RSE – 2189/CE – 0003044-26.2015.4.05.0000

RELATOR : DESEMBARGADOR EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR -  

Penal. Recurso em sentido estrito. Medidas cautelares diversas da prisão Preventiva. Suspensão de atividade econômica junto ao poder público. Associação Criminosa. Fraudes em licitações. Ausência, em sede de cognição sumária, de indícios De autoria. Excesso de prazo configurado. Medidas cautelares que já perduram há Mais de dois anos. Provimento. 1. O presente recurso em sentido estrito foi interposto nos autos do Pedido de Prisão Preventiva n. 0001081- 92.2013.4.05.8102, contra decisão do Juízo da 16ª Vara Federal do Ceará que, a despeito de não ter verificado, naquela ocasião, a necessidade de privação da liberdade da ora recorrente, decretou medidas cautelares diversas da requerida pelo órgão ministerial. 2. O pedido de prisão preventiva do órgão ministerial baseia-se na presença do "fumus commissi delicti", pois, segundo ele, o suposto envolvimento da recorrente com representantes de outras pessoas jurídicas participantes de procedimentos licitatórios em municípios cearenses, aliado a diversas irregularidades apontadas em fiscalização promovida pela Controladoria Geral da União, seria indicativo de que a investigada, caso permaneça em liberdade, continuará praticando delitos em detrimento da competitividade das licitações em que vierem a participar a empresa por ela administrada e as demais pessoas jurídicas envolvidas nas investigações da operação "PA DUB DAR". 3. As suspeitas do Ministério Público Federal lastreiam-se, basicamente, nas seguintes afirmações: a) a recorrente é companheira de sócio de outra empresa investigada, em cujo nome a Controladoria Geral da União teria apurado a existência de irregularidades em cinco procedimentos licitatórios no qual essa pessoa jurídica participou; b) a empresa administrada pela recorrente apresentou os mesmos valores que outras seis empresas participantes em licitação instaurada pelo Município de Barbalha/CE, tendo apresentado, no segundo procedimento licitatório, realizado em razão da anulação do primeiro, proposta de preço de valor global igual ao do orçamento fornecido pelo FNDE, o que, segundo o órgão ministerial, seria evidência de que a empresa objetivava ser desclassificada do certame; c) foram encontrados em notebook apreendido na residência da recorrente documentos referentes à sua empresa e à empresa administrada pelo seu companheiro, de participação em licitações; d) três empresas envolvidas no suposto esquema criminoso possuem o mesmo número de telefone; e e) duas empresas possuem mesmo contador e mesmas testemunhas que assinam seus contratos sociais, os quais apresentam formato e texto quase idênticos. 4. De início, chama atenção o fato de que o decisório recorrido foi proferido em 4 de setembro de 2013 (fls. 41/56), só tendo havido a intimação da recorrente em 2 de setembro de 2015 (fl. 40), quase dois anos depois de terem sido decretadas as medidas cautelares ora impugnadas, cuja eficácia, pelo que se vislumbra, estão em vigor há mais de dois anos. 5. Em se tratando, no caso concreto, de pedido de prisão preventiva, conquanto o § 2º do art. 282 do Código de Processo Penal, com redação incluída pela Lei 12.403/2011, permita o magistrado decretar de ofício medidas cautelares diversas do aprisionamento do investigado, o § 6º do mesmo artigo atribui um caráter substitutivo a essas medidas, de modo que a aplicação delas exige a presença dos mesmos requisitos previstos para a prisão cautelar (indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria), a exemplo do que dispõe o art. 282, I, c/c o art. 312, todos do citado diploma legal. 6. Conquanto a Controladoria Geral da União tenha apontado a existência de irregularidades em cinco licitações nas quais consta como licitante a pessoa jurídica administrada por suposto companheiro da recorrente (fl. 32), não se vislumbra qualquer indício de sua autoria, isto é, de que a mencionada investigada tenha contribuído para tais irregularidades. Ressalte-se que uma suposta relação de afinidade entre a recorrente e o sócio de outra empresa envolvida nas investigações não serve como indício de prática delitiva. 7. No tocante aos indícios de fraudes referentes à existência de semelhanças gráficas entre as propostas apresentadas pelas empresas apontadas como envolvidas no suposto esquema criminoso, observa-se, na verdade, que tais licitantes utilizaram o mesmo modelo de planilha orçamentária no disponível no sítio eletrônico do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará (fl. 14). 8. Não se extrai dos fatos apresentados até agora nas investigações, nem com muito esforço imaginativo, a presença de indícios suficientes de autoria, ou seja, de que a recorrente seria integrante de uma organização criminosa formada por administradores de outras pequenas empresas que estariam cometendo diversas fraudes em licitações nos municípios do interior do Ceará, razão pela qual não se vislumbra, igualmente, o preenchimento dos requisitos necessários para a aplicação antecipada de medidas restritivas de direitos em desfavor daquela investigada. 9. Além disso, na aplicação das medidas cautelares devem ser levados em consideração os princípios constitucionais da razoável duração do processo e da presunção de não culpabilidade, motivo pelo qual, no caso, a proibição do exercício de atividade econômica por período superior a dois anos ano configura excesso de prazo, mormente em se tratando de empresa de pequeno porte que, pelo que se observa nos autos, presta com mais frequência os seus serviços para a Administração Pública do que para particulares, de modo que o impedimento do exercício de suas atividades econômicas durante todo esse período vem, certamente, acarretando-lhe prejuízos. 10. De mais a mais, sabe-se que a fiscalização das licitações envolvendo a aplicação de verbas federais repassadas aos municípios mediante convênios celebrados com as autarquias ou órgãos da União é exercida não só pela entidade concedente, como também pelo Tribunal de Contas da União, o qual, na hipótese de haver indícios suficientes de fraudes em procedimentos licitatórios, possui competência para "determinar suspensão cautelar (artigos 4º e 113, § 1º e 2º da Lei nº 8.666/93), examinar editais de licitação publicados e, nos termos do art. 276 do seu Regimento Interno, possui legitimidade para a expedição de medidas cautelares para prevenir lesão ao erário e garantir a efetividade de suas decisões" (STF, MS 24510, rel. Min. ELLEN GRACIE, Pleno, julgado em 19/11/2003, DJ 19/03/2004, p. 18), sendo injustificável, portanto, o açodamento da decisão recorrida. 11. Recurso em sentido estrito provido, cassando-se os efeitos da decisão recorrida. 

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