ACR – 13449/RN – 0003527-13.2014.4.05.8400

RELATOR:  DESEMBARGADOR RUBENS DE MENDONÇA CANUTO NETO -  

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. MANTER DINHEIRO EM DEPÓSITO NO EXTERIOR, SEM COMUNICAR ÀS AUTORIDADES COMPETENTES. CONFIGURAÇÃO. CRIME CONTRA O SISTEMA TRIBUTÁRIO. SUPRESSÃO DE TRIBUTO POR OMISSÃO DE COMUNICAÇÃO DE ELEMENTO ESSENCIAL À CARACTERIZAÇÃO DO FATO GERADOR. DELITO NÃO CONFIGURADO. LAVAGEM DE CAPITAIS. AUSÊNCIA DE PROVA DO USO DE PRODUTO DE CRIME EM ATIVIDADE EMPRESARIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. APELAÇÕES IMPROVIDAS. I - Apelações apresentadas por MARIA AMÉLIA CARVALHO GOMES e ADRIANO DA NÓBREGA GOMES, porque foram condenados nas penas do art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (cada um a dois anos de reclusão, com substituição por duas penas restritivas de direitos, bem como a dez dias-multa de três salários mínimos). Dizem que a conduta de ambos é atípica ou no máximo configuradora do crime de contra a ordem tributária antevisto no art. 1º, I, da Lei 8.137/90. Apelo também do MPF, pedindo que os RÉUS sejam condenados, também, pelo crime do art. 1º, § 2º, I, da Lei 9.613/98. II - Preliminar de inépcia da denúncia. Peça inaugural conformada no art. 41 do CPP. Preambular recusada. III - Segundo afirmação do MPF, entre 30 de março de 2001 e agosto de 2013, os RÉUS mantiveram no estrangeiro depósitos de valores em dólares superiores ao limite de U$100.000,00 sem a devida declaração ao BANCO CENTRAL DO BRASIL e à RECEITA FEDERAL, tendo também utilizado, em 30/07/2013, 02/08/2013 e 15/08/2013, numerário destacado desses valores para custear atividades da empresa AEROTUR SERVIÇOS DE VIAGEM LTDA, da qual são sócios. Esses fatos foram comprovados através da documentação de movimentação financeira que repousa nos volumes do inquérito, com extrato exposto nas fls. 643 a 645 do vol. III do apuratório policial. Afasta de controvérsias o que consta dos interrogatórios dos RECORRENTES. IV - Ainda assim, afirmam os RÉUS/APELANTES que essa conduta - ter o dinheiro no exterior sem comunicar às autoridades administrativas brasileiras - configuraria, no máximo, o delito do art. 1º, I, da Lei 8.137/90. Tanto que nas fls. 264 a 266 centram forças nessa construção recursal, argumentando que foi essa a conclusão à qual chegou o inquérito. Não foi. A autoridade policial, ao elaborar o relatório, indicou que os ora RECORRENTES cometeram os crimes do art. 1º, I, da Lei 8.137/90, mas também os do art. 22 da Lei 7.472/86 e do art. 1º, § 2º, I, da Lei 9.613/98. Ou seja: um, outro e outro, sem exclusão. V - Ainda que a conclusão do inquérito não seja vinculante para os termos da promoção da ação penal, muito menos para a sentença, é necessário que sejam postas as afirmações nos moldes que elas estão no processo, para que assim se tenha uma melhor compreensão da matéria posta em julgamento. VI - Para o julgamento da causa, a solução para o conflito aparente de norma que se estabelece (entre o art. 1º, I, da Lei 8.137/90 e o art. 22, parágrafo único, da Lei 7.472/86), necessária uma percuciente análise dos fatos, especialmente da motivação que norteou os APELANTES/RÉUS. VII - O animus dos agentes, no presente caso, não era frontalmente o de burlar o cumprimento das obrigações tributárias, embora isso pudesse ocorrer como consectário; o que confessadamente desejavam era dispor de numerário no exterior, até mesmo para fazer face aos seus negócios com a empresa AEROTUR SERVIÇOS DE VIAGENS LTDA. VIII - Então, pela especialidade que do caso flui, a conduta dos RÉUS/APELANTES fica subsumida ao tipo do art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492. IX - Quanto ao dolo, elemento essencial para a prática do crime em apreço, pode ele ser aferido a partir dos interrogatórios dos RÉUS, bem assim do aporte testemunhal (cf. fls. 191 a 193): desinteresse em informar às autoridades a mantença de numerário no exterior além do permitido, embora sendo os APELANTES pessoas esclarecidas e de há muito estabelecidas no ramo de serviços de viagens internacionais, o que as obriga a ter contato com normas tributárias atinentes ao ramo. X - Correto o ao enquadramento dos RÉUS/APELANTES no tipo penal do art. art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492. XI - Sobre a responsabilização dos RECORRENTES por lavagem de capitais (art. 1º, § 2º, I, da Lei 9.613/982), não solta do conjunto probante elementos que possam atestar essa prática. Mas, diversamente de como foi fundamentado na sentença (fl. 195), o crime em apreço não é o do caput do art. 1º, mas sim o do inciso I do § 2º. Logo, o núcleo verbal não é "ocultar ou dissimular", mas sim utilizar, "na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores que sabe serem produtos de infração penal". XII - No caso vertente os RÉUS/APELANTES não usaram nas suas atividades empresarias (serviços de viagens e turismo) qualquer produto de infração penal; se usaram o dinheiro mantido no exterior, quando muito lançaram mão do objeto material do crime do art. 22, parágrafo único, da Lei 9.613/98. Afinal, o crime não é manter dinheiro no exterior, mas sim deixar de declarar à repartição federal competente os depósitos que titulariza no estrangeiro. Não há, portanto, lavagem de dinheiro. XIII - Apelações improvidas.

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