Tráfico de entorpecentes. Progressão de regime. Lei 11.464/2007. Lapso temporal de 2/5 da pena. Novatio legis in pejus. Aplicação restrita aos delitos cometidos após a vigência da lei. Prazo de 1/6 que deve ser mantido.
Rel. Min. Jane Silva
RELATÓRIO - A EXMA. SRA. MINISTRA JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG) (Relator): Trata-se de habeas corpus contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, que concedeu a ordem anteriormente impetrada em favor de ANDERSON PEREIRA HAJ, para afastar o óbice à obtenção de progressão de regime prisional. O paciente foi condenado à pena de 05 anos e 06 meses de reclusão, em regime integralmente fechado, pela prática do delito descrito no art. 12, caput, da Lei n.º 6.368/76. Irresignada, a defesa impetrou a ordem originária, pugnando pela fixação ao réu do regime prisional inicialmente fechado, a fim de possibilitar-lhe a progressão. O Tribunal a quo concedeu a ordem, para afastar o óbice à progressão de regime prisional, deixando a critério do Juízo das Execuções a análise dos requisitos legais do § 2º da Lei n.º 8.072/90, com a alteração implementada pela Lei n.º 11.464/2007 (fls. 51/54). Daí a presente impetração, na qual se pretende a reforma do acórdão recorrido, para que seja afastada a necessidade de cumprimento de 2/5 da pena imposta ao réu para a obtenção da progressão de regime. Aduz-se, para tanto, que, apesar da alteração referente à possibilidade de progressão aos condenados por delitos hediondos ser mais benéfica ao acusado, o estabelecimento de novo prazo para o cálculo da benesse lhe é prejudicial, devendo, portanto, ser aplicada, nesta parte, a irretroatividade da lei penal mais gravosa. A liminar foi deferida pelo então Relator Ministro Gilson Dipp à fl. 63, para afastar, a título precário, a exigência do cumprimento de 2/5 da pena imposta ao paciente para a concessão do benefício da progressão de regime prisional, devendo prevalecer os requisitos da Lei de Execuções Penais. A Subprocuradoria-Geral da República opinou pela concessão da ordem (fls. 68/70). Relatados, em mesa para julgamento.
VOTO - A EXMA. SRA. MINISTRA JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG) (Relator): Assiste razão ao impetrante. Com o advento da Lei n.º 11.464, de 28 de março de 2007, que modificou o parágrafo 1º do artigo 2º da Lei n.º 8.072/1990, adequando-o à decisão de inconstitucionalidade do antigo dispositivo, feita pelo Supremo Tribunal Federal, substituindo naquele artigo a expressão “integralmente fechado“, por “inicialmente fechado“, não há mais que se falar em óbice à obtenção da progressão de regime prisional aos condenados por delitos hediondos. A aplicação retroativa da lex mitior é imperativo constitucional (artigo 5º, XL da Constituição da República), impedindo, assim, qualquer discussão sobre a matéria. Por outro lado, os parágrafos 1º e 2º do art. 2º da Lei n.º 8.072/90, alterados pela Lei n.º 11.464/2007, passaram a vigorar com a seguinte redação: “§ 1o A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado. § 2o A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente .“ Como se vê, a nova Lei, apesar de ter modificado o regime prisional dos condenados por delitos hediondos para o inicialmente fechado, somente permitiu a progressão de regime após o cumprimento de 2/5 do total da pena, em caso de apenado primário, e de 3/5, quando reincidente. Considerando que antes do advento da Lei n.º 11.464/2007 exigia-se destes condenados o cumprimento de 1/6 da pena para a concessão da progressão, a alteração legal acabou por fixar prazo superior, tratando-se, portanto, de novatio legis in pejus. Dessarte, a imediata aplicação do aumento do prazo para a obtenção da progressão aos condenados por delitos hediondos configura ofensa ao princípio da legalidade, previsto no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal e no art. 1º do Código Penal. A inovação prejudicial não pode retroagir, devendo ser aplicada somente aos crimes cometidos após a vigência da nova lei. Com isso, deve ser mantida a exigência de cumprimento de 1/6 de pena pelos condenados por crimes hediondos ocorridos anteriormente à Lei n.º 11.464/2007, consoante disposto no art. 112 da Lei de Execuções Penais, nos termos do entendimento antes adotado por esta Corte. Ante o exposto, concedo a ordem, para que o Juízo das Execuções Penais analise, de acordo com os preceitos da Lei de Execuções Penais, o cumprimento dos requisitos objetivos e subjetivos pelo paciente, para a obtenção da progressão de regime. É como voto.
EMENTA - CRIMINAL. HC. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PROGRESSÃO DE REGIME. LEI N.º 11.464/2007. LAPSO TEMPORAL DE 2/5 DA PENA. NOVATIO LEGIS IN PEJUS. APLICAÇÃO RESTRITA AOS DELITOS COMETIDOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI. PRAZO DE 1/6 QUE DEVE SER MANTIDO. ORDEM CONCEDIDA. 1- A Lei n.º 11.464/2007, apesar de ter modificado o regime prisional dos condenados por delitos hediondos para o inicialmente fechado, somente permitiu a progressão de regime após o cumprimento de 2/5 do total da pena, em caso de apenado primário, e de 3/5, quando reincidente. 2- Tratando-se de novatio legis in pejus, uma vez que houve majoração do prazo legal de cumprimento de pena para a obtenção da progressão de regime aos condenados por crimes hediondos, a sua imediata aplicação configura ofensa ao princípio da legalidade, previsto no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal e no art. 1º do Código Penal. 3- A inovação prejudicial não pode retroagir, devendo ser aplicada somente aos crimes cometidos após a vigência da nova lei. 4- Deve ser mantida a exigência de cumprimento de 1/6 de pena pelos condenados por crimes hediondos ocorridos anteriormente à Lei n.º 11.464/2007, nos termos disposto no art. 112 da Lei de Execuções Penais. 5- Ordem concedida, para que o Juízo das Execuções Penais analise, de acordo com os preceitos da Lei de Execuções Penais, o cumprimento dos requisitos objetivos e subjetivos pelo paciente, para a obtenção da progressão de regime.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 14 de agosto de 2007(Data do Julgamento).