Estupro. Recolhimento à prisão. Condenação confirmada em sede de apelação criminal pelo tribunal de justiça. Custódia cautelar do paciente compatível com o sistema processual vigente. Recursos extraordinários que, eventualmente interpostos, são desprovidos de efeito suspensivo. Progressão de regime. Afastamento do óbice legal.
Rel. Min. Laurita Vaz
RELATÓRIO - EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ: Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por HUMBERTO BOULHOSA, em favor de SEBASTIÃO RIBEIRO PANTOJA, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará, em sede de apelação. O ora Paciente foi condenado, pelo Juízo de Direito da Comarca de Salvaterra/PA, como incurso nos arts. 213, c.c. art. 14, inciso II e 213, caput, ambos do Código Penal, à pena de 12 anos de reclusão, em regime integral fechado. Em sede de apelação, a Defesa aduziu insuficiência das provas para condenação, contudo, a Corte a quo, denegando o recurso defensivo, manteve in totum os termos da sentença penal condenatória e determinou a expedição de mandado de prisão em desfavor do paciente. O Impetrante alega, em suma, que o condenado está sofrendo constrangimento ilegal em razão da ordem de expedição de mandado de prisão em seu desfavor, pois o acórdão atacado não transitou em julgado, devido a interposição de recurso previsto na legislação processual penal, qual seja: agravo de instrumento perante o Superior Tribunal de Justiça. Requer, assim, liminarmente, a expedição de alvará de soltura em favor do paciente e, no mérito, seja assegurado ao réu o benefício de aguardar em liberdade o trânsito em julgado de sua condenação. O pedido de liminar foi indeferido nos termos da decisão de fls. 56/57. Estando os autos devidamente instruídos, as informações da Autoridade Impetrada foram dispensadas. O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 60/64, opinando pela denegação da ordem. É o relatório.
VOTO - EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA): A impetração não merece acolhida. Com efeito, ainda que concedido ao réu o direito de recorrer em liberdade pela sentença monocrática condenatória, não há ilegalidade na superveniente decisão da Corte Revisora que, mantendo a condenação imposta, determina a prisão do condenado, iniciando-se, portanto, a execução provisória da pena. Tal premissa ampara-se no fato de que eventual limitação fixada pelo juízo singular não vincula o Tribunal de Justiça, no tocante à expedição de mandado de prisão, porquanto a custódia, agora, traduz-se em mero efeito da condenação e os recursos eventualmente interpostos, quais sejam: o recurso extraordinário e o especial, não têm efeito suspensivo. Nesse sentido, confira-se: “Ementa: CRIMINAL. HC. ROUBO QUALIFICADO. EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO. LEGALIDADE DA IMEDIATA EXECUÇÃO DO JULGADO. PRISÃO COMO MERO EFEITO DA CONDENAÇÃO. LIMITAÇÃO PELO JUIZ DE 1º GRAU QUE NÃO VINCULA TRIBUNAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. Hipótese em que o Julgador monocrático concedeu ao paciente o direito de recorrer em liberdade da sentença condenatória, o que foi entendido pela impetração como direito de o réu permanecer solto até o trânsito em julgado da condenação. Não há ilegalidade na superveniente decisão do Tribunal que, confirmando a imposição da pena, determina a prisão do réu, dando início à execução da pena, pois a custódia se traduz em mero efeito da condenação. Tanto o recurso especial, quanto o extraordinário, não têm, de regra, efeito suspensivo, razão pela qual a sua eventual interposição não tem o condão de impedir a imediata execução do julgado, com a expedição de mandado de prisão contra os réus, para o início do cumprimento da pena. Precedentes do STF e do STJ. Eventual limitação, fixada em 1º grau de jurisdição, não vincula o Tribunal no tocante à expedição de mandado de prisão. Precedentes da Turma. A prisão atacada constitui-se em mero efeito da condenação, não se cogitando de qualquer violação ao Princípio Constitucional da Presunção de Inocência. Ordem denegada.“ (HC n.º 24.787/RJ, rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 03/11/2003) Ademais, como é sabido, a custódia do paciente em cárcere, agora, é decorrente de sua condenação nas instâncias ordinárias, providência compatível com o sistema processual vigente. E, não é possível olvidar que os recursos especial e extraordinário, se interpostos e admitidos, não possuem efeito suspensivo capaz de impedir o regular curso da execução da decisão condenatória. Ressalte-se, ainda, que a sentença condenatória condicionou o direito do réu de recorrer em liberdade apenas à instância ordinária, de modo que não foram albergados os apelos extraordinários (recurso especial já interposto) e, tão-pouco, o trânsito em julgado da condenação. Nesse sentido, confira-se os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça: “Ementa: PROCESSUAL PENAL. CONDENAÇÃO EM GRAU DE APELAÇÃO. RECOLHIMENTO À PRISÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA. 1 - Contra decisão condenatória proferida ou confirmada em grau de apelação cabe, em regra, somente recurso especial ou extraordinário, vias que, pela sua índole extraordinária não têm efeito suspensivo, razão pela qual, ainda que porventura interpostos, nada impede seja expedido mandado de prisão contra o condenado. Precedentes da Corte. 2 - Ordem denegada.“ (HC n.