ACR – 14776/PE – 0002437-08.2016.4.05.8300

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO -  

PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE PICHAÇÃO (ART.65 DA LEI Nº. 9.605/98) EM CONCURSO FORMAL PRÓPRIO COM O CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 244-B DA LEI Nº. 8.069/90). CRIME DE PICHAÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. CORRUPÇÃO DE MENORES. ATIPICIDADE MATERIAL. INOCORRÊNCIA. BAGATELA IMPRÓPRIA. PRISÃO PROCESSUAL. IRRELEVÂNCIA. REDUÇÃO DA PENA DE MULTA. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Apelação interposta pela defesa contra sentença que, julgando procedente a denúncia, condenou o réu à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direito, e 15 (quinze) dias-multa, no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática dos crimes previstos nos arts. 65 da Lei nº. 9.605/98 e art. 244-B da Lei nº. 8.069/90. Conforme exposto na Denúncia, o réu teria pichado muro do Departamento Nacional de Infraestrutura e transporte - DNIT na cidade do Recife/PE, em comunhão de ações e desígnios com três adolescentes infratores. 2. Razão não assiste ao apelante quanto à aplicação do princípio da insignificância ao delito previsto no art. 65 da Lei nº. 9.605/98, porque a conduta do acusado violou de forma efetiva os bens jurídicos protegidos pela norma penal incriminadora: o meio ambiente artificial e o patrimônio público. Compulsando os autos, verifica-se que o curso da ação delitiva já estava avançado no momento da prisão em flagrante, conforme indicou a autoridade policial, ao afirmar que "o muro do DNER foi realmente pichado" (Auto de Prisão em Flagrante - fl. 03 do IPL), tendo o próprio réu admitido que ele e os três adolescentes já "terminavam de pichar o muro" quando foram abortados pelos policiais militares (fl. 04 do IPL). Além disso, pela quantidade de agentes e pelo modus operandi aplicado (uso de pincel tipo rolo e lata de tinta azul - auto de apreensão de fl. 06 do IPL), percebe-se que foi considerável o dano causado pelo acusado, não havendo que se falar, portanto, em atipicidade material da conduta. Precedente do TJDFT: Ac. n. 542889, Rel. HECTOR VALVERDE SANTANNA, TJDFT - 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, DJE: 21/10/2011. 3. Tampouco merece acolhida a alegação de que o crime de corrupção de menores não foi consumado nem foi materialmente típica a conduta, por não ter sido o réu quem tomou a iniciativa criminosa, apenas participando de prática delitiva já concebida pelos menores. Desde logo, convém destacar o tipo penal do art. 244-B do ECA, ali estando expresso que a corrupção de menores pode se dar tanto pela indução à prática do crime, quanto pela prática conjunta da infração. Além disso, o STJ, no Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.127.954/DF, já decidiu que "para a configuração do crime de corrupção de menores, atual artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, não se faz necessária a prova da efetiva corrupção do menor, uma vez que se trata de delito formal, cujo bem jurídico tutelado pela norma visa, sobretudo, a impedir que o maior imputável induza ou facilite a inserção ou a manutenção do menor na esfera criminal" (REsp 1127954/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, STJ - Terceira seção, DJe 01/02/2012), sendo irrelevante, portanto, o fato de o adolescente já estar corrompido à época dos fatos (AgRg no AREsp 539297/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, STJ - Quinta Turma, DJe 29/08/2016), sendo este o entendimento já sedimento, inclusive, na Súmula nº. 500 do STJ: "a configuração do crime previsto no artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal". Considerando, portanto, que a participação de adultos na empreitada infracional, mesmo que tenha sido concebida pelo menor (o que, a propósito, não está cabalmente demonstrado nos autos), corrobora a atitude criminosa, colaborando com a manutenção da criança ou do adolescente no mundo do crime, não há como se afastar a condenação pelo crime do art. 244-B da Lei nº 8.069/1990. 