Penal e processual penal. Evasão de divisas e crime contra a ordem tributária. Manutenção da condenação do acusado pelo delito de evasão de divisas. Dolo Demonstrado. Absolvição da ré quanto ao delito de evasão de divisas. Autoria não Evidenciada. Sonegação fiscal. Materialidade e autoria comprovadas. Pena-base Excessiva. Continuidade delitiva que deve ser reconhecida, no que concerne à Sonegação fiscal. Prescrição retroativa. Extinção da punibilidade. 1. O delito de evasão de divisas exige apenas a saída de moeda ou divisa ao exterior, sem contudo - e em contraposição à figura típica prevista no caput - requerer para tanto uma intenção especial, isto é, um requisito subjetivo transcendental, que seria o dolo específico. Assim, basta a efetiva comprovação da remessa dos valores, inclusive por se tratar de crime material, bem como da consciência e vontade de concretizar os requisitos objetivos do tipo (dolo genérico). 2. Resta devidamente comprovada a saída de moeda ou divisas, uma vez que, após prestar informações à Receita Federal (fls. 81/86), a Parai Computação Gráfica Ind. e Com. Ltda, não logrou justificar, com documentação hábil e idônea, as operações de remessa ao exterior referentes aos dias 27/07/2001, 21/08/2001, 02/10/2001, e 24/01/2002, nos valores de US$ 2.322,75, US$ 2.400,00, US$ 1.683,00 e US$ 1.548,50, respectivamente. No que toca a prova documental, observem-se os extratos acostados à Representação Fiscal nº 473/2005, os quais evidenciam a evasão de divisas por intermédio de contas pertencentes ao BHSC - Beacon Hill Service Corporation, utilizadas por doleiros para a remessa de recursos ao exterior de forma ilegal. 3. No que concerne à autoria do delito, o acusado, em seu interrogatório judicial, admitiu que procurou outros meios legais de enviar o numerário para o exterior, porém resolveu realizar as operações através de um doleiro. 4. Com relação à ré, é de se perceber que esta compõe os quadros societários da Parai Computação Gráfica Ind. e Com. Ltda desde sua constituição, detendo noventa e nove por cento das cotas da referida pessoa jurídica. No entanto, compulsando os autos, não há nada que elida a alegação de que suas atividades na empresa não abrangem o comércio exterior. Resta admitir que a ré não teve participação na emissão ilegal de divisas, posto que o réu mostrou-se o responsável por esse procedimento, como pode se depreender de seu interrogatório, tendo inclusive admitido que realizou a operação de remessa por meio de doleiro, sem que haja menção, em nenhum momento, quanto à participação da corré. 5. Assim, no que tange à acusada, não há como inferir que esta perpetrou a conduta de evasão de divisas com consciência e vontade, elementos intelectivo e volitivo do tipo subjetivo, essenciais à configuração do dolo genérico. 6. Já no que pertine ao crime de sonegação fiscal, como bem destacado na sentença condenatória prolatada pelo magistrado a quo, os acusados deixaram de contabilizar, em livro próprio, as receitas correspondentes às despesas realizadas com as transferências, o que caracteriza omissão de receita, nos termos do consignado no ar. 1o., Inciso I, da lei no. 8.137/90. 7. Com relação à autoria do crime supracitado, ambos os réus apresentam-se como coautores, uma vez que o acusado, confessou, em seu interrogatório, que não contabilizou as remessas dos dólares ao exterior, tendo atribuído essa omissão a falhas operacionais. Já a acusada subscreveu documentos a fim de prestar informações requeridas pela Receita Federal. 8. Assim sendo, o pleito de absolvição da defesa merece ser acolhido apenas no que diz respeito a ré, no que diz respeito unicamente ao delito capitulado no art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 (evasão de divisas). 9. Passo agora ao exame da dosagem da pena dos acusado. Registro que o réu permanece condenado em ambos os delitos, evasão de divisas e ordem tributária, enquanto que em desfavor da apelante, como visto, só sobressai o delito em face da ordem tributária, haja vista sua absolvição neste julgamento da prática de evasão de divisas. 10. A pena-base fixada aos acusados acima do mínimo legal, em ambos os crimes, foi excessiva. Veja-se que se tratam de réus primários, com conduta social e personalidade que não foram tidas em desfavor dos mesmos. Os motivos do crime e circunstâncias do delito foram considerados como próprios à espécie, bem assim as consequências foram pequenas, como indicado na sentença; tudo isso justifica a fixação do mínimo legalmente previsto. 11. Quanto ao delito de evasão de divisas, em relação ao qual permanece o réu condenado, indicou o Magistrado, inclusive, que o montante enviado ao exterior não foi elevado. E, de fato, a quantia foi bem pequena, em considerando delitos desse porte. 