Nulidades. Inocorrência. Irregularidade na individualização da pena. Verificação. Ordem Parcialmente concedida.
Rel. Min. Hamilton Carvalhido
RELATÓRIO - EXMO. SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator): Habeas corpus contra a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que, provendo o apelo do Ministério Público, condenou os pacientes Andrés Ricardo Mainzer, à pena de 3 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto; Ralph Bark Bigio, à pena de 4 anos, 1 mês e 15 dias de reclusão, em regime inicial semi-aberto; e Toufik Kattan, à pena de 4 anos, 1 mês e 15 dias de reclusão, em regime inicial semi-aberto, e, majorou as penas impostas a Ralph Levy Garboua, de 2 anos e 4 meses de reclusão em regime aberto, para 4 anos, 1 mês e 15 dias de reclusão, a partir do regime semi-aberto, e a de Sony Alberto Douer, de 2 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto, para 4 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial semi-aberto, pela prática do delito tipificado no artigo 17 da Lei nº 7.492/96, combinado com o artigo 71 do Código Penal. Em primeira instância, os réus Claudio Forshaid, Toufik Kattan, Ralph Bark, Luiz Carlos do Amaral e Andrés Ricardo Mainzer foram absolvidos, enquanto Sony Alberto Douer e Ralph Levy Garboua foram condenados às penas de 2 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto. As condenações de Claudio Forshaid e Luiz Carlos do Amaral transitaram em julgado. Tem-se dos autos, que os pacientes, na condição de Presidente - Sony Alberto Douer - e Diretores Executivos, os demais, do Banco Operador S/A, no período compreendido entre outubro de 1992 e janeiro de 1993, efetuaram vários adiantamentos, de vultosas quantias em dinheiro, a empresas coligadas, mediante débitos na conta Valores a Receber de Sociedades Ligadas e/ou Adiantamentos a Depositantes, destinados à cobertura de saldos devedores em conta-corrente, caracterizando pois, tais empréstimos, operações de crédito vedadas pelo artigo 17 da Lei nº 7.492/96, em continuidade delitiva. Daí a presente impetração que se funda nas seguintes nulidades: a) ausência de intimação dos pacientes Andrés Ricardo Mainzer, Ralph Bark Bigio e Toufik Kattan para constituição de novo defensor, tendo em vista que o defensor constituído não apresentou contra-razões ao recurso de apelação do Ministério Público, tendo sido nomeado, automaticamente, defensor ad hoc. Por isso, afirmam que “a falta de intimação do acusado para constituir novo defensor é causa de nulidade absoluta, por ofender o princípio da ampla defesa, que garante ao réu o direito de ser defendido por advogado de sua confiança. “ (fl. 6); b) apresentação das razões de apelação dos pacientes Sony Alberto Douer e Ralph Levy Garboa por profissional desprovido de procuração ou de nomeação judicial, e, ainda, durante a fluência do prazo para a constituição de novo defensor, violando, dessa forma, os princípios do devido processo legal e da ampla defesa; c) deficiência de defesa técnica, na apresentação do recurso de apelação dos pacientes Sony e Ralph Levy e Ralph Levy Garboa, eis que “as razões de apelação são, em verdade, mera reprodução das contra-razões apresentadas em primeiro grau, com mínimas alterações. Vem, então, o mais grave: As razões de apelação ignoram, sumariamente, o fato pelo qual os Pacientes foram condenados .“ (fl. 13). Sustentam que “Não se pode admitir como válido um recurso que não faça nenhuma menção aos fatos da sentença condenatória, traduzindo, mais do que mera deficiência, verdadeira ausência absoluta de defesa. “ (fl. 13); d) ofensa ao princípio da igualdade processual pela produção de prova nova no parecer ministerial, eis que “(...) apresentou informação do Banco Central do Brasil sobre julgamento de recurso administrativo desfavorável aos Pacientes, penalizando as operações do Banco Operador S.A.(Doc. 1. fls. 589/590) .“ (fl. 17). Aduzem que “Não é preciso qualquer análise de prova para constatar que tal documento era novo nos autos, bastando observar que referido documento administrativo ocorreu em 2002, e a instrução probatória encerrou-se em 1999“ (fl. 17) E, ainda, que “Um parecer que se presta a produzir a prova faltante solicitada pela parte acusatória extrapola os limites de sua atuação de 'custos legis', ferindo a igualdade processual e tornando-se viciado e nulo.