4. No que se refere à teoria da bagatela imprópria (segundo a qual o Juízo deve isentar o réu da sanção penal quando entender que a sua imposição será concretaemnte desnecessária, não cumprido as finalidades legais da pena), não merece guarida o pleito do recorrente. A uma, porque a ocorrência de prisão processual, independentemente de sua duração, apenas possui um efeito legal: o da detração (art. 42 do CP), a ser aplicado na fase executória, não se prestando para isentar o réu de pena, ainda que, ao final, se verifique que a reprimenda a ser aplicada será menos gravosa que a própria prisão cautelar. A duas, porque o reconhecimento do crime bagatelar impróprio afronta o princípio da legalidade, tendo em vista que a necessidade da aplicação da pena não decorre do Poder Judiciário, mas, sim, da própria lei penal, não se podendo perder de vista que, em obediência ao princípio constitucional da separação dos poderes, o qual constitui, inclusive, cláusula pétrea (art. 60, §4º, III, da CF/88), ao magistrado cabe a missão de analisar, de modo criterioso e imparcial, as provas trazidas aos autos, a fim de constatar presença, ou não, dos elementos caracterizadores do delito, mas não as opções da política criminal adotadas pelo Poder Legislativo. Precedente do TJSP: Apelação nº 0016583-12.2014.8.26.0506; Rel. Des. AIRTON VIEIRA, TJSP - 3ª Câmara de Direito Criminal, julgado em: 24/10/2017. 5. Relativamente à aplicação das circunstâncias atenuantes da confissão espontânea (art. 65, III, do CP), da idade (art. 65, I, do CP) e do baixo grau de instrução e escolaridade (art. 14, I, da Lei nº 9.605/98) para diminuição da pena aquém do mínimo legal, ressalto que o STJ, no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.117.068, já decidiu que "a incidência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo estabelecido em lei, conforme disposto na Súmula n.º 231 desta Corte Superior", e que "o critério trifásico de individualização da pena, trazido pelo art. 68 do Código Penal, não permite ao Magistrado extrapolar os marcos mínimo e máximo abstratamente cominados para a aplicação da sanção penal" (REsp 1117068 PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, STJ - Terceira Seção, DJe 08/06/2012). Inadmissível, portanto, a reforma da sentença nesse ponto. 6. Quanto ao pedido subsidiário apresentado pela defesa (redução da pena de multa ao mínimo legal, sendo necessária a diminuição do quantum fixado de 15 para 10 dias-multa, impondo-se, ainda, o valor dos dias multas à fração de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, não merecendo prosperar a parcela de 1/3 estabelecida na sentença, ante a condição socioeconômica desfavorável do réu), tenho que merece acolhida, em parte, a irresignação do apelante. Para a aplicação da pena de multa, deve-se observar o critério bifásico previsto em lei (art. 49 do CP). Quanto à primeira fase (determinação do quantum de dias-multa), não merece reparo a sentença, porque, apesar de as penas privativas de liberdade de ambos os crimes (arts. 65 da Lei nº. 9.605/98 e art. 244-B da Lei nº. 8.069/90) terem sido fixadas no mínimo legal (fl. 116), o agente praticou mais de uma conduta delitiva, incidindo o instituto do concurso formal próprio. Desse modo, ante a pluralidade de bens jurídicos violados, é adequado o quantum de 15 (quinze) dias-multa fixado na sentença. Todavia, no que diz respeito à segunda fase (valor dos dias-multa aplicados), compreendo que a fração de 1/3 (um terço) mostra-se excessiva, tendo em vista as condições socioeconômicas do réu, o qual é beneficiário da gratuidade de Justiça (fl. 118), não possui alto nível de escolaridade nem trabalha (fl. 136). Desta feita, torna-se necessário reduzir o valor da multa de 1/3 para a fração de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato. 7. Apelação parcialmente provida, apenas para reduzir o valor da pena de multa imposta para a fração de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

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