º 23.976/RS, rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ de 09/12/2002, p. 00396) “Ementa: HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. APELAÇÃO CRIMINAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SUBSTITUIÇÃO DE REVISOR POR JUIZ FEDERAL CONVOCADO. EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO. REFORMATIO IN PEJUS. IMPROCEDÊNCIA DAS ALEGAÇÕES. ORDEM DENEGADA. 1. No sistema de direito positivo em vigor, em sede de processo de ação penal pública, inexiste norma legal ou constitucional que assegure ao réu o direito à manifestação de prova documental produzida pelo co-réu, em face da imputação que lhe deduziu o Ministério Público. 2. A supressão de prazo à defesa, de qualquer modo, porque caracterizadora de nulidade relativa, não está condicionada tão-só à argüição oportuna, mas também à demonstração efetiva do prejuízo resultante. 3. Ao juiz convocado aos Tribunais, não inibe a lei as funções de relator e revisor. 4. Não há falar em reformatio in pejus se a Corte Federal Regional, por julgada a apelação, ordena a prisão de réu que se permitira recorrer em liberdade .“ (HC n.º 21.802/SP, rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ de 01/07/2002, p. 00410) (grifei) Concluindo, impende ressaltar que os recursos extremos tão-somente serão recebidos no efeito devolutivo, o que de maneira alguma fere o princípio insculpido no art. 5º, inciso LVII, da Carta Federal, pois como bem decidiu a Corte Suprema, no julgamento do HC n.º 72.171/SP, julgado pela Primeira Turma, sob a relatoria do ilustre Min. Sydney Sanches, o referido corolário constitucional, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é obstáculo, apenas, a que se lance o nome do réu no rol dos culpados, enquanto não estiver definitivamente condenado, mas não a prisão imediata após julgamento do recurso ordinário, como previsto no art. 637 do Código de Processo Penal. De outro lado, vislumbro constrangimento ilegal passível de concessão de habeas corpus de ofício. A celeuma, relativa à inconstitucionalidade ou não do regime integralmente fechado previsto no art. 2.º, § 1.º, da Lei n.º 8.072/90, foi recentemente apreciada e solucionada, em sede de controle de constitucionalidade difuso, pelo Supremo Tribunal Federal. O Pretório Excelso, em sua composição plenária, no julgamento do HC n.º 82.959/SP, em 23 de fevereiro de 2006, declarou inconstitucional o óbice contido na Lei dos Crimes Hediondos, que veda a possibilidade de progressão do regime prisional aos condenados pela prática dos delitos nela elencados. Tal entendimento, firmou-se na interpretação sistêmica dos princípios constitucionais da individualização, da isonomia e da humanidade da pena. Ressalte-se, por fim, à guisa de complementação, que se afastou tão-somente a proibição legal quanto à impossibilidade de progressão carcerária aos condenados pela prática de crimes hediondos e equiparados, tendo sido, todavia, ressalvado pelo Supremo Tribunal Federal, no mencionado precedente, que caberá ao juízo da execução penal analisar os pedidos de progressão considerando o comportamento de cada condenado e o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício. Ante o exposto, DENEGO A ORDEM, com a concessão de HABEAS CORPUS DE OFÍCIO para reformar o acórdão proferido pelo Tribunal a quo e a sentença condenatória na parte relativa à imposição do regime integralmente fechado, ressalvando, contudo, que competirá ao juízo das execuções criminais, atendidos os requisitos subjetivos e objetivos, decidir sobre o deferimento do benefício da progressão de regime prisional. É o voto.
EMENTA – HABEAS CORPUS . PROCESSUAL PENAL. ESTUPRO. RECOLHIMENTO À PRISÃO. CONDENAÇÃO CONFIRMADA, EM SEDE DE RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL, PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CUSTÓDIA CAUTELAR DO PACIENTE COMPATÍVEL COM O SISTEMA PROCESSUAL VIGENTE. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS QUE, EVENTUALMENTE INTERPOSTOS, SÃO DESPROVIDOS DE EFEITO SUSPENSIVO. PROGRESSÃO DE REGIME. DECLARAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2.º, § 1.º, DA LEI N.º 8.072/90, PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AFASTAMENTO DO ÓBICE LEGAL. 1. Ainda que concedido ao réu o direito de recorrer em liberdade da sentença condenatória, não há ilegalidade na superveniente decisão do Tribunal de Justiça que, mantendo a condenação, determina a imediata expedição de mandado de prisão para o início da execução provisória da pena. 2. Os recursos especial e extraordinário, se interpostos e admitidos, não possuem efeito suspensivo capaz de impedir o regular curso da execução da decisão condenatória. A custódia do sentenciado em cárcere, decorrente de sua condenação na instância ordinária, em sede de recurso de apelação, é providência compatível com o sistema processual vigente. 3. Precedentes do STJ e do STF. 4. Ordem denegada. 5. Habeas corpus concedido de ofício para reformar o acórdão proferido pelo Tribunal a quo e a sentença condenatória na parte relativa à imposição do regime integralmente fechado, ressalvando, contudo, que competirá ao juízo das execuções criminais, atendidos os requisitos subjetivos e objetivos, decidir sobre o deferimento do benefício da progressão de regime prisional.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem, concedendo “Habeas Corpus“ de ofício, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima e Felix Fischer votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp. Brasília (DF), 03 de agosto de 2006 (Data do Julgamento)
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