“ (fl. 20); e) ausência de abertura de vista dos autos à defesa, em razão da juntada do documento novo pelo Parquet , sendo certo que “(...) A Autoridade Coatora não intimou a defesa para que tomasse ciência da prova nova, vedando a possibilidade de manifestação defensiva, em grave ofensa ao princípio do contraditório. “ (fl. 21); f) julgamento fora dos limites da apelação do Ministério Público, eis que a sentença condenou os pacientes Sony e Ralph Levy pela prática do delito “detalhado no item 8 da denúncia “, sendo certo, contudo, que “ao oferecer sua razões de apelação, o Ministério Público fixou precisamente os limites de seu apelo, atacando apenas a decisão absolutória relativa ao itens 4 e 6 da denúncia. Desenvolveu suas razões sobre o expresso título 'da descaracterização delitiva das condutas descritas nos itens 4 a 6 da denúncia “ portanto “O Ministério Público aceitou a decisão absolutória que concluiu pela atipicidade dos fatos narrados no item 9 da denúncia “ Ocorre, contudo, que “(...) ao julgar o item 9 da denúncia, a sentença de primeiro grau considerou o atraso no repasse das cobranças eras apenas 'um ilícito civil'“ sendo certo, de seu lado, que o acórdão impugnado “extrapolou ilegalmente os limites do apelo ministerial e condenou os pacientes pelos fatos descritos no item 9 da denúncia “ do que resultou o “julgamento ultra petitum “ (fls. 25/26). g) nulidade na fixação das penas-base dos pacientes “acima do mínimo legal sem proceder a necessária fundamentação, desrespeitando o Art. 59 do Código Penal e o princípio constitucional da individualização da pena“ (fl. 29) e, ainda, por não emitir nenhum juízo de valor sobre a posição societária dos pacientes Afirmam que o Magistrado “(...) após citar a posição societária dos Pacientes , a Autoridade Coatora não emitiu nenhum juízo de valor sobre tal circunstância, sendo impossível saber qual conclusão foi extraída de tais apontamentos. Não se sabe sequer em qual circunstância judicial repercutiu o cargo ocupado pelos Pacientes .“ (fl. 32). h) inexistência de análise das demais circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal, eis que “na hipótese de concurso de agentes, a análise das circunstâncias judiciais do art. 59, do CP não pode ser coletiva, mas individualizada para cada co-réu“ (fl. 36). i) ausência de aplicação da circunstância atenuante inserta no artigo 65, inciso III, alínea “b“, do Código Penal (reparação do dano), não obstante tenha sido atestada sua existência pelo próprio acórdão impugnado. Aduzem, de resto, que os pacientes são primários, portadores de bons antecedentes e “(...) sempre permaneceram em liberdade, comparecendo a todos os atos processuais, salientando-se que o Ministério Público jamais sequer solicitou a prisão preventiva dos mesmos.“ (fl. 42). Pugnam, ao final, pelo reconhecimento das nulidades argüidas. Liminar indeferida (fls. 720/721). Informações dispensadas, por adequadamente instruída a inicial. O Ministério Público Federal veio pelo não-conhecimento, em razão das nulidades apontadas não terem sido analisadas pela Corte de Justiça Estadual, e pela denegação da ordem (fls. 724/732). O Excelso Supremo Tribunal Federal deferiu medida cautelar para suspender a execução das penas dos pacientes, até julgamento final deste habeas corpus. (fl. 735). É o relatório.
VOTO - EXMO. SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator): Senhor Presidente, de início, relativamente à alegada supressão de instância, que impediria o conhecimento do writ, invocada pelo Ministério Público Federal no parecer de fls. 724/732 dos autos, não merece prosperar. O conhecimento do habeas corpus nos diversos graus de jurisdição independe de prequestionamento na decisão impugnada, bastando que a coação seja imputável ao órgão de gradação jurisdicional inferior, o que ocorre quando este haja examinado e repelido a ilegalidade apontada, bem como quando se omite em decidir as alegações do impetrante ou matéria sobre a qual, no âmbito de conhecimento da causa a ele devolvida, deveria se pronunciar de ofício (cf. RHC nº 82.045/SP, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, in DJ 25/10/2002). In casu, todas as questões propostas no presente habeas corpus foram, por