Recurso Especial Nº 875.463/df

Art. 12 da Lei 6368/76 (antiga Lei de Tóxicos). Cloreto de etila. Substância entorpecente. Norma penal em branco de complementação heteróloga. Convenções internacionais. Validade da Portaria nº 344/98-VS/MS. Inexistência de conflito de normas. Crime equiparado a hediondo. Substituição da pena. Possibilidade. Inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8072/90 declarada pelo STF.

Rel. Min. Felix Fischer


RELATÓRIO -
. O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: Cuida-se de recurso especial interposto, com fulcro no art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, por CASSIUS IBAE GOMES, condenado como incurso no art. 12 da Lei nº 6.368/76 (antiga Lei de Tóxicos), atacando v. acórdão proferido pela c. 1ª Turma Criminal do e. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, que negou provimento à apelação criminal nº 2004.01.1.077680-3. Diz a ementa do julgado: “PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRELIMINARES. LEI Nº 10.409/2002. PROCEDIMENTO. NULIDADE. CLORETO DE ETILA. SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