Acr – 2007.84.00.003657-0

Penal e processual penal. Crimes de formação de quadrilha, lavagem de Dinheiro e evasão de divisas. Art. 288 do código penal, lei nº 9613/98, e lei nº 7492/86, Respectivamente. Réu estrangeiro. Organização criminosa internacional. Denúncia. Correta descrição e delineamento das condutas atribuídas aos réus. Pacto Internacional sobre os direitos civis e políticos. Necessidade de tradução da peça Acusatória. Alegação inoportuna. Violação à ampla defesa. Inexistência. Tradução De todos os documentos. Não obrigatoriedade. Documentos não juntados aos autos Pela defesa. Nulidade. Inocorrência. Juiz sentenciante. Titular da vara federal. Participação em audiências de oitiva de testemunhas. Distribuição do processo para Este magistrado. Rejeição das preliminares. Delito de formação de quadrilha. Prescrição. Ocorrência. Interceptação telefônica. Degravação integral dos Diálogos. Desnecessidade. Prorrogações sucessivas. Possibilidade. Decisões Fundamentadas pelo magistrado. Ausência de maus-tratos a normas e princípios Constitucionais. Preliminares derradeiras afastadas. Mérito. Autoria e Materialidade delitivas devidamente comprovadas. Lavagem de capital. Dolo Específico demonstrado. Comprovação dos delitos antecedentes. Relatório fiscal Estrangeiro.ligação criminosa societária entre os réus. Criação de empresas Offshore. Rendas declaradas. Patrimônios adquiridos. Incompatibilidade. Crime Contra o sistema financeiro nacional. Evasão de divisas. Forma equiparada. Elementos normativos do tipo. Norma penal em branco. Regulamentação. Banco Central do brasil. Consumação. Suficiência do dolo genérico. Habitualidade. Prescindibilidade. Modus operandi. Simulação de negócio jurídico. Preço inferior ao Real valor dos contratos imobiliários. Declaração de bens e valores à fazenda Nacional. Irrelevância. Fins criminais. Depósito de valores no exterior. Limite Regulamentar. Declaração. Instituição máxima monetária. Necessidade. Efeitos da Condenação. Perda de bens em favor da união. Sequestro de bens. Produtos Resultantes da ação ilícita. Preliminar de extinção da punibilidade, em relação ao Crime do art. 288 do código penal, acolhida. Apelações pacialmente providas. I. Os réus foram condenados pelo cometimento, em tese, dos delitos de formação de quadrilha ou bando, lavagem de dinheiro, e evasão de divisas, oportunidade em que a sentença vislumbrara uma organização criminosa internacional. II. Tratando-se de delito em contexto societário, prescinde a peça acusatória de extenso detalhamento das ações imputadas aos réus, ante a complexidade do feito, exigindo-se tão somente a relação entre eles e as empresas que tenham objeto ou fins ilícitos. III. Preliminares foram suscitadas pelos apelantes, sendo a primeira mencionada acerca da exibilidade de o réu ser informado em sua língua, com celeridade, do teor da acusação. A peça acusatória fora devidamente traduzida, ainda que após o interrogatório judicial, inclusive, na audiência correspondente e em outros momentos da fase instrutória processual, todos neles acompanhados de seus respectivos procuradores legais e do tradutor nomeado pelo juízo, os acusados não se manifestaram neste sentido, o que se presumiu pela total compreensão deles a respeito do que eles foram imputados na exordial. Preliminar afastada. IV. Não há obrigatoriedade de que todos os documentos sejam traduzidos, e caso algum desses assim deva, é necessário que seja juntado aos autos pela parte interessada. Ainda, o recorrente não demonstrou em nenhum momento a impossibilidade de obtê-los por via própria, restando afastada a tese de que o Órgão Ministerial teria pinçado-os ou sonegado-os, pelo que não há no que se falar em nulidade decorrente. V. O juiz sentenciante, não fora o mesmo que presidiu a instrução na maioria de seus atos processuais. Contudo, isso não é causa necessária de prejuízo à defesa, e, por conseguinte, de nulidade processual. Aquele magistrado, além de ser titular da vara federal para qual o processo fora distribuído, presidiu duas audiências de oitiva de testemunhas, o que não gera maus-tratos ao princípio da identidade física do juiz. VI. Reconhece-se a ocorrência da prescrição retroativa do crime de formação de quadrilha, motivo pelo qual são extintas as punibilidades dos agentes quanto a este delito. O lapso temporal entre a data do fato delituoso e o recebimento da denúncia ultrapassa 4 (quatro) anos, período este referente ao prazo prescricional correspondente à pena in concreto dada aos réus, todas não superiores a 2 (dois) anos de reclusão, observando-se o disposto nos artigos 109, V e 110, todos do Código Penal. VII. Desnecessária a degravação de todos os diálogos