ACR – 14694/PE – 2008.83.00.017416-5 [0017416-53.2008.4.05.8300]

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBELO JÚNIOR -  

PENAL E PROCESSUAL PENAL. SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO MULTIMÍDIA DE ACESSO À INTERNET VIA RÁDIO SEM AUTORIZAÇÃO DA ANATEL. LEI Nº 9.472/97. ART. 183. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. INEXISTENCIA DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE OU CULPABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE E DESNECESSIDADE DE PERÍCIA EM RELAÇÃO AO TIPO PENAL. CONSTITUCIONALIDADE DA PENA DE MULTA. DOSIMETRIA DA PENA. CONDUTA SOCIAL. SÚMULA 444 DO STJ. APLICAÇÃO. REDUÇÃO DA PENA-BASE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Insugência contra sentença que julgou procedente a denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal para condenar o Apelante pelo crime previsto no art. 183, caput, da Lei 9.472/1997 (desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicações) à pena de 03 (três) anos de detenção, substituída por duas penas restritivas de direito e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais). 2. Segundo a Inicial acusatória, o Réu, na condição de proprietário da Empresa SPEED NET INFORMÁTICA (J.B DOS SANTOS), instalou e pôs em funcionamento uma estação que explorava clandestinamente serviço de telecomunicações multimídia, mediante transmissão de sinal de internet, via rádio, tipificando a conduta no art. 183, caput, da Lei nº 9.472/1997. 3. Com a promulgação da Lei nº 9.472/97, a operação de exploração de serviços de telecomunicações de forma clandestina passou a ser punida pelo seu artigo 183, que sanciona a conduta consistente em instalar ou utilizar serviços de telecomunicações desobedecendo a exigências legais e regulamentares na execução dos referidos serviços. 4. No caso dos autos, o réu, voluntariamente, desenvolveu atividade de telecomunicação multimídia - SCM - internet, via rádiofrequência, sem a devida autorização da Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL, ciente de que a falta de permissão para o serviço pelo órgão competente acarretaria a conduta ilícita descrita no artigo 183 da Lei nº. 9.472/97, e não daquela prevista no art. 70 da Lei 4.117/62, que tipifica a conduta de quem apenas instala ou utiliza telecomunicações ao arrepio da lei e regulamentos. 5. A clandestinidade, elemento do tipo, é relativa ao desconhecimento pelo órgão regulatório de que a atividade está sendo desenvolvida, ou seja, está se explorando o serviço sem a devida autorização e fiscalização legalmente exigidas. Não guarda relação com o desconhecimento de prestador e usuários. O serviço prestado/disponibilizado pelo Apelante era, de fato, ostensivo aos usuários, mas clandestino para a ANATEL. 6. A conduta típica do réu não permite a utilização do princípio da bagatela, tendo em vista a potencialidade lesiva, a periculosidade da conduta para a sociedade, razão pela qual se reconhece o interesse estatal para persecução em razão da segurança dos serviços de telecomunicações. 7. A materialidade delitiva e a autoria restaram devidamente comprovadas nos autos. Consta do Inquérito Policial o Termo de representação da ANATEL, no qual Agentes de Fiscalização constataram, em 25 de julho de 2008, a existência de estação explorando, clandestinamente, Serviço de Comunicação Multimídia - SCM, pela empresa de propriedade do Réu. Há  Auto de Infração  e qualificação de atividade clandestina, cientificando o autuado da irregularidade da sua conduta, referentes à exploração clandestina de serviços de comunicação multimídia. 8. Do arcabouço probatório contido nos autos, identifica-se que a autoria do delito é inconteste, visto que o Apelante, na qualidade de proprietário da empresa SPEED NET INFORMÁTICA (J.B. DOS SANTOS ME), deixou de explorar um Serviço de Valor Adicionado - SVA (nos moldes do art. 61 da Lei Geral de Telecomunicações), quando explorava serviços em uma  lan house com o mesmo nome, em Ponte dos Carvalhos, Jaboatão dos Guararapes-PE, e passou a explorar Serviço de Comunicação Multimídia - SCM, consistente no fornecimento, via rádio, de capacidade de transmissão de informações, ao desviar e comercializar parte do link contratado com junto à empresa World Net, sem a competente autorização da ANATEL. 9. O Recorrente alega que possuía autorização, mas, na verdade, utilizou-se do Serviço de Valor Adicionado - SVA (contratado nos moldes do art. 61 da LGT) e assumiu a posição de prestador de serviço na modalidade SCM, serviço de comunicação multimídia, com capacidade de transmissão de informações, ao arrepio da lei e do conhecimento da ANATEL. 10. O STJ em sua jurisprudência reiterada entende que a transmissão clandestina de sinal de internet, via rádio, sem autorização da ANATEL, caracteriza, em tese, o crime tipificado no art. 183 da Lei 9.472/97. (AGRESP 201303299433, Marilza Maynard (Desembargadora Convocada Do TJ/SE), STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:12/05/2014. DTPB). 11. No que tange à questão da perícia técnica, verifica-se a sua impossibilidade. Na fase inquisitorial, o aparelho não foi apreendido por culpa exclusiva do denunciado, visto que  dificultou o acesso ao equipamento  ao não permitir a entrada no seu apartamento no primeiro momento da persecução e, posteriormente, quando determinada a busca e apreensão, o apartamento encontrava-se fechado e abandonado, e  todo o material a ser examinado havia sido retirado. Dessa forma, não há objeto a ser periciado, sendo inviável a realização da perícia na forma pretendida. 12. O delito em questão não se trata de exploraçção de serviço de rádio comunitária clandestina, mas  de uso indevido de internet via rádiofrequência, não havendo necessidade  de se averiguar a potencialidade lesiva do aparelho utilizado. De se ressaltar que constam do inquérito policial fotografias dos aparelhos utilizados pela SPEED NET INFORMÁTICA, consistentes de  antenas instaladas no condomínio, equipamento (switch) utilizado para distribuição do sinal de internet no condomínio e internet comprovando o funcionamento do "provedor". 13. Atentando-se que o Apelante apresentou comportamento contrário à realização de perícia, constata-se o seu intuito do  de  valer-se de sua própria torpeza como benefício legal, o que resta afastado pela aplicabilidade do princípio nemo auditur propriam turpitudinem allegans, pelo qual não pode o acusado se valer de sua própria torpeza para fazer jus ao benefício pretendido. 14. Esta colenda Terceira Turma, à unanimidade, no julgamento da apelação criminal ACR 12438-PE (000111606.2014.4.05.8300), entendeu que a aplicação da multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) prevista na própria norma penal do art. 183 da Lei nº 9.472/97 não é inconstitucional. (ACR 00011160620144058300, Desembargador Federal Paulo Machado Cordeiro - Terceira Turma, DJE - Data: 02/09/2015 - Página: 22). 15. No tocante à dosimetria da pena, em que pese inexistir impugnação específica, verifica-se que o Parquet atuante nesta Corte Regional atentou que a circunstância judicial do art 59 do CP, conduta social, foi valorada em dissonância ao teor da Súmula 444 do STJ e requereu a sua modificação, o que está em consonância com a jurisprudência desta Corte no sentido da impossibilidade de se utilizar de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena base. Nesse particular, merece reforma a sentença vergastada apenas para ajustar a dosimetria da pena aplicada. 16. Apelação parcialmente provida apenas para excluir a valoração negativa da circunstância judicial conduta social, reduzindo-se a pena aplicada para  2 (dois) anos e 8 (oito) meses de detenção, mantendo-se a substituição da pena privativa de liberdade por  restritivas de direito na forma fixada na sentença.

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