12. Desse modo, não foi verificada razão, isso em fazendo a análise das circunstâncias do art. 59, do CPB, para que a pena-base dos acusados não tenha se iniciado no quantum de 2 anos de reclusão, previsto no preceito secundário dos dois artigos em exame, art. 1o., da Lei nº 8.137/90 (sonegação fiscal) e art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 (evasão de divisas). 11. Fixa-se a pena -base do acusado em 2 anos de reclusão, isso para os dois delitos ora examinados. No que diz respeito à ré, tendo havido a absolvição pela evasão de divisas, fixa-se a pena inicial pelo delito de sonegação fiscal também no mínimo de 2 anos de reclusão. 12. Permanece o aumento pela continuidade delitiva, em relação ao delito contra a ordem tributária, só que no percentual de 1/6, isso tendo em consideração o período de perpetração do crime, o que repercute em uma penalidade aos réus de 2 anos e 4 meses de reclusão, para os dois acusados. 13. Não assiste razão ao Ministério Público Federal ao pugnar, em seu apelo, pela majoração da pena-base no que tange ao delito de sonegação fiscal, por tudo que se expôs acima. Não cabe ao órgão acusatório, mediante comparações e definições do que entende por proporcionalidade, indicar exatamente o quantum a ser aumentado. 14. Deve ser reconhecida a continuidade delitiva, art. 71, do CPB, no que pertine ao delito de evasão de divisas, art. 22, parág. único, da Lei nº 7.492/86, é que foram observadas as remessas de quatro valores ao exterior, não justificados, o que, realmente, repercute na aplicação do artigo em comento, devendo ser acolhido, nesse ponto, o recurso ministerial. 15. Realiza-se, então, o aumento em 1/6, percentual que se tem por suficiente, tendo em consideração que foram quatro remessas, o que repercute em uma pena privativa de liberdade, em desfavor do acusado, de 2 anos e 4 meses de reclusão. 17. Em resumo, absolve-se a acusada, no que concerne ao crime de evasão de divisas, por não ter se comprovado a própria autoria do delito, mantendo-se a condenação da apelante quanto ao crime de sonegação fiscal, só que reduzindo a pena-base para o montante de 2 anos de reclusão, mínimo legal, terminando a pena privativa de liberdade definitiva em 2 anos e 4 meses, em razão do reconhecimento de prática de crime em continuidade delitiva (art. 71, do CPB). 18. O réu permanece condenado pela perpetração dos dois ilícitos criminais, só que a pena privativa de liberdade, em sua fase inicial, para os dois crimes, resta reduzida para o quantum de 2 anos, aumentada cada uma em 1/6, em razão da continuidade delitiva, o que faz a pena privativa de liberdade por cada delito terminar em 2 anos e 4 meses de reclusão. Em razão do concurso material (art. 29, do CPB), fica a pena do réu em 4 anos e 8 meses de reclusão. 19. Resta extinta a punibilidade dos dois acusados, em razão da prescrição retroativa. 20. O montante de pena referente à continuidade delitiva não se computa quando da apreciação de lapso prescricional. Nos termos do enunciado de número 497, da Súmula do Supremo Tribunal Federal, quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação. 21. Levando-se em conta a pena-base de 2 anos de reclusão fixada em desfavor dos acusados, para o réu restou fixada nesse montante nos dois delitos, o que se verifica é que a prescrição acontece em 4 anos, isso pelo que determina o art. 109, inciso V, do CPB, e tendo se consumado o delito, de acordo com a denúncia, no decorrer dos anos de 2001/2002, com a peça acusatória recebida em 15 de julho de 2008, o que se verifica é que ultrapassado período de tempo de quase 6 anos, suficiente, portanto, ao reconhecimento da causa extintiva da punibilidade, em ambos os delitos. 22. Dá-se parcial provimento ao apelo dos acusados, para absolver a ré da prática do delito de evasão de divisas (art. 386, inciso V, do CPB), mantendo-se em relação a esta unicamente a condenação pela sonegação fiscal, bem assim para reduzir a pena privativa de liberdade dos acusados para o quantum de 2 anos e 4 meses, ficando a pena da ré nesse montante, e a do acusado, haja vista o concurso material entre os delitos dos art. 1º, da Lei nº 8.137/90 (sonegação fiscal) c/c art. 71, do CPB (continuidade delitiva) e art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 (evasão de divisas), em 4 anos e 8 meses. 23. Reconhecimento, de ofício, da extinção da punibilidade dos dois acusados, em razão da prescrição retroativa, vez que ultrapassado lapso de tempo superior a 6 anos, entre a consumação dos fatos e o recebimento da denúncia (art. 109, inciso V, do CPB). 24. Apelações da defesa e do MPF a que se dão parcial provimento. Reconhecimento, de ofício, da extinção da punibilidade dos acusados pela prescrição retroativa.
REL. DES. MANOEL DE OLIVEIRA ERHARDT
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