colhidos das interceptações telefônicas. Ainda, não é verdade que as conversações tiveram suas transcrições de autoria exclusivamente ministerial, pois este procedimento respeitou os moldes previstos na legislação específica, qual seja a Lei nº 9296/96, especialmente no tocante a obrigatoriedade de as degravações serem feitas pela autoridade policial, conduta esta verificada in casu, motivo pelo qual não merece acolhida a preliminar suscitada, neste ponto. VIII. Cristalino o entendimento dos Tribunais Superiores a respeito da viabilidade de o prazo para a concessão das interceptações telefônicas ser prorrogado sucessivas vezes, se demonstrada a indispensabilidade deste meio probatório, e observados os termos legais, requisitos estes verificados nos autos, e adequadamente fundamentados nas decisões que determinaram as sucessões correspondentes. O óbice para a permanência destas diligências em casos como este, que integra uma complexidade de fatos, pluralidade de réus e de condutas delituosas, culminaria, aí sim, em uma ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Não há previsão legal que expresse uma permissão neste sentido, tampouco há que a negue. A imprescindibilidade deste instrumento probatório mostra-se como o amparo legal para qualquer decisão que prorrogue seu prazo de operação, sem ferir os preceitos processuais penais e constitucionais. IX. No que tange ao mérito das apelações, a respeito das condenações, há de se falar primeiramente das condutas relacionadas com o delito de lavagem de capitais. Não obstante este exigir, para a sua consumação, o dolo específico dos agentes, este fora devidamente demonstrado nos autos, visto que aqueles tinham plena consciência da procedência criminosa das fontes econômicas que culminaram com a transposição de movimentações imobiliárias e financeiras, nas quais tiveram participação. X. O delito de lavagem de capitais pressupõe a existência e a comprovação do cometimento de infrações antecedentes, que dão causa à origem ilícita dos objetos daquele crime. No caso dos autos, os atos criminosos prévios foram comprovados, pelo que consta nos relatórios fiscais emitidos pelas autoridades norueguesas. XI. Constatada a criação de empresas offshore, modalidade comum na prática do delito de lavagem de capitais, situadas em “paraísos fiscais“, que têm por finalidade gerar mais vantagens, obstar responsabilidades fiscais perante às autoridades competentes, em intuito lucrativo. O “anonimato“ desses estabelecimentos cobre a responsabilidade delas, ocultando a sua origem em detrimento das exigências tributárias e monetárias correspondentes. XII. A partir dos dados apresentados pela autoridade fazendária brasileira, verifica-se a incompatibilidade entre as rendas declaradas pelos réus e o patrimônio supostamente adquirido por eles, como forma de dissimular a sua origem. XIII. No tocante às imputações relativas ao crime contra o Sistema Financeiro Nacional, qual seja a forma equiparada no dispositivo legal que tipifica a evasão de divisas, contém o preceito penal elementos normativos do tipo que caracterizam uma norma penal em branco, a qual exige regulamentação específica, a qual, no caso, tem fulcro nas disposições do Banco Central do Brasil, órgão monetário máximo pátrio, que define o limite mínimo de valor para ter que se declarar os depósitos financeiros no exterior, obtidos e mantidos por pessoas físicas ou jurídicas com residência, domicílio ou sede no Brasil. No caso dos autos, os réus não apresentaram elementos que comprovassem qualquer declaração neste sentido, tendo em vista que possuíam valores no exterior superiores a US$ 100.000,00 (cem mil dólares estadunidenses), sendo irrelevante, inclusive, qualquer informação a este respeito perante a Receita Federal, visto que as questões tributárias não se relacionam com os fins criminais previstos na legislação que trata do delito em comento. XIV. Desnecessária a habitualidade para a consumação do crime contra o Sistema Financeiro Nacional, de modo que um único depósito já enseja sua prática, sendo necessário comprovar apenas o dolo genérico da conduta dos réus, conforme evidenciado no caso concreto. XV. Demonstrada que a procedência do bem que pretende restituir decorre dos atos ilícitos objeto da persecução penal, não há que se falar em ilegalidade da medida de sequestro e perda em favor da União. XVI. Apelações parcialmente providas, por acolhida a preliminar de extinção da punibilidade quanto ao ilícito do art. 288 do Código Penal, pela ocorrência da prescrição retroativa (art. 107, IV c/c art. 109, V, ambos do Código Penal).

Rel. Des. Margarida Cantarelli

Download (PDF, Unknown)

No Comments Yet.

Leave a comment