Conflito de competência. Juizado especial. Extinção da pena restritiva de direitos. Pena de multa remanescente. Declaração de extinção do processo de execução penal. Remessa de certidão à procuradoria-geral do Estado para a execução da pena de multa. Agravo em execução. Competência recursal da justiça comum.
Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima
RELATÓRIO – MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA: Trata-se de conflito negativo de competência instaurado entre a Turma Recursal Criminal do Rio Grande do Sul, ora suscitante, e a Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ora suscitado, com fulcro no art. 105, inciso I, alínea d, da Constituição Federal. O presente conflito versa sobre a competência para processar e julgar agravo em execução interposto pelo Ministério Público estadual contra a decisão do Juízo de Direito da Vara de Execuções Penais de Porto Alegre que determinou a extração de certidão de débito da multa para remessa à Procuradoria-Geral do Estado e declarou extinto o processo de execução penal, tendo em vista o cumprimento integral da pena restritiva de direitos substituta da pena privativa de liberdade. Ressalta-se que o acusado MÁRCIO LUIZ PINHO DE OLIVEIRA foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 16 da Lei 6.368/76 e condenado à pena privativa de liberdade de 3 (três) meses de detenção e multa, sendo aquela substituída por pena restritiva de direitos. As razões do suscitante encontram-se às fls. 62/65, em que alega que a pena de multa cumulada com pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos será executada fora do Juizado, segundo as regras de competência da Lei de Execução Penal e as leis de organização judiciária. As razões do suscitado constam das fls. 49/52, em que sustenta a competência da Turma Recursal, tendo em vista que o recurso envolve a execução da pena de crime de menor potencial ofensivo, o que seria matéria atinente aos juizados especiais criminais. O Ministério Público Federal, por meio do parecer exarado pelo Subprocurador-Geral da República EDINALDO DE HOLANDA BORGES, entendendo que a competência dos juizados para a execução penal somente incide quando a pena de multa for aplicada isoladamente, opinou pelo conhecimento do conflito para que seja declarada a competência do Juízo suscitado (fls. 71/73). É o relatório.
VOTO – MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA (Relator): O acusado foi denunciado e condenado pela prática do crime previsto no art. 16 da Lei 6.368/76, oportunidade em que o conceito de menor potencial ofensivo abrangia apenas os crimes cuja pena privativa de liberdade máxima cominada não fosse superior a 1 (um) ano, restando regular o processamento pelo Juízo comum. Não obstante o conceito de menor potencial ofensivo tenha sido ampliado, em relação à competência, vige a regra contida no art. 25 da Lei 10.259/01, nos termos seguintes: Não serão remetidas aos Juizados Especiais as demandas ajuizadas até a data de sua instalação. Assim, as ações ajuizadas até o advento da Lei 10.259/2001 devem permanecer sob a jurisdição dos juízos originários. Dessa forma, a superveniente alteração do conceito de menor potencial ofensivo não implica deslocamento da competência recursal. Além disso, “as disposições concernentes a jurisdição e competência se aplicam de imediato, mas, se já houver sentença relativa ao mérito, a causa prossegue na jurisdição em que ela foi prolatada, salvo se suprimido o Tribunal que deverá julgar o recurso“ (CARLOS MAXIMILIANO). Nesse sentido, ainda, seguem julgados da Corte Suprema: EMENTA: 1. Apelação criminal: competência. A competência para o julgamento da apelação interposta de sentença condenatória proferida pela Justiça comum em processo que seguiu o rito ordinário é do Tribunal de Justiça e não da Turma Recursal dos Juizados Especiais. Precedentes. 2. Extinção da punibilidade - inviabilidade do exame da questão no habeas corpus, dada a falta de demonstração de que a matéria fora suscitada quando da sustentação oral no julgamento da apelação. (HC 88.286/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, DJ 9/6/2006, p. 19) EMENTA: HABEAS CORPUS. DESACATO. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. SENTENÇA PROFERIDA POR JUIZ DE DIREITO DA JUSTIÇA COMUM. RECURSO PARA O TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A competência para julgar recurso de apelação interposto contra sentença proferida por Juiz de Direito da Justiça Comum é do Tribunal de Justiça, não da Turma Recursal. “As disposições concernentes a jurisdição e competência se aplicam de imediato, mas, se já houver sentença relativa ao mérito, a causa prossegue na jurisdição em que ela foi prolatada, salvo se suprimido o Tribunal que deverá julgar o recurso“ (Carlos Maximiliano). Ordem parcialmente deferida. (HC 85.652/PR, Rel. Min. EROS GRAU, Primeira Turma, DJ 1º/7/2005, p. 56) Sob esse aspecto, portanto, incumbe ao órgão de 2º grau da Justiça comum o processamento do recurso interposto. Noutro ponto, tem-se que “as penas privativas de liberdade, restritivas de direitos e multa cumulada com estas não se encontram no âmbito do Juizado Especial Criminal, mas do órgão encarregado da execução nos termos da legislação local“ (Júlio Fabbrini Mirabete). Com efeito, a regra especial prescrita no art. 86 da Lei 9.099/95 determina que “a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direitos, ou de multa cumulada com estas, será processada perante o órgão competente, nos termos da lei“. Ressalta-se, outrossim, que os fatores que envolvem a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direitos não se coadunam com a informalidade e celeridade que orientam os trabalhos nos juizados especiais. Sobre a matéria, segue a jurisprudência deste Superior Tribunal: PROCESSUAL PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AGRAVO EM EXECUÇÃO. TURMA RECURSAL E TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE APLICADA EM CONJUNTO COM A PENA DE MULTA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 60 E 86 DA LEI Nº 9.099/95. É entendimento doutrinário que “as penas privativas de liberdade, restritivas de direitos e multa cumulada com estas não se encontram no âmbito do Juizado Especial Criminal, mas do órgão encarregado da execução nos termos da legislação local“. (Júlio F. Mirabete) Tendo sido imposta cumulativamente a pena de detenção com a de multa, restando somente a execução desta, a competência para o julgamento de agravo em execução é do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, o suscitado. (CC 47.894/RS, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, Terceira Seção, DJ 8/6/05, p. 147) No caso, a decisão impugnada foi proferida na fase de execução penal tendo em vista uma condenação à pena privativa de liberdade, substituída por restritiva de direitos, cumulada com multa. Resta fixada, portanto, por ambas as razões, a competência recursal da Justiça comum. Diante do exposto, conheço do conflito para declarar competente a Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ora suscitado. É como voto.
EMENTA – PROCESSO PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME JULGADO PELA JUSTIÇA COMUM. EXECUÇÃO PENAL. EXTINÇÃO DA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. PENA DE MULTA REMANESCENTE. DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO PENAL. REMESSA DE CERTIDÃO À PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO PARA A EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA. AGRAVO EM EXECUÇÃO. COMPETÊNCIA RECURSAL DA JUSTIÇA COMUM. 1. A superveniente alteração do conceito de menor potencial ofensivo não implica deslocamento da competência recursal. Precedentes do STF. 2. “As penas privativas de liberdade, restritivas de direitos e multa cumulada com estas não se encontram no âmbito do Juizado Especial Criminal, mas do órgão encarregado da execução nos termos da legislação local“ (Júlio Fabbrini Mirabete). 3. Conflito conhecido para declarar a competência da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ora suscitado.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator, a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura e os Srs. Ministros Nilson Naves, Felix Fischer, Paulo Gallotti e Laurita Vaz. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Paulo Medina. Brasília (DF), 11 de outubro de 2006 (Data do Julgamento)