certo, devolvidas ao Tribunal Regional Federal pelas apelações interpostas pelas partes, de amplo efeito devolutivo, incluidamente, por óbvio, as de pronunciamento de ofício. A propósito, os seguintes precedentes: “Habeas Corpus : competência do STF: coação de Tribunal, caracterização. O cabimento do habeas corpus contra decisão judicial não se subordina ao requisito do prequestionamento: o essencial é que o juízo coator, tendo podido fazê-lo, no âmbito de sua jurisdição na causa, não haja feito cessar a coação alegada: por isso, julgando apelação do réu, interposta sem restrições, o Tribunal se fez responsável por eventuais ilegalidades da sentença, corrigíveis de ofício, ainda quando não versadas nas razões dos apelantes. 2. Individualização da pena: fundamentação suficiente: remissão a documentos comprobatórios de maus antecedentes.“ (HC 68.582/DF, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, in DJ 19/4/91). “PROCESSUAL PENAL. PENAL. HABEAS CORPUS . COMPETÊNCIA: APELAÇÃO: JULGAMENTO. POLICIAL. TESTEMUNHA: VALIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA: INOCORRÊNCIA. PROVA: EXAME: IMPOSSIBILIDADE. I. - Julgando o Tribunal a apelação, dando-lhe ou negando-lhe provimento, nos casos em que o efeito devolutivo é pleno, torna-se ele coator, para futuros pedidos de habeas corpus, mesmo se as questões postas neste não foram ventiladas na apelação. Somente nas hipóteses em que a apelação não tem efeito devolutivo pleno, como, por exemplo, no caso de apelação interposta de decisão do Tribunal do Júri, é que essa regra não teria aplicação. II. - O simples fato de ser policial não torna suspeito ou inválido o seu testemunho. Precedentes do STF. III. - Inocorrência de cerceamento de defesa. IV. - A negativa de autoria e a alegação de que inexiste nos autos prova de sua participação no delito implicam o exame de todo o conjunto probatório, o que é inviável em sede de habeas corpus . V. - HC indeferido.“ (HC 76.381/SP, Relator Ministro Carlos Velloso, in DJ 14/8/98 - nossos os grifos). Conheço, pois, do pedido de habeas corpus, e o concedo, em parte. É que, primeiro, em suma, após a sentença condenatória e a realização de várias diligências intimatórias, os advogados constituídos dos réus, peticionaram, nos autos, aduzindo que se encontravam “aguardando regularização dos presentes autos para, intimação regular, apresentar contra-razões de apelação “ (fl.547), e interpuseram na mesma data, 21 de outubro de 2002, recurso de apelação contra a sentença, na parte em que condenou Sony Alberto Douer e Ralph Levy Garboua, com protesto de ofertamento de suas razões no 2º Grau da Jurisdição. Não há, assim, falar em dever e, conseqüentemente, em falta de intimação dos réus para a constituição de novo defensor, pois que advogados constituídos continuaram a representá-los nos autos do processo da ação penal, a que respondiam, protestando, como protestaram, sob a incidência do princípio da eventualidade, pelo oferecimento oportuno de contra-razões de apelação no 1º grau da jurisdição e requerendo, como requereram, oferecimento de razões de apelação no 2º grau. Em casos tais, incabe a pretendida intimação dos réus para constituição de novo advogado, não se podendo, de resto, ir além no presente julgamento, à falta de alegação e instrução do pedido a tanto bastantes. Por igual, não há falar em falta de nomeação judicial e de procuração ao advogado que ofertou as razões de apelação dos co-réus condenados Sony Alberto Douer e Ralph Levy Garboua, pois que o fez como defensor dativo nomeado ainda no 1º grau da jurisdição, ao se desincumbir de novo ônus, já agora no 2º Grau da Jurisdição, ratificando, a mais, as contra-razões antes ofertadas. Passo adiante, defesa deficiente não se confunde com falta de defesa, somente anulando o feito, se demostrado o efetivo prejuízo resultante ao réu, por conseqüência de sua natureza relativa. Veja-se, a propósito, o Enunciado nº 523 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.