Habeas Corpus Nº 90.790/dfHabeas Corpus Nº 90.790/df

Habeas corpus . Decreto de expulsão. Paciente com filho Nascido no Brasil. Ausência de prova. Não-conhecimento.

Rel. Min. Castro Meira

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Decreto de expulsão. Paciente com filho nascido no Brasil. Ausência de prova. Não-conhecimento.

Rel. Min. Castro Meira


RELATÓRIO - O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator):
Cuida-se de Habeas Corpus , com pedido de liminar, impetrado em favor de Edd Abadallah Mohamed, de nacionalidade estrangeira, contra ato supostamente ilegal do Ministro de Estado da Justiça, consistente na Portaria nº 552, de 28 de abril de 2006, que determinou a expulsão do paciente do território nacional, em conformidade com o que dispõe o art. 65 da Lei nº 6.815/80. Na peça inicial, o impetrante relata que o paciente foi condenado com base no art. 304 c/c o art. 297 do Código Penal, tendo cumprido integralmente sua pena. Após ser posto em liberdade, “constituiu uma família no Brasil, e não mais se envolveu em qualquer conduta capitulada como ilícita, trabalhando na informalidade e sustentando a sua família“ (fl. 03). Enfatiza que sua companheira é estrangeira refugiada, sem conhecimento da Língua Portuguesa, e que depende economicamente dele, da mesma forma que a filha brasileira, oriunda desse relacionamento. Narra que ele e sua companheira se dirigiram à sede da Polícia Federal em São Paulo a fim de regularizar sua documentação, possibilitando, assim, o registro de nascimento de sua filha recém-nascida. Porém, ao chegar ao Departamento da Polícia Federal, o paciente foi surpreendido com a notícia da existência de portaria decretando sua expulsão, razão pela qual foi recolhido ao cárcere daquela instituição. Cita precedentes desta Corte que teriam concedido a ordem em casos supostamente análogos. Pugna pela concessão da ordem para que seja reconhecida a causa impeditiva da expulsão do paciente. Deferi a liminar às fls. 34-36. O Ministro de Estado da Justiça interino manifestou-se informando que o paciente foi condenado à pena de quatro anos de reclusão e ao pagamento de multa, por ter incorrido nos tipos penais previstos nos arts. 304 e 297 do Código Penal. Em apelação, a pena foi reduzida para dois anos e seis meses de reclusão. Por esse motivo, foi instaurado inquérito administrativo para fins de expulsão, nos termos do art. 68, parágrafo único, da Lei nº 6.815/80, alterada pela Lei nº 6.964/81. A autoridade impetrada em comento trouxe aos autos documentos que instruíram o inquérito e concluiu: “Nessas circunstâncias, não se encontrando o ádvena amparado pelas excludentes de expulsabilidade previstas no artigo 75 da Lei n.º 6.815 e, em face da sua conduta nociva, tornou-se inconveniente aos interesses nacionais, tendo sua expulsão decretada por meio da Portaria Ministerial n.º 0552, de 28.03.2006, publicada no Diário Oficial da União no dia 02.05.2006. Como o estrangeiro já havia cumprido a sua pena, esta Divisão solicitou agilizar o pedido de efetivação da expulsão por parte da Polícia Federal“ (fl. 49). O Ministério Público Federal opinou pela concessão da ordem. Eis a síntese de seu parecer: “HABEAS CORPUS . ESTRANGEIRO. EXPULSÃO. CRIME DE USO E FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. FILHO BRASILEIRO APÓS CONDENAÇÃO. CAUSA IMPEDITIVA DE EXPULSÃO. ABRANDAMENTO DO ART. 75, § 1º, DA LEI N.º 6.815/80. PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. 1. A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente trouxeram o entendimento no sentido da integral proteção à criança e ao adolescente, não só no aspecto econômico, mas também no afetivo e mora. 2. Deve ser abrandado o contido no art. 75, § 1º, da Lei n.º 6.815/80, para se considerar como causa impeditiva da expulsão a existência de filho brasileiro, independente da limitação temporal imposta. Precedentes do STJ. 3. Parecer porque seja concedida a ordem“ (fl. 85). Solicitei ao Juiz Corregedor-Geral do Estado de São Paulo informações a respeito do andamento do pedido de registro de nascimento de Oprah Abdallah Mohamed – representada por sua genitora, Pamela Bizimana Claude –, efetuado em 29.08.2007, a fim de se coletarem dados que atestassem a paternidade de Edd Abdallah Mohamed, o paciente (fl. 91). O magistrado informou que o registro da criança foi autorizado sem a qualificação paterna, constando do assento apenas a da genitora. A averbação da paternidade restou condicionada à complementação dos documentos que demonstrariam o vínculo entre o suposto pai e a menor, “notadamente a exibição de cópia de documentos oficiais, demonstrando a completa qualificação, filiação, etc., além de prova de que se encontrava no Brasil por ocasião da concepção da criança, bem como de exibição de documento pessoal e cabal reconhecendo a indigitada paternidade“ (fl. 96). É o relatório.

