ACR – 13387/PE – 0011755-20.2013.4.05.8300

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL LEONARDO CARVALHO -  

PENAL. CRIME DE USO INDEVIDO DE SÍMBOLO UTILIZADO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL - ART. 296, § 1º, III, DO CÓDIGO PENAL. SELO DE AUTENTICIDADE DE INSPEÇÃO FEDERAL (SIF) DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, SEM A DEVIDA APROVAÇÃO E REGISTRO DOS PRODUTOS COMERCIALIZADOS. CRIME CONTRA A RELAÇÃO DE CONSUMO, PELA FALSA OU ENGANOSA QUALIDADE DO PRODUTO COMERCIALIZADO - ART. 7º, VII, DA LEI Nº 8.137/1990. INDUÇÃO DO CONSUMIDOR A ERRO PELA INDICAÇÃO ENGANOSA DA QUALIDADE DOS PRODUTOS COMERCIALIZADOS, DIANTE DA APOSIÇÃO DO SELO DE INSPEÇÃO FEDERAL. DOLO GENÉRICO. DANO AO CONSUMIDOR. PRESCINDIBILIDADE DO RESULTADO. PERÍCIA. DESNECESSIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. SOPESAMENTO EM DESFAVOR DA RÉ. QUANTIDADE DO PRODUTO APREENDIDO EM DECORRÊNCIA DA CONDUTA. DISSOCIAÇÃO DO NORMAL AO TIPO PENAL. NECESSIDADE DE EXACERBAÇÃO DA PENA BASE A PARTIR DO PATAMAR MÍNIMO. PENA SUBSTITUTIVA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE NO QUANTUM FIXADO NA PENA, A PAR DOS ELEMENTOS DOS AUTOS, PARA A NECESSÁRIA REPROVAÇÃO DOS ATOS PRATICADOS. APELAÇÃO DA DEFESA IMPROVIDA. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Cuida-se de apelação interposta por ambas as partes contra sentença que julgou procedente a denúncia para condenar Maria Aldeiza de Fátima Ferreira Nogueira, pelo capitulado no art. 296, § 1º, III, do Código Penal, e no art. 7º, VII, da Lei nº 8.137/1990, em concurso formal, às penas de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime de cumprimento inicialmente aberto, e de 10 (dez) dias-multa, cada qual valorado em 1/2 (metade) do salário mínimo vigente à época dos fatos, atualizado quando da efetiva execução, substituída a primeira por duas restritivas de direitos, noticiando a denúncia que a acusada, na qualidade de sócia administradora da empresa KMA Indústria e Comércio de Produtos Fitoterápicos Ltda., fez uso inadequado de símbolo utilizado pela Administração Pública Federal, no caso o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), em rótulos de produtos pela mesma comercializados, sem a devida aprovação e registro perante aquele Ministério, e assim induziu os consumidores em erro, por meio da falsa indicação sobre a qualidade dos produtos por ela comercializados, ao indicar, com a aposição do referido selo SIF, terem sido devidamente registrados e aprovados, o que na realidade não ocorreu. 2. Em suas razões recursais aduz o órgão ministerial a necessária dissociação da pena base do patamar mínimo cominado para cada uma das condutas imputadas à ré, por entender não se mostrar mínima a culpabilidade e, ainda, serem negativas a personalidade e as circunstâncias do crime, bem como não se mostrar razoável o valor imposto como prestação pecuniária, fixada em R$ 200,00 (duzentos reais) mensais, enquanto que a defesa alega a ausência da demonstração do dolo e, no que diz respeito à conduta do art. 7º, VII, da Lei nº 8.137/1990, fazer-se necessária a realização de perícia em que se demonstre a ausência de dano ao consumidor e, ao final, subsidiariamente, ver aplicada pena mais branda. 3. De início é de se afastar o alegado quanto à ausência de dolo, seja por não se exigir o resultado para as condutas imputadas à ré/apelante, seja pelos elementos carreados aos autos, eis que se aponta o indevido uso de selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF), a indicar a conduta do crime do art. 296, § 1º, III, do Código Penal, e, por consequência, a indução do consumidor a erro pela enganosa indicação de qualidade do produto que, na realidade, não se submetera à fiscalização exigida, consubstanciando a conduta ditada no art. 7º, VII, da Lei nº 8.137/1990. 4. Consta dos autos que a ré/apelante buscou o necessário registro da empresa junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), contudo antes mesmo de concluído o procedimento administrativo, e sabedora da necessidade de nova vistoria nas dependências para verificação das instalações e dos equipamentos, expôs seus produtos à venda com a indicação, nos rótulos, de serem inspecionados e aprovados pelo SIF/MAPA, sendo eles encontrados, em fiscalização conjunta da ANVISA e da Polícia Federal no sertão do Estado de Pernambuco, além de já haver sido apreendidos, dias antes por outra ação isolada da ANVISA, em distribuidora de medicamentos sediada em Jaboatão dos Guararapes/PE, e que, após tal ação na distribuidora de medicamentos, ao ser o MAPA notificado da venda irregular, verificou-se que antes mesmo de haver requerido o registro dos rótulos dos produtos junto ao SIF, já tinha fabricado os produtos, expondo-os à venda logo após, constatando-se, ainda, diversas irregularidades na rotulagem, tais como cor e tamanho do carimbo SIF, recomendação medicamentosa, diferença de ingredientes e divergência no número do registro, bem como não ter sido submetida à aprovação do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (DISPOA). 