“ In casu, os impetrantes não trouxeram, nem mesmo de forma genérica, o plus que demonstradamente poderia conduzir a resultado diverso o julgamento das apelações, ficando insulados em que seriam análogas as razões e contra-razões de apelação, que, além, se ressentiriam dos fatos da sentença. Tais reclamos perdem força, também, diante da própria letra das contra-razões e razões de apelação em causa, substancialmente bastantes, a nosso ver, até porque têm por objeto os mesmos fatos-crimes, verbis : “(...) CONTRA RAZÕES DE RECURSO DE APELAÇÃO A R. Sentença proferida às fls. , deverá 'data venia', de ser mantida, pois que devidamente fundamentada na mais correta aplicação do Direito e da Justiça. Inconsistentes os argumentos apresentados pelo RECORRENTE, que não se conforma com o fato de o M. Juízo ter absolvido os APELADOS TOUFIK KATTAN, RALPH BARK BIGIO E ANDRÉS RICARDO MAIZER , e condenado os APELADOS SONY ALBERTO DOUER e RALPH LEVY GARBOUA , acusados do cometimento do crime previsto no artigo 17 da Lei nº 7.492/86. Os APELADOS como dirigentes de instituições financeiras realizavam operações chamadas de 'empréstimos' por um curto período a empresas coligadas, não chegando a desestabilizar o sistema financeiro, mesmo porque eram quantias pequenas. Essas operações ocorreram cerca de quatro meses e não mais que isso, não havendo outros registros após a advertência recebido o Banco Central. Houve, sem duvida registros irregulares das operações e não o empréstimo vedado por lei. O BANCO OPERADOR dos quais eram os APELADOS dirigentes fazia um adiantamento a OPERCRED PROMOTORA DE VENDAS S/C LTDA., que tinha por objetivo faze financiamentos, elaborar cadastros, analisar créditos e efetuar a cobrança, repassando os valores recebidos ao BANCO OPERADOR S.A. Todavia, o OPERCRED não cumpriu com a obrigação do repasse dos valores recebidos ao Banco, gerando então o prejuízo arcado por este e advertido pelo Banco Central. Assim para melhor esclarecimento dos fatos delituosos apreciados e conseqüente penalização, convém, que se faça o detalhamento da atuação de cada um dos APELADOS , e a R. Sentença proferida. SONY ALBERTO DOUER E RALPH LEVY GARBOUA O APELADO SONY ALBERTO era Diretor Presidente e o APELADO RALPH era apenas Diretor, ambos do BANCO OPERADOR S/A tendo assinado como tal o 5º Aditivo do Instrumento Particular de Aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente nº 204-94, formalizado com a OPERCRED PROMOTORA DE VENDAS S/C LTDA. Aos APELADOS SONY E RALPH foi imputada a pena definitiva de 2 (dois) anos, 4 (quatro) meses e 11 (onze) dias multa, arbitrado em 15 (quinze) salários mínimos cada dia multa, sendo porem, substituída por pena alternativa consistente na entrega de Cestas Básicas a instituição carente. Assim procedeu o M. Juízo a quo, tendo em vista serem os mesmos primários, de bons antecedentes e ainda por se tratar de um único episódio em suas vidas, agindo de forma correta e aplicando devidamente o direito. TOUFIK KATTAN - RALPH BIGIO e ANDRES RICARDO MAIZER O APELADO TOUFIK assim como os demais não tiveram qualquer envolvimento no referido empréstimo ou aditamento a OPERCRED , como pretende o ´Parket´ Federal, posto que atuavam em áreas distintas sem qualquer relacionamento com a área comercial do Banco Operador S/A. Assim sendo, não há que se falar em modificação da R. Sentença proferida que analisando os fatos narrados na R. Denuncia de fls. 2, com as provas carreadas aos autos, especialmente as documentais ABSOLVEU os ora APELADOS TOUFIK KATTAN, RALPH BARK BIGIO e ANDRES RICARDO MAIZER , e somente puniu os APELADOS SONY ALBERTO DOUER e RALPH LEVY GARBOUA . Alegar que houve a possibilidade de ano ao Sistema Financeiro Nacional não é suficiente para impor punições mais drásticas ou pesadas aos ora APELADOS . Possibilidade é eventualidade, é hipótese. Pode não ocorrer como foi o caso em questão, em que não ocorreu. Impõe-se, pois, a manutenção da R. Sentença proferida as fls. 465 e seguintes, que julgou IMPROCEDENTE EM PARTE a R. Denuncia de fls. 2. (...)