Lesão corporal. Deficiência da defesa técnica. Não-ocorrência. Desclassificação da lesão corporal. Análise de provas. Alegação de que o termo de renúncia ao direito de recorrer foi assinado pelo réu, induzindo a erro. Não-comprovação. Substituição da pena por restritiva de direitos. Impossibilidade. Delito praticado com violência.
Rel. Min. Laurita Vaz
RELATÓRIO - A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ: Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus interposto por MILTON PEREIRA DE BRITO, preso e condenado definitivamente à pena de 4 (quatro) anos de reclusão, em regime semi-aberto, pela prática do delito tipificado no art. 129, I e IV, do Código Penal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. O Recorrente alega, em suma, que agiu em legítima defesa e que a vítima não ficou incapacitada permanentemente para o trabalho. Aduz, ainda, que assinou, induzido a erro, o “termo de renúncia ao direito de recorrer“, bem como que o magistrado deveria ter substituído sua pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Requer a cassação da sentença condenatória, em razão da deficiência da defesa apresentada pelo seu defensor dativo, uma vez que “sequer foi informado dos seus direitos de recorrer, para comprovar sua inocência, não foi requerido laudo pericial complementar, que viesse a comprovar efetivamente que a vítima não sofreu lesão corporal gravíssima e que, não está inapta para as suas atividades.“ (fl. 298). O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 320/326, opinando pelo desprovimento do recurso. É o relatório.
VOTO - A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (Relatora): O recurso não comporta provimento. Verifica-se dos autos que o Recorrente foi satisfatoriamente assistido na instrução criminal por defensor nomeado, que atuou em todos os atos processuais, comparecendo às audiências e apresentando em alegações finais as teses de defesa levantadas no presente writ: legítima defesa e ausência de lesão corporal de natureza gravíssima. É, aliás, o que se extrai do seguinte excerto das alegações finais: “[...] A própria vítima - fls. 62 - declarou que continua lavrador e no mesmo endereço da Estrada da Ponte Alta, na chácara da represa, quer dizer, no mesmo emprego de há um ano e meio atrás. Se estivesse impossibilitado de trabalhar, o patrão já o teria mandado embora há muito tempo. [...] Não houve dolo na conduta do acusado, pois defendeu-se de perigo iminente. Assim, a defesa requer a absolvição de Nilton, por legítima defesa. É primário, sempre teve boa conduta, e trabalhador, conforme testemunha de fls. 65. Não representa perigo para a sociedade. Foi um acaso, onde se viu ameaçado, durante um passeio permitido pelo proprietário do local. S.M.J., como não houve dolo, a defesa requer também, a desclassificação do art. 129, § 2º. [...]“ (fls. 100/101). Quanto ao grau da lesão corporal, o Laudo de Exame de Corpo de Delito (fl. 30) afirma a ocorrência de lesão corporal de natureza gravíssima (incapacidade permanente para o trabalho). Ao contrário, o Recorrente alega que a vítima “não possui quaisquer seqüelas, tampouco incapacidade permanente para o trabalho“ (fl. 294-A). Ocorre que para o acolhimento de tal pretensão faz-se necessário o aprofundamento na seara probatória dos autos, tendo em vista o confronto existente entre o exame de corpo de delito e depoimentos testemunhais, o que não se afigura possível na via estreita do writ, porquanto, como é cediço, as provas colacionadas devem ser incontroversas, e os fatos, convergentes. Nesse sentido, confira-se os seguintes precedentes: “HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE. CONDENAÇÃO EM 2º GRAU. CONTRADIÇÃO DO ACÓRDÃO CONDENATÓRIO SANADA NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. PRETENSÃO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE LESÃO CORPORAL DE NATUREZA LEVE. NECESSIDADE DE EXAME APROFUNDADO DE PROVAS. INVIABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA REDUÇÃO DA PENA PREVISTA NO ARTIGO 129, § 4º, DO CÓDIGO PENAL. AO CONTRÁRIO DO ALEGADO NA IMPETRAÇÃO, NÃO FOI RECONHECIDA A INICIATIVA DA VÍTIMA NAS AGRESSÕES. Ordem denegada.“ (HC n.º 35.900/SP, rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJ de 27/09/2004) “PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL GRAVE. DESCLASSIFICAÇÃO. LESÃO CORPORAL LEVE. REVOLVIMENTO DO CONTEXTO FÁTICO - PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. A desclassificação do delito de lesão corporal grave para o de lesão corporal leve requer, na espécie, o acurado revolvimento do contexto fático-probatório carreado aos autos, procedimento vedado na célere via do writ. Recurso desprovido.“ (RHC n.º 13.058/SP, rel. Min. FELIX FISCHER, DJ de 30/06/2003). Outrossim, a alegação de que o Recorrente, induzido a erro, assinou o termo de renúncia ao direito de recorrer, não foi devidamente comprovada nos autos, não ensejando, assim, o reconhecimento de qualquer nulidade. E, por último, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos encontra óbice no inciso I do art. 44 do Código Penal, pois o delito de lesão corporal é praticado com violência à pessoa, in verbis: “Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;“ Nesse diapasão: “CRIMINAL. HC. ROUBO QUALIFICADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. IMPOSSIBILIDADE. DELITO PRATICADO MEDIANTE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA QUE NÃO AFASTA A TIPIFICAÇÃO LEGAL. ORDEM DENEGADA. A condenação por crime cometido mediante o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa afasta a possibilidade de concessão do benefício da substituição da pena privativa de liberdade. Precedentes. A participação de menor importância não tem o condão de afastar a tipificação concernente ao roubo qualificado, constituindo-se em aspecto a ser considerado, tão-somente, na aplicação da pena. Ordem denegada.“ (HC n.º 19.557/RS, 5ª Turma, rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 03/02/2003). Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É como voto.
EMENTA - RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. LESÃO CORPORAL. DEFICIÊNCIA DA DEFESA TÉCNICA. NÃO-OCORRÊNCIA. DESCLASSIFICAÇÃO DA LESÃO CORPORAL. ANÁLISE DE PROVAS. ALEGAÇÃO DE QUE O TERMO DE RENUNCIA AO DIREITO DE RECORRER FOI ASSINADO PELO RÉU, INDUZIDO A ERRO. NÃO-COMPROVAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. DELITO PRATICADO COM VIOLÊNCIA. 1. O Recorrente foi satisfatoriamente assistido na instrução criminal por defensor nomeado, que atuou em todos os atos processuais, comparecendo às audiências e apresentando em alegações finais as teses de defesa levantadas no presente writ: legítima defesa e ausência de lesão corporal de natureza gravíssima. 2. Para o acolhimento da pretensão de desclassificação da lesão corporal de natureza gravíssima faz-se necessário o aprofundamento na seara probatória dos autos, tendo em vista o confronto existente entre as provas produzidas na instrução criminal, o que não se afigura possível na via estreita do writ, porquanto, como é cediço, as provas colacionadas devem ser incontroversas, e os fatos, convergentes. 3. A alegação de que o Recorrente, induzido a erro, assinou o termo de renúncia ao direito de recorrer, não foi devidamente comprovada nos autos, não ensejando, assim, o reconhecimento de qualquer nulidade. 4. A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos encontra óbice no inciso I do art. 44 do Código Penal, pois o delito de lesão corporal é praticado com violência à pessoa. 5. Recurso desprovido.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Felix Fischer votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 18 de dezembro de 2007 (Data do Julgamento)
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