INQ – 3527/AL – 0000057-30.2016.4.05.8003

RELATOR: DESEMBARGADOR VLADIMIR SOUZA CARVALHO -  

Penal e Processual Penal. Denúncia oferecida em desfavor de Geraldo Novais Agra Filho e José Ronaldo Araújo de Siqueira, imputando-lhes a prática dos crimes de desvio de recursos públicos federais e de omissão no dever de prestar contas destes recursos (artigo 1º, inciso I e VII, do Decreto-Lei 201/67). Preliminares rechaçadas. De logo, registra-se ser assunto ultrapassado que o Decreto-Lei 201/67 não fora recepcionado pela Constituição Federal, até porque se trata de diploma normativo que vem sendo aplicado diuturnamente e conduzindo a um semnúmero de condenações. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal já afastou qualquer vício de inconstitucionalidade (RHC-107675/DF, min. Luiz Fux, julgado em 27 de setembro de 2011). Vale relembrar, outrossim, o enunciado da Súmula 496, do Supremo Tribunal Federal, a rezar que são válidos, porque salvaguardados pelas Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1967, os decretos-leis expedidos entre 24 de janeiro e 15 de março de 1967. Outra tese superada é de que este regramento legal somente se aplica à própria pessoa do Prefeito, visto ser pacífico que terceiros envolvidos podem ser responsabilizados, na condição de coautores ou partícipes. Precedente: (...) embora a autoria dos crimes previstos no Decreto-Lei nº 201/67 seja do Prefeito, pois ele, na qualidade de Chefe do Executivo, detém a decisão final no sentido de empenhar ou não a despesa para efetuar o pagamento, devem ser responsabilizados os que concorreram de alguma forma para a prática de ação delitiva, sendo admissível a coautoria e a participação dos não exercentes da chefia do Poder Executivo, que podem ser processados e julgados de acordo com o Decreto-lei nº 201/67 (ACR 11772, des. Cid Marconi, julgada em 30 de junho de 2016). Ainda à guisa de preliminar, deve ser descartada a inépcia da denúncia, pois a peça vestibular se encontra muito bem escrita e fundamentada, discorrendo suficientemente sobre as responsabilidades atribuídas a cada um dos denunciados, e, desse modo, possibilitando-lhes o legítimo exercício do direito de defesa. Superadas as preliminares, passa-se ao mérito. Quanto ao crime previsto no artigo 1º, inciso I, do Decreto-Lei 201, é fácil divisar a presença de indícios bastantes de autoria e materialidade, tudo corroborando a verossimilhança da tese da acusação, de que, no ano de 2012, o denunciado Geraldo Novais Agra Filho, então Prefeito do Município de Carneiros, juntamente com o segundo denunciado, José Ronaldo de Araújo de Siqueira, este na condição de Secretário de Educação, deram causa ao desvio da quantia de quarenta mil reais, recebida através de convênio celebrado com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, mediante a inexecução de obras de acessibilidade a estudantes com necessidades especiais. Deveras, a inadimplência contratual começou a ser descortinada através de inspeção in loco nas instituições de ensino em que as obras deveriam ter sido construídas, as escolas Genivaldo Novais Agra, Rui Barbosa, Ver. Abdon Francisco de Lima e Djalma Novais Agra, que, na data de 30 de agosto de 2012, receberam, cada uma, o montante de dez mil reais. Nessa vereda, há nos autos, por exemplo (f. 28-36), fotografias demonstrando, em tese, que não foram construídas as rampas de acesso e instalados os corrimãos previstos na avença. Quanto ao argumento da defesa, reforçado, inclusive, em sustentação oral, na tribuna deste Plenário, de que o denunciado Geraldo Novais Agra Filho não dispunha dos valores em mãos, cumpre registrar que, na condição de Prefeito, era o principal responsável pela correta execução dos convênios celebrados pelo Município de Carneiros. Por outro lado, pelo menos para efeito de um juízo de admissibilidade, conclui-se que esta tese defensiva foi desmentida, inclusive, através de declarações prestadas pelos diretores das escolas. Nesse sentido, há início de prova testemunhal, colhida perante a autoridade policial, aduzindo que os valores esquadrinhados eram geridos pelo denunciado José Ronaldo de Araújo Siqueira, na condição de Secretário Municipal de Saúde, diretamente subordinado, portanto, ao Prefeito Geraldo Novais Agra Filho. De outra banda, assiste razão, em parte, ao Ministério Público Federal, ao consignar que a incursão nos tipos previstos no Decreto-Lei 201 é possível mesmo depois do término do mandato em que os atos investigados foram praticados. A esse respeito, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 164, cujo enunciado dispõe que o prefeito municipal, após a extinção do mandato, continua sujeito a processo por crime previsto no art. 1º do Decreto-Lei 201, de 27.02.67. Todavia, este verbete, em alguns casos, não é válido quando a imputação recai sobre o delito de omissão no dever de prestar contas, previsto no artigo 1º, inciso VII, desta norma, se o prazo fatal para o exercício deste múnus vence depois do término do mandato. Decerto, não raras vezes o Prefeito é sucedido por um inimigo político, ficando de mãos atadas quando seu sucessor, por qualquer motivo, deixa de cumprir com a obrigação de prestar contas da gestão passada. Consequentemente, é forçoso concluir que o dever de prestar contas deve ser imputada à pessoa que estiver à frente da Chefia do Executivo na data do vencimento deste prazo. Paradigmas: ACR 9482, des. Manoel Erhardt, julgado em 20 de fevereiro de 2014; INQ 2469, des. Edílson Nobre, julgado em 24 de outubro de 2012. É o que ocorre no presente caso, visto que o dever de prestar contas da correta utilização dos recursos advindos do Convênio em foco ficou para o dia 30 de abril de 2013, data em que os denunciados não ocupavam mais os cargos de Prefeito e Secretário de Educação do Município de Carneiros. Em resumo, cotejadas as acusações contidas na peça vestibular com os elementos carreados aos autos, conclui-se não existir justa causa para a deflagração da ação penal calcada na consumação do crime previsto no artigo 1º, inciso VII, do Decreto-Lei 201. Denúncia parcialmente recebida, determinando-se a instauração da ação penal visando a apurar, apenas, a prática do ilícito abrigado no artigo 1º, inciso I, do Decreto-Lei 201.

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