Penal e processual penal. Sonegação de contribuição previdenciária. Art. 337-a do Código penal. Presidente da cofeco - colônia de férias dos empregados da coelce. Pagamento do débito. Dúvida quanto a eventual saldo remanescente. Responsabilidade penal não comprovada. Ausência de justa causa. Art. 395, iii, do Código de processo penal. Denúncia rejeitada. 1- O Ministério Público Federal, em aditamento à denúncia ofertada em desfavor de AMS, apresentou a peça acusatória em que atribui a AFCG a prática do delito tipificado no art. 337-A, III, c/c o art. 71, ambos do Código Penal. 2- Segundo o órgão acusador, AFCG ocupou o cargo de Presidente da COFECO (Colônia de Férias dos Empregados da COELCE) no período de 07/09/2001 a 06/09/2003, e, nessa condição, seria o responsável pela sonegação de contribuição previdenciária nesse período, por ter reduzido, em tese, a contribuição social previdenciária devida, com a omissão de pagamentos extras na Guia de Recolhimento do FGTS e Informações de Previdência Social - GFIP, sendo relacionada ao delito em tela a Notificação Fiscal de Lançamento de Débito (NFLD) nº 35.627.257-5, no valor de R$ 256.397,86, relativamente aos empregados Josimar C. Costa, Raimundo Bezerra Santiago e Neuma Lúcia Batista. 3- Posteriormente, com a informação de que o denunciado AFCG, em 01/02/2011, elegeu-se Deputado Estadual pela Assembléia Legislativa do Ceará, detendo foro por prerrogativa de função, foi proferida decisão declinatória de competência para esta Corte Regional, com o desmembramento dos autos. 4- Nos autos da ação penal n.º 0016943-27.2004.4.05.8100, o juízo da 11ª Vara Federal/CE, em 21/05/2013, proferiu sentença absolutória (transitada em julgado) em favor do co-denunciado AMS por não antever na conduta do acusado o dolo necessário à configuração do tipo penal de sonegação de contribuição previdenciária, inexistindo prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, CPP). 5- Em resposta à denúncia, a defesa de AFCG, pediu a extinção da punibilidade sustentando ter sido o débito quitado em sua integralidade. 6- O Ministério Público Federal, ratificando o aditamento à denúncia, e, entendendo incabível a discussão acerca da suficiência do pagamento nesta sede, pugnou pelo recebimento da denúncia, ou, alternativamente, fosse oficiada a Procuradoria da Fazenda Nacional solicitando informação sobre o aludido crédito tributário. 7- A Procuradoria da Fazenda Nacional, via comunicação eletrônica, informou que: “(...) Ocorre que, para cada competência compreendida no período de 09/2001 a 09/2003, que era o que o devedor pretendia quitar, havia débitos declarados e não declarados em GFIP. Quando o valor foi apropriado por competência, foram amortizados os débitos dos períodos de 09/2001 a 01/2002 e parte de 02/2002 de forma indistinta, ou seja, tanto os que foram declarados como os que não foram. Isso acontece porque não existe ferramenta no sistema para que a alocação do pagamento se dê apenas para os débitos não declarados. Se a intenção do devedor era liquidar apenas os débitos não declarados, isto não foi possível, tendo sido pagos também os já declarados em GFIP relativos às competências de 09/2001 a 01/2002 e parte de 02/2002. (...)“. 8- O recebimento da denúncia reclama a análise em cotejo das regras previstas no art. 41 e 395, ambos do Código de Processo Penal. Ou seja, deve ser recebida a exordial que, preenchendo os requisitos do art. 41, não esbarre em qualquer dos óbices previstos nos incisos do art. 395, com redação dada pela Lei n.º 11.719/08. 9- Preenchendo a denúncia os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal e, não observada nos autos nenhuma das hipóteses de rejeição previstas no art. 395 do mesmo diploma legal, deve o magistrado indagar, ainda, se, de fato, no caso, há indícios de materialidade e autoria delitivas. 10- Suficientes os indícios de materialidade do crime tipificado no art. 337-A do CP, mormente em face da confissão do débito pelo denunciado AFCG, a ponto de ter diligenciado a apuração do valor devido e diligenciado o seu pagamento (ainda que tal pagamento não tenha sido considerado suficiente pelo credor). 11- Todavia, não se vislumbra a mínima vinculação entre a suposta prática do crime de sonegação de contribuição previdenciária e qualquer sorte de conduta dolosa por parte do denunciado. 12- Não se sabe se, após o recolhimento feito pelo denunciado AFCG, ainda persiste saldo a pagar relativamente ao período em aquele exerceu o cargo de Presidente da COFECO (de 07/09/2001 a 06/09/2003) especificamente no que toca aos empregados Josimar C. Costa, Raimundo Bezerra Santiago e Neuma Lúcia Batista. 13- O órgão fazendário, em mais de uma oportunidade, demonstrou impossibilidade de cálculo do montante devido pelo denunciado nos moldes em que fixados na peça acusatória por limitações no sistema operacional daquela entidade. 14- Havendo dúvida acerca da materialidade delitiva - in casu, o saldo do tributo ainda devido (ou não) -, não se pode inferir contra o réu, presumindo que ainda persista o débito. Até porque, segundo a jurisprudência dos tribunais superiores, acaso o montante sonegado seja inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), forçosa a aplicação do princípio da bagatela para efeitos penais. Precedentes do STF. 15- Elementos probatórios que se revelam insuficientes para fundamentar o recebimento da inicial acusatória, persistindo dúvida razoável quanto à própria tipicidade do delito. Denúncia rejeitada.
Relator : Desembargador Federal José Maria De Oliveira Lucena
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