Pena-base (fixação acima do mínimo legal). Circunstância elementar do crime (motivação). Fundamentação (falta). Correção da pena-base (possibilidade). Cumprimento (regime inicial semi-aberto).
Rel. Min. Nilson Naves
RELATÓRIO - O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: São estes os fatos segundo a denúncia: “Que na ocasião os denunciados estavam em uma festa dançante realizada em um galpão sito na Av. Coronel Gaspar, centro desta urbe, quando por volta das 03:00 horas saíram daquele local em direção à Lanchonete Beija Flor. Que lá chegando verificaram a existência de duas pessoas jogando sinuca, tendo notado também que um dos participantes do jogo, encontrando-se em estado de visível embriaguez, tinha ao bolso algumas notas de papel moeda. Que então resolvendo subtrair do mesmo o dinheiro que portava, os denunciados de comum acordo e prévia organização, incitaram algumas adolescentes que estavam em suas companhias para atraírem a vítima para lugar escuro. Que conforme o arquitetado a vítima foi levada para local (...) ermo, quando que os denunciados, usando de violência agrediram fisicamente a vítima Manoel Delfino Medeiros Cruz, e após reduzir à impossibilidade de resistência, subtraíram dele o numerário que possuía correspondendo a R$ 25,00 (vinte e cinco reais).“ Na sentença, o Juiz de Uruaçu condenou o paciente à pena de 8 (oito) anos de reclusão, a ser cumprida, inicialmente, em regime fechado, pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, II, do Cód. Penal. Impetrado habeas corpus, denegou-lhe a ordem o Tribunal de Justiça de Goiás. Confira-se a ementa do acórdão: “Habeas corpus . Sentença condenatória transitada em julgado. Redução da pena. Inadmissibilidade. Inviável, em sede de habeas corpus , a reforma de sentença transitada em julgado, por exigir aprofundado exame de fatos e provas, a qual só poderá ser questionada em sede de revisão criminal. Habeas corpus indeferido, à unanimidade de votos.“ No Superior Tribunal, são estes os pedidos: “... seja a presente ordem concedida para adequar a pena base do paciente de forma justa, nos termos dos arts. 59 e 68 do CP, reduzindo-a ao mínimo legal, e ainda, e de forma independente, rever o regime inicial de cumprimento de pena, haja vista a determinação legal, e ainda, a ausência completa de fundamentação para aplicação de regime mais grave, resguardando assim os direitos constitucionais do paciente...“ Opinou o Ministério Público Federal pela denegação da ordem. É o relatório.
VOTO - O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES (RELATOR): Entre o mínimo de 4 (quatro) e o máximo de 10 (dez) anos, foi a pena-base fixada em 7 (sete) anos de reclusão. Eis os fundamentos da sentença: “Considerando que o agente é imputável, tinha consciência da ilicitude de sua conduta e lhe era exigível conduta diversa; Considerando que seus antecedentes lhe favorecem, conforme certidões de folhas 38 e 48; Considerando que sua conduta social não é, conforme depoimentos testemunhais, desabonadora; Considerando que sua personalidade, ao que tudo indica, não é voltada para o crime; Considerando que os motivos foram reprováveis, benefício pessoal com prejuízo alheio; Considerando que as circunstâncias foram indiferente penal; Considerando que as conseqüências do crime não foram graves; Considerando que o comportamento da vítima não contribuiu para o crime. Fixo a pena base em 07 (sete) anos de reclusão e 40 (quarenta) dias multa, no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo cada dia multa. Considerando a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso I (primeira parte), diminuo a pena em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, ficando a pena em 06 (seis) anos de reclusão e 30 (trinta) dias-multa. Ainda, aumento a pena no mínimo legal de 1/3 (um terço), ou seja, em 02 (dois) anos e 10 (dez) dias multa, em atenção ao reconhecimento do aumento previsto no § 2º, inciso II, do artigo 157, do Estatuto Penal, já que ocorreu uma qualificadora, além das circunstâncias do roubo assim indicarem. Ficando a pena definitiva em 08 (oito) anos de reclusão, a ser cumprida, no início, em regime fechado...