“ (fls. 558/561). “(...) RAZÕES DO RECURSO DE APELAÇÃO A R. Sentença proferida ás fls., haverá, 'data venia', de ser reformada no que tange a condenação dos ara APELANTES , posto que injusta. Os APELANTES entendem inconsistentes os argumentos apresentados de modo a não se conformar com o fato de o M. Juízo tê-los condenado sob a acusação do cometimento do crime previsto no artigo 17 da Lei nº 7.492/86. Os APELANTES eram a época dirigentes de instituições financeiras realizavam operações chamadas de 'empréstimos' por um curto período a empresas coligadas, não chegando a desestabilizar o sistema financeiro, mesmo porque eram quantias pequenas. Essas operações ocorreram cerca de quatro meses e não mais que isso, não havendo outros registros após a advertência recebido o Banco Central. Houve, sem duvida registros irregulares das operações e não o empréstimo vedado por lei. O BANCO OPERADOR dos quais eram os APELADOS dirigentes fazia um adiantamento a OPERCRED PROMOTORA DE VENDAS S/C LTDA., que tinha por objetivo faze financiamentos, elaborar cadastros, analisar créditos e efetuar a cobrança, repassando os valores recebidos ao BANCO OPERADOR S.A. Todavia, o OPERCRED não cumpriu com a obrigação do repasse dos valores recebidos ao Banco, gerando então o prejuízo arcado por este e advertido pelo Banco Central. Assim para melhor esclarecimento dos fatos delituosos apreciados e conseqüente penalização, convém, que se faça o detalhamento da atuação de cada um dos APELADOS, e a R. Sentença proferida. SONY ALBERTO DOUER E RALPH LEVY GARBOUA O APELADO SONY ALBERTO era Diretor Presidente e o APELADO RALPH era apenas Diretor, ambos do BANCO OPERADOR S/A tendo assinado como tal o 5º Aditivo do Instrumento Particular de Aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente nº 204-94, formalizado com a OPERCRED PROMOTORA DE VENDAS S/C LTDA. Aos APELADOS SONY E RALPH foi imputada a pena definitiva de 2 (dois) anos, 4 (quatro) meses e 11 (onze) dias multa, arbitrado em 15 (quinze) salários mínimos cada dia multa, sendo porem, substituída por pena alternativa consistente na entrega de Cestas Básicas a instituição carente. Todavia, os APELANTES SONY E RALPH são réus primários e de bons antecedentes, não tendo agido com a intenção de fraudar a quem quer que seja, mesmo porque se tratava de operações entre empresas coligadas. As provas trazidas aos autos dão conta de que são insuficientes para penalizar os ora APELANTES , motivo pelo qual haverá de ser modificada a R. Sentença que os puniu. Alegar que houve a possibilidade de dano ao Sistema Financeiro Nacional não é suficiente para impor punições mais drásticas ou pesadas aos ora APELANTES. Possibilidade é eventualidade, é hipótese. Pode não ocorrer como foi o caso em questão, em que não ocorreu. Impõe-se, pois, a manutenção da R. Sentença proferida as fls. 465 e seguintes, para que as acusações que pesam sobre os APELANTES SONY E RALPH sejam julgadas IMPROCEDENTES e assim ABSOLVÊ-LOS . (...)“ (fls. 584/586). De outro lado, a prova nova, consistente no acórdão da 213ª Seção do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, relativa ao processo do BACEN nº 3253 (fl. 640), que tem por objeto parte dos fatos narrados na denúncia, não se constituiu em fundamento do acórdão que reformou a sentença, eis que a independência das instâncias administrativa e judicial foi claramente estabelecida e, até, confessada pela defesa (fl. 478), não havendo o documento alcançado qualquer influência no deslinde da causa. Não há, assim, nulidade qualquer, à falta de prejuízo, que, diga-se, não foi demonstrado e que, em verdade, sequer viu-se alegar. Da nulidade do decisum em razão do julgamento ultra petita, por igual, não há falar, reportando-se, como se reportou, o Ministério Público, as suas alegações finais, de modo a fazer certa a impugnação de todo o julgado de 1º Grau, verbis : “(...) Dessa forma, tendo em vista a possibilidade de dano a que os acusados expuseram o Sistema Financeiro Nacional e, assim, a coletividade, com sua conduta criminosa, em face das razões acima expostas e reportando-se às alegações finais de fls. 403-415, pugna o MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL pela procedência do presente recurso, reformando-se a sentença ora combatida, condenando-se o s ora apelados e exercerbando-se a pena já cominada . (...)“ (fl. 542 - nossos os grifos). Não é outra a certeza que resulta nas razões do apelo ministerial, verbis : “(...) II. Da sentença impugnada Não obstante as provas constantes dos autos, comprobatórias da materialidade e da autoria delitiva por parte de SONY ALBERTO DOUER, TOUFIK KATTAN, RALPH BARK BIFIO, RALPH LEVY GARBOUA e ANDRÉS RICARDO MAINZER , o d. Juízo a quo houve por bem absolver os acusados TOUFIK KATTAN, RALPH BARK BIGIO e ANDRÉS RICARDO MAINZER e condenar somente SONY ALBERTO DOUER e RALPH LEVY GARBOUA , e ainda assim à pena pecuniária consistente, para cada um, na entrega de 330 cestas básicas no valor de um salário mínimo cada, penas estas em muito desproporcionais à reprovabilidade social do delito. (...)