4. Em relação ao argumento de que fora autorizada pelo superintendente da Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento no Estado de Pernambuco de que já poderia comercializar seus produtos nos limites estaduais, ainda que tenha ocorrido - mas que é negado pelo mesmo em juízo, seja de forma oral ou escrita - não restaria autorizado o uso do selo SIF, eis que na dependência da análise da rotulagem pelo DISPOA, em Brasília, e de nova vistoria às dependências da empresa, situação esta comunicada por meio de expediente oficial. 5. Quanto à conduta do art. 7º, VII, da Lei nº 8.137/1990, de igual sorte prescinde do resultado, sendo certo que a indevida aposição do selo SIF nos produtos concorre para a configuração do tipo penal, de induzir o consumidor a erro, por via de afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza ou qualidade, utilizando-se de qualquer meio, desta forma, inclusive por não exigido o dolo específico, descabe a realização de perícia para aferir eventual dano ao consumidor, até mesmo por não requerida no adequado momento processual. 6. No que diz respeito à dosimetria da pena, em que a defesa pretende mais branda, enquanto que o órgão acusador sua exacerbação, observa-se da sentença que, para ambas as condutas restou fixadas penas base no patamar mínimo cominado, pelo que, ainda que presente a atenuante da confissão, não há como conduzir, na segunda fase da dosimetria, a quantum inferior, a teor da Súmula nº 231/STJ e, por ausentes causas de diminuição da pena, é de se manter, na terceira fase, o mesmo fixado na fase inicial, pelo que, tratando-se de concurso formal, por aplicado o mínimo previsto para a elevação da pena na sentença, também não há de se falar em possibilidade de menor apenação. 7. Em relação à insurgência do Ministério Público Federal, que, ao contrário, pretende a elevação das penas, aduz o órgão acusador a necessidade de se valorar negativamente a culpabilidade, a personalidade da ré e as circunstâncias do crime, não se divisa mácula na interpretação do juízo a quo na sentença no que diz respeito à culpabilidade e à personalidade da ré, eis que ser possuidor de conhecimento da natureza criminosa, por si só, não enseja reprovabilidade dissociada do tipo penal, enquanto que não há, dada a sua ausência nos autos, elementos hábeis à aferição da personalidade. Contudo, em relação às circunstâncias do crime, o quantitativo de produtos em que se fez uso indevido do selo SIF deve ser levado em consideração, eis que não possuíam o definitivo registro a possibilitá-lo, além do que sua exibição, quando da exposição à venda, induziu a erro seus consumidores, quanto à qualidade do produto, por acreditarem sujeito a regular fiscalização, em que no caso foram apreendidos 522 (quinhentos e vinte e dois) frascos de produtos com a indevida identificação na rotulagem, não se sabendo eventual distribuição ao consumidor usuário final, situação essa a impedir uma valoração positiva ou neutra mas, ao contrário, um desvalor, pelo que é de se reformar, ao menos neste ponto, a sentença para fixar nova pena-base, dissociando-a do patamar mínimo ao se considerar uma das circunstâncias judiciais como negativa, sendo necessária à reprovabilidade elevá-la em 6 (seis) meses para, ao final, fixá-la em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses e, por reconhecida a atenuante da confissão pela sentença, minora-se a pena em 6 (seis) meses, atingido, nesta fase, uma pena de 2 (dois) anos, a qual, por inexistentes causas de aumento ou de diminuição, se mantém na terceira fase para, dado o concurso formal, aplicável a fração mínima, pelos fundamentos já expendidos na sentença, para ao final, por concreta e definitiva, fixar a pena privativa de liberdade em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. 8. Diante  do coligido aos autos, em que se mostrou pertinente a fixação da pena de multa com cada dia-multa valorado em 1/2 (metade) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizado quando da efetiva execução, não se mostra razoável a fixação da pena substitutiva de prestação pecuniária no importe de R$ 200,00 (duzentos reais), pelo que é de se fixar a mesma em R$ 500,00 (quinhentos reais) mensais como forma de representar a devida reprovação pela conduta praticada, mantidos os demais termos da sentença. 9. Apelação da defesa improvida. 10. Apelação do Ministério Público, tão somente para valorar negativamente as circunstâncias do crime e, ainda, majorar a pena substitutiva de prestação pecuniária.

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