 

VOTO - O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator):
Embora tenha inicialmente deferido a liminar, uma análise mais detalhada do caso demonstra a impossibilidade de manutenção daquele decisum , pois o habeas corpus não se encontra devidamente instruído. De fato, as provas carreadas aos autos são insuficientes à demonstração da paternidade alegada – que seria o motivo para a concessão da ordem, como observado na decisão que deferiu a liminar às fls. 34-36. A declaração de Pamella Bizamana Claude de que conviveria de forma marital com o paciente (à fl. 15) não tem a força que lhe pretende emprestar o impetrante, até porque se trata de documento confeccionado na Língua Portuguesa, idioma do qual a suposta companheira não tem conhecimento. Não houve sequer o cuidado de se trazer aos autos declaração redigida por tradutor juramentado. Do mesmo modo, o documento de fl. 18, que atesta o fato de o paciente prestar serviços gerais na informalidade, desserve ao fim almejado. A conta de energia elétrica de fl. 19, no nome de “Pamella Bizimana Clauder“, não demonstra, por si só, qualquer tipo de dependência econômica e, menos ainda, a paternidade defendida. A ficha do hospital e a declaração de nascido vivo (fls. 21 e 22) registram tão-somente o nome da mãe, não havendo nenhuma menção ao nome do pai. Por fim, o pedido de lavratura do assento de nascimento de Oprah Abdallah Mohamed, efetuado pelo paciente e por Pamela Bizimana Claude, não foi deferido quanto ao registro do nome do pai, até o presente momento. Como bem observou o Juiz Corregedor-Geral do Estado de São Paulo ao ser instado a se manifestar acerca do pedido em comento, que lhe fora submetido: “A questão envolvendo a situação de permanência irregular do suposto pai reclama redobrada cautela, sobretudo, em face da sensação de que a situação pode dar a impressão de que se trata de uma estratégia, para evitar, por exemplo, uma extradição ou deportação, etc“ (fl. 96). De fato, seria temerário conceder a ordem tão-somente com base nas provas que formam o presente remédio, até por se tratar de paciente que foi condenado em 2003, por ter falsificado documento público e dele se utilizado. O habeas corpus, como writ constitucional, deve vir instruído com todas as provas das alegações que encerra, pois não comporta dilação probatória. Nesse sentido, o seguinte precedente: “HABEAS CORPUS . ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. WRIT NÃO INSTRUÍDO. INEXISTÊNCIA DE PROVA DO ALEGADO CONSTRANGIMENTO ILEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE COMPREENSÃO DA CONTROVÉRSIA PELAS INFORMAÇÕES. NEGATIVA DA IMPETRANTE EM REGULARIZAR O FEITO. NÃO CONHECIMENTO. 2. Em que pese as duas oportunidades dadas à Impetrante de regularizar o feito e após tentativa frustrada de instruí-lo, não foi possível descobrir o real objeto do presente habeas corpus. Na hipótese, sequer, restou esclarecido quem é realmente o Paciente. 3. O rito da ação constitucional do habeas corpus demanda prova pré-constituída, apta a comprovar a ilegalidade aduzida, descabendo conhecer de impetração mal instruída, onde não tenha sido juntada peça essencial para o deslinde da controvérsia, inviabilizando a adequada análise do pedido. 4. Habeas corpus não conhecido“ (HC 49.090/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 05.11.07). Ante o exposto, denego a ordem, cassando a liminar. É como voto.

 
EMENTA -
HABEAS CORPUS . DECRETO DE EXPULSÃO. PACIENTE COM FILHO NASCIDO NO BRASIL. AUSÊNCIA DE PROVA. NÃO-CONHECIMENTO. 1. O habeas corpus impetrado com o fito de ver reconhecida causa impeditiva da expulsão do paciente do país – qual seja, o fato de ter filha nascida no Brasil que vive sob sua guarda – deve trazer em seu bojo as provas que demonstrem suficientemente tal circunstância. 2. O habeas corpus, como writ constitucional, deve vir instruído com todas as provas das alegações que encerra, pois não comporta dilação probatória. 3. Ordem denegada.

 
ACÓRDÃO -
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, com a revogação da liminar, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. A Sra. Ministra Denise Arruda e os Srs. Ministros Humberto Martins, José Delgado, Eliana Calmon e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Herman Benjamin e Luiz Fux. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki. Brasília, 12 de dezembro de 2007 (data do julgamento).

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