“ (fl. 531). Isso estabelecido, tenho, todavia, que está a merecer concessão o presente writ no referente às penas impostas. É que, - embora diversamente do que entenderam os impetrantes, as circunstâncias judiciais tenham sido devidamente sopesadas-, o aumento relativo ao crime continuado, estabelecido na sua metade nas sanções impostas aos réus SONY ALBERTO DOUER, RALPH LEVY GARBOUA, RALPH BARKI BIGIO e TOUFIK KATTAN (fls. 697/699), não mereceu, na espécie, a devida motivação. Ao aumento da metade da pena não basta, a nosso ver, em espécies tais como a dos autos, consideradas, sobretudo, a natureza dos ilícitos penais, a forma das suas execuções e as condições dos agentes, referir simplesmente “ o grande número de infrações “, embora esse número seja o fator informativo do acréscimo de 1/6 a 2/3 de que cuida o artigo 71 do Código Penal. Penso que o aumento de 1/3, in casu, é o suficiente, tanto quanto tem cabida, em função dos fins de reprovação e prevenção do crime e à luz da própria motivação do acórdão, o deferimento do regime inicial aberto e a substituição das penas privativas de liberdade dos réus SONY ALBERTO DOUER, RALPH LEVY GARBOUA, RALPH BARKI BIGIO e TOUFIK KATTAN pelas restritivas de direitos de prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária, assim aplicadas a todos os acusados. Relativamente a ANDRÉS RICARDO MAINZER, o aumento em causa, à falta de motivação qualquer, deve ser reduzido ao mínimo legal, qual seja, 1/6. Gize-se, em remate, que a atribuição de função, na individualização da pena, da posição societária dos réus nada mais reclama do que a sua definição, sendo induvidosa a sua pertinência ao elenco do artigo 59 do Código Penal, não tendo o magistrado, lado outro, dever qualquer que não o de examinar as circunstâncias que efetivamente devem influenciar na fixação da resposta penal, tanto quanto nenhum óbice há que preceda apreciação subjetiva conjunta, relativamente a circunstância comum dos réus. Para certeza das coisas, confira-se a letra do acórdão, na parte da individualização das penas dos pacientes, verbis : “(...) Passa-se à fixação das sanções, uma vez demonstradas materialidade e autoria delitivas. A pena de Sony Alberto Douer deve ser majorada. Fixo a pena-base privativa de liberdade em 03 (três) anos de reclusão. Ausentes agravantes e atenuantes, bem como causas de diminuição. Acresço-a em 1/2 (metade), em razão da continuidade delitiva. Sanção final: 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Levei em consideração para fixar a pena-base acima do mínimo legal o fato de ser presidente do Banco Operador S/A, além de sócio das demais coligadas. Assinou o quinto aditamento ao contrato de abertura de crédito em conta corrente celebrado entre o Banco Operador S/A e a Opercred Administradora de Cartões de Crédito Ltda. (fl. 93 do volume I do apenso). Também assinou, em nome do Banco Operador S/A, o contrato de prestação de serviço com a Opercred Promotora de Vendas S/C Ltda. Era o responsável pela área contábil e pelas carteiras de investimento e comercial do Banco Operador S/A. As quantias envolvidas, principalmente as descritas nos itens 08 e 09 da inicial acusatória, são bastante expressivas. Não obstante o alerta do Banco Central, continuou na prática delituosa. O empréstimo entre empresas coligadas causou grave dano em potencial ao sistema financeiro. A causa de elevação penal do artigo 71 do Código Penal também foi estabelecida acima do mínimo legal, em virtude do grande número de infrações da mesma espécie, modus operandi semelhante e proximidade temporal. Com idênticos critérios, a pena-base pecuniária é de 98 (noventa e oito) dias-multa que, somada de 1/2 (metade) pela continuidade criminosa, totaliza 147 (cento e quarenta e sete) dias-multa. O valor de cada dia-multa é de 01 (um) salário mínimo, à vista da condição econômico-financeira do acusado, que é empresário e conforme a renda declarada no boletim de vida pregressa de fls. 274/275. O regime inicial deve ser o semi-aberto, ex vi do artigo 33, § 2º, alínea 'b', do Código