pela legislação de regência - Lei nº 8.666/93 -, como dispuseram as glosas estabelecidas na Tomada de Contas Especial nº 005.808/2007-2, redundando num simulacro de competição, impossibilitando a concorrência empresarial, sem que pudesse se falar em regular formalidade dos atos, por se tratar de montagem inapta - verificada pelo Tribunal de Contas da União - a legitimar a prestação de contas da edilidade. 7. É, então, de clareza solar a demonstração do consórcio estabelecido entre os membros da Comissão Municipal de Licitação e o então Prefeito, para a perpetração do ilícito de falsificação de documentos públicos (art. 297, §1º, do Código Penal), no caso, os papéis e documentos que forjaram, em momento posterior ao saque da verba pública repassada ao município, a instauração de procedimento licitatório, a título de conferir aura de legalidade ao saque, já ocorrido - "na boca do caixa" -, unicamente pelo então prefeito, do dinheiro público do convênio, perfazendo, assim, o agir dos três membros da comissão processante, juntamente com o gestor municipal, ao concorrerem para a elaboração do fictício procedimento licitatório - Carta-Convite nº 005/2004, as elementares do art. 297, §1º, do Código Penal. 8. Restou evidenciada, portanto, a confecção de documentos que compuseram o fictício procedimento licitatório, com o firme propósito de conferir ares de legalidade ao certame, e, consequentemente, iludir a fiscalização dos poderes públicos, não sendo minimamente aceitáveis as razões recursais firmadas com base em desconhecimento total da legislação licitatória - por ausência de qualificação específica dos servidores da comissão municipal de licitação. Aproveitam-se, aqui, para definição das penas dos quatro réus, pela prática da conduta típica prevista no art. 297, §1º, do Código Penal, os termos da valoração praticada pelo sentenciante, em relação ao crime de responsabilidade, para fixação da pena-base dos quatro apelantes, estabelecendo-se, contudo, o patamar de 03 (três) anos de reclusão, apenas para cada integrante da comissão licitante, ora tornada concreta e definitiva, em razão da ausência de causas especiais de aumento ou diminuição de pena. Determina-se, aqui, o regime inicial de cumprimento de pena do tipo aberto. Pena de multa (art. 49, do CP), doravante fixada em 100 (cem) dias-multa, sendo o dia-multa, orçado em 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato. Eventual possibilidade de substituição da pena corporal por restritivas de direitos, nos termos do art. 44, do Código Penal, bem como a escolha da modalidade e acompanhamento de seu cumprimento, a critério do juízo da execução penal. 9. Ainda com relação à apenação pela prática do falsum, desta feita em desfavor do então prefeito, fixa-se, igualmente, a pena-base em 03 (três) anos de reclusão, acrescendo-se, na sequência, 06 (seis) meses, em face da circunstância agravante prevista no art. 61, II, 'b', do Código Penal ("para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime"), resultando em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão para o aludido réu, ora tornada concreta e definitiva, em razão da ausência de causas especiais de aumento ou diminuição de pena. Pena de multa (art. 49, do CP), doravante fixada em 100 (cem) dias-multa, sendo o dia-multa, orçado em 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato. Em face da novel condenação aqui estabelecida, resulta, em face do então prefeito, o quantitativo concreto e definitivo de 08 (oito) anos de reclusão, regime inicial de cumprimento de pena semiaberto. Mantidos todos os demais termos e comandos adotados no veredicto, a título de fixação das penas dos apelantes, desde que não colidentes com o conteúdo do presente Acórdão. 10. Improvido o recurso do ex-prefeito, mantendo-se a condenação pela prática do crime de responsabilidade; providos, na sequência, os apelos dos demais réus, para absolvê-los do crime de responsabilidade; provido, em parte, o recurso ministerial, para condenar todos os apelados, pela prática do delito do art. 297, §1º, do Código Penal. 

Para ler o documento na íntegra, clique aqui!

Comments are closed.