Prisão preventiva. Delito de tortura contra detentos. Crime atribuído a policial civil. Prisão em flagrante. Liberdade provisória denegada. Inexistência de constrangimento ilegal. Decisão fundamentada.
Rel. Min. Cezar Peluso
RELATÓRIO - O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (Relator): 1. Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de JESSÉ DA SANTANA TELES, contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao Resp nº 658.428 e determinou a manutenção da prisão preventiva antes imposta pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de Ibicaraí/BA. O ora paciente, policial civil, foi denunciado pela suposta prática do delito de tortura, que teria sido praticado contra detentos da Delegacia de Polícia local e contra familiares destes. Tendo sido decretada a prisão preventiva do paciente em 19 de março de 2003 (fls. 29-30), a defesa impetrou habeas corpus, perante o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, que, segundo o impetrante, foi concedido. Contra o acórdão do Tribunal estadual, insurgiu-se o Ministério Público, interpondo recurso especial, ao qual foi dado provimento, nos termos da ementa: “RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. TORTURA. LIBERDADE PROVISÓRIA. INVIABILIDADE. Tratando-se de réu cuja prisão preventiva foi decretada em conformidade com os requisitos elencados no art. 312 do Código de Processo Penal pela prática do crime de tortura, e não padecendo de qualquer vício seu aprisionamento, incabível é o benefício da liberdade provisória, conforme preconiza a Lei nº 8.072/90, em seu artigo 2º, inciso II. Recurso conhecido e provido“ (fls. 55). Alegam os impetrantes que, indevidamente fundamentado, o decreto de prisão preventiva deve ser revogado. Indeferi o pedido de liminar (fls. 63-64). A Procuradoria-Geral da República ofereceu opinou pela denegação da ordem (fls. 67-70). É o relatório.
VOTO - O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (Relator): 1. Não assiste razão aos impetrantes, porque a prisão preventiva, decretada contra o paciente, tem fundamentação que lhe confere caráter cautelar. 2. A decisão que decretou a preventiva do paciente está vazada nestes termos: “Diante da gravidade dos fatos relatados na denuncia (sic) que constituem crimes hediondos e inafiançaveis (sic) e da repercussão dos mesmos nesta comunidade, que faz com que as pessoas sintam temor diante dos denunciados a quem deveriam ter respeito, aliado ao fato de que os denunciados já fizeram ameaças as (sic) vítimas e que são responsáveis pela custódia dos mesmos, já que trabalham como policiais civis na delegacia local, para que vítimas e testemunhas não se sintam ameaçadas e não lhe aconteçam nenhum mau grave, decreto a prisão preventiva“ (fls. 29, grifei). Ainda que abstraídos, por discrepantes da disciplina processual penal, os fundamentos alusivos à “gravidade dos fatos relatados na denúncia“, que seriam “hediondos“, e “inafiançáveis“ bem como à “repercussão dos mesmos nesta comunidade“, fato é que a magistrada se apoiou na circunstância concreta de que os denunciados, entre eles o paciente, já teriam feito ameaças às vítimas, as quais estariam sob sua custódia. Daí, a invocação, a meu ver, correta, da necessidade da cautelar para a garantia da instrução criminal, nos termos do previsto no art. 312 do Código de Processo Penal. “HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. AMEAÇA A TESTEMUNHAS. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. A privação cautelar da liberdade do paciente está fundada em elementos concretos e não em mera abstração do Juiz, como sustentado na impetração. No decreto de prisão cautelar há referências de ameaças a testemunhas, sendo que uma delas requereu sua inclusão no programa de proteção a testemunhas. A necessidade da custódia preventiva é robustecida pelo comprometimento da oitiva, no Tribunal do Júri, das testemunhas ameaçadas. Ordem denegada“ (HC nº 89.594 - Rel. Min. EROS GRAU - DJ de 13.10.2006). “Habeas Corpus. 1. Crime previsto no artigo 121, § 2º, incisos III, IV e V (homicídio qualificado), e seu § 4º, segunda parte (aumento de pena), c/c o artigo 14, II (tentativa), e o artigo 29 (concurso de pessoas), todos do Código Penal. 2. A impetração sustenta, em síntese, a ausência de fundamentação do decreto de prisão preventiva. 3. No caso concreto, a decretação da preventiva baseou-se nos fundamentos da garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do CPP. 4. A fundamentação registra não apenas a gravidade do delito em apuração, mas também que o homicídio (tentado) tinha o fim de encobrir desvios de valores da conta bancária da vítima, efetivados pelo paciente, na qualidade de gerente do banco. O Juízo de 1º grau apresentou elementos suficientes para a caracterização da garantia da ordem pública, que se faz necessária também em conseqüência dos graves prejuízos causados à credibilidade das instituições públicas. Precedentes: HC nº 82.149/SC, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 13.12.2002; HC nº 82.684/SP, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 1º.08.2003; HC nº 83.157/MT, Pleno, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 05.09.2003 e HC nº 80.717/SP, Plenário, maioria, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 05.03.2004. O Juízo de 1º grau também registrou a possibilidade de ameaça às testemunhas e a fuga do paciente. 5. Decreto de prisão preventiva devidamente fundamentado, nos termos do art. 312 do CPP e art. 93, IX, da CF. Existência de razões suficientes para a manutenção da prisão preventiva. Precedentes. 6. Ordem indeferida“ (HC nº 88.476 - Rel. Min. GILMAR MENDES - DJ de 06.11.2006). 3. Ante o exposto, denego a ordem.
EMENTA - AÇÃO PENAL. Prisão preventiva. Delito de tortura contra detentos. Crime atribuído a policial civil. Prisão em flagrante. Liberdade provisória denegada. Inexistência de constrangimento ilegal. Decisão fundamentada. Ameaças às vítimas que estariam sob custódia do paciente. Caso de conveniência da instrução criminal. HC denegado. Aplicação do art. 312 do CPP. É legal a prisão preventiva de policial acusado do crime de tortura contra vítimas que estavam sob sua custódia e foram por ele ameaçadas.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Senhor Ministro GILMAR MENDES, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em denegar a ordem. Falou, pelo paciente, o Dr. ABDON ANTÔNIO ABBADE DOS REIS. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor
Ministro CELSO DE MELLO. Brasília, 10 de abril de 2007.
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