Penal. A pena de Ralph Levy Garboua também deve ser majorada. Fixo a pena-base privativa de liberdade em 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão. Ausentes agravantes e atenuantes, bem como causas de diminuição. Acresço-a em 1/2 (metade), em razão da continuidade delitiva. Sanção final: 04 (quatro) anos, 01 (mês) mês e 15 (quinze) dias de reclusão. Levei em consideração para fixar a pena-base acima do mínimo legal o fato de o réu ser diretor-executivo do Banco Operador S/A, além de sócio das demais coligadas. Firmou pelo Banco Operador S/A o contrato de prestação de serviços celebrado com a Opercred Promotora de Vendas S/C Ltda. Conhecia detalhes sobre as operações descritas na denúncia. As quantias envolvidas, principalmente as descritas nos itens 08 e 09 da inicial acusatória, são bastante expressivas. Não obstante o alerta do Banco Central, continuou na prática delituosa. O empréstimo entre empresas coligadas causou grave dano em potencial ao sistema financeiro. A causa de elevação penal do artigo 71 do Código Penal também foi estabelecida acima do mínimo legal, em virtude do grande número de infrações da mesma espécie, modus operandi semelhante e proximidade temporal. Com idênticos critérios, a pena-base pecuniária é de 88 (oitenta e oito) dias-multa que, somada de 1/2 (metade) pela continuidade criminosa, totaliza 144 (cento e quarenta e quatro) dias-multa. O valor de cada dia-multa é de 01 (um) salário mínimo, à vista da condição econômico-financeira do acusado, que é empresário, e conforme a renda declarada no boletim de vida pregressa de fls. 287/288. O regime inicial deve ser o semi-aberto, ex vi do artigo 33, § 2º, alínea 'b', do Código Penal. Quanto aos co-réus Ralph Barki Bigio e Toufik Kattan, devem ser estabelecidas as mesmas penas cominadas e idêntico regime inicial de cumprimento da sanção ao do co-réu Ralph Levy Garboua, porquanto agiram em co-autoria nas mesmas práticas delituosas. Eram diretores-executivos do Banco Operador S/A e sócio das coligadas. Não obstante o alerta do Banco Central, continuou na prática delituosa. O empréstimo entre empresas coligadas causou grave dano em potencial ao sistema financeiro. Toufik Kattan era responsável pelo departamento financeiro da Operadora Corretora de Câmbio Ltda., uma das beneficiadas com o mútuo vedado por lei. Também assinou o contrato de prestação de serviços celebrado entre o Banco Operador S/A e a Opercred Promotora de Vendas S/C Ltda. Ralph Barki Bigio, por sua vez, era o responsável pelos depósitos à vista e adiantamentos a depositantes. Também são empresários e possuem renda compatível com o valor do dia-multa determinado, conforme boletins de vida pregressa de fls. 262/263 e 279/280. Relativamente ao co-réu Andrés Ricardo Mainzer, a pena-base, assim como a causa de aumento do artigo 71 do Código Penal devem ser fixadas um pouco acima do mínimo legal, já que somente agiu em co-autoria em relação às condutas descritas nos itens 4.1 a 4.8 da inicial acusatória (adiantamentos às empresas coligadas mediante débitos na conta 'valores a receber de sociedades ligadas e/ou adiantamentos a depositantes', destinados à cobertura de saldos devedores em conta corrente). A contabilidade e a gerência administrativa estavam sob sua responsabilidade. Foi dispensado do cargo de diretor-executivo em 30.11.1992, e dos 08 (oito) empréstimos concedidos ilicitamente, foi co-autor de 05 (cinco) deles: em 07.10.1992, à Operadora DTVM Ltda. e à Operadora Corretora da Mercadorias Ltda. e, em 10.11.1992, à Seta Banco de Dados Ltda., à Operadora Factoring Ltda. e à Operadora Promotora de Vendas Ltda.. Logo, fixo a pena-base em 02 (dois) e 06 (seis) meses de reclusão. Ausentes agravantes e atenuantes genérica, bem como causas de diminuição. Acresço-a em 1/3 (um terço) em razão da continuidade delitiva. Sanção final: 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão. Com idênticos critérios, a pena-base pecuniária é de 54 (cinqüenta e quatro) dias-multa que, somada de 1/3 (um terço) pela continuidade criminosa, totaliza 72 (setenta e dois) dias-multa). O valor é de 01 (um) salário mínimo, à vista da condição econômico-financeira do acusado, que é empresário e conforme a renda declarada no boletim de vida pregressa de fls. 266/267. A sanção segregativa será