“ Vê-se que, na fixação da pena-base, não poderia a autoridade tê-la fixado acima do mínimo legal, porquanto as circunstâncias judiciais do art. 59 do Cód. Penal não eram desfavoráveis ao réu. Fê-lo, tão-somente, porque “os motivos foram reprováveis, benefício pessoal com prejuízo alheio“. Ora, não há falar em roubo – crime patrimonial – que não vise ao benefício pessoal, muito menos que não cause o prejuízo alheio. Noutras palavras, as circunstâncias apontadas dizem respeito à elementar do tipo penal em questão. Assim, claro está que a motivação constante da sentença não se apresenta suficientemente idônea para se apenar tal como ali se apenou – quase o dobro do mínimo legal. Em casos que tais, a solução que vem sendo adotada é a revisão do cálculo da pena. A propósito, ementei o HC-39.517 (DJ de 3.4.06) assim: “Pena-base (fixação). Fundamentação (necessidade). 1. No cálculo da pena-base, o juiz há de dar toda atenção às circunstâncias estabelecidas pelo art. 59 do Cód. Penal. 2. Quando a circunstância judicial é elementar do crime, não pode ela ingressar no processo mental da primeira fase de fixação da pena. 3. Havendo excesso de pena-base na sentença, é admissível a sua correção no julgamento da ação de habeas corpus. 4. Ordem concedida.“ Partindo das circunstâncias apontadas na sentença, proponho que a pena-base seja fixada em 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Deixo, porém, considerar a atenuante genérica (art. 65, I, do Cód. Penal), pois a fixação já se deu no patamar mínimo. Em seguida, elevo a pena em um terço, por força do § 2º, II, do art. 157 do Cód. Penal, havendo, pois, de ser a reclusão de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses, a multa, de 13 (treze) dias-multa. Quanto ao regime inicial de cumprimento de pena, há de vir a pêlo a letra b do § 2º do art. 33 do Cód. Penal: “o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto.“ Em casos dessa ordem, venho dizendo o seguinte (HC-36.112, DJ de 16.8.04): “Pena privativa de liberdade (cumprimento). Regimes (fechado/semi-aberto). Roubo (figuras qualificadas). 1. Quando da fixação da pena, o juiz estabelecerá o regime inicial de cumprimento da pena, levando em conta, a teor do disposto no art. 33, § 3º, do Cód. Penal, as circunstâncias previstas no art. 59. 2. Quando as circunstâncias forem favoráveis ao réu, não é lícito ao juiz estabelecer regime pior, tomando em consideração a natureza do crime praticado. 3. Tratando-se de réu primário e de bons antecedentes, daí ter o próprio juiz fixado a pena no seu mínimo, tem o condenado direito a iniciar o cumprimento da pena no regime legalmente adequado. 4. Precedentes do STJ. 5. Habeas corpus deferido.“ Voto, pois, pela concessão da ordem com o intuito de fixar a pena privativa de liberdade, de uma vez por todas, em 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, a ser iniciada no regime semi-aberto, e a de multa, em 13 (treze) dias-multa.
EMENTA - Pena-base (fixação acima do mínimo legal). Circunstância elementar do crime (motivação). Fundamentação (falta). Correção da pena-base (possibilidade). Cumprimento (regime inicial semi-aberto). 1. No cálculo da pena-base, o juiz há de dar toda atenção às circunstâncias judiciais do art. 59 do Cód. Penal. Contudo tais circunstâncias, quando elementares do crime, não podem ingressar no processo mental da primeira fase de fixação da pena. 2. Havendo excesso de pena-base na sentença, é admissível a sua correção no julgamento da ação de habeas corpus. 3. No caso, sendo as circunstâncias judiciais favoráveis, tem o réu, portanto, direito de iniciar o cumprimento da pena no regime legalmente adequado. 4. Habeas corpus deferido para, de um lado, reduzir-se a pena-base e, de outro, estabelecer-se o regime semi-aberto.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Maria Thereza de Assis Moura e Carlos Fernando Mathias (Juiz convocado do TRF 1ª Região) votaram com o Sr. Ministro Relator.
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