cumprida em regime aberto, ex vi do artigo 33, § 2º, alínea 'c', do Código Penal. Por força do artigo 44 do Código Penal e preenchidos os requisitos legais, substitui-se a privação de liberdade por 02 (duas) penas restritivas de direitos: prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 70 (setenta) salários mínimos, compatível com o dano causado. Ante o exposto, voto para negar provimento à apelação dos réus Sony Alberto Douer e Ralph Levy Garboua e dar provimento à apelação ministerial e condenar, como incursos no artigo 17 da Lei nº 7.492/86, c.c. o art. 71 do Código Penal, Sony Alberto Douer a 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime semi-aberto, e ao pagamento de 147 (cento e quarenta e sete) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo, Ralph Levy Garboua, Toufik Kattan e Ralph Barki Bigio a 04 (quatro) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime semi-aberto, e ao pagamento de 144 (cento e quarenta e quatro) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo, e Andrés Ricardo Mainzer a 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 72 (setenta e dois dias-multas, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos: prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 70 (setenta) salários mínimos. (...)“ (fls. 697/703). De resto, a alegada nulidade por ausência de aplicação da circunstância atenuante inserta no artigo 65, inciso III, alínea “b“, do Código Penal restou desacompanhada de qualquer demonstração. Pelo exposto, concedo, em parte, o habeas corpus, para, reduzir as penas dos réus SONY ALBERTO DOUER, para 4 anos, de reclusão, a partir do regime aberto, e 130 dias-multa; RALPH LEVY GARBOUA, RALPH BARKI BIGIO e TOUFIK KATTAN, para 3 anos e 6 meses de reclusão, no regime aberto, e 117 dias-multa e, ainda, reduzir a pena de ANDRÉS RICARDO MAINZER para 2 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto, e 72 dias-multa, preservando-lhe a substituição da pena privativa de liberdade, por duas restritivas de direitos: prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária no valor de 70 salários mínimos, compatível com o dano causado. Substituo as penas privativas de liberdade dos pacientes SONY ALBERTO DOUER, RALPH LEVY GARBOUA, RALPH BARKI BIGIO e TOUFIK KATTAN por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária no valor de 70 salários mínimos. É O VOTO.
EMENTA - HABEAS CORPUS . DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. NULIDADES. INOCORRÊNCIA. IRREGULARIDADE NA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. VERIFICAÇÃO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. A falta de oferecimento de contra-razões de apelação pelo advogado constituído, suprida por manifestação de defensor dativo, não enseja a intimação da parte ré para a constituição eventual de novo patrono, se o causídico prossegue no patrocínio da causa. 2. É desnecessária a renovação da nomeação de defensor dativo já investido no munus público no 1º Grau da jurisdição. 3. “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.“ (Súmula do STF, Enunciado nº 523). 4. A juntada de documento desinfluente na decisão da causa, porque não produz qualquer prejuízo, não reclama ciência da outra parte, nem que se lhe oportunize a fala a seu respeito. 5. Não há falar em julgamento ultra petita , se a matéria decidida é tema das alegações finais, incorporadas às razões do apelo, a revelar inequívoca impugnação de todo o julgado. 6. A alusão genérica ao número de delitos não é bastante à justificação do aumento de pena relativo à continuação criminosa, estabelecido num quantum bem superior ao mínimo legal. 7. Ordem parcialmente concedida.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, após o voto do Sr. Ministro Relator concedendo parcialmente a ordem, no que foi acompanhado pelos Srs. Ministros Paulo Gallotti, Paulo Medina e Maria Thereza de Assis Moura, por unanimidade, conceder em parte a ordem de habeas corpus , nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Ressalvou o entendimento o Sr. Ministro Paulo Gallotti. Os Srs. Ministros Paulo Gallotti, Paulo Medina e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo Medina. Brasília, 13 de fevereiro de 2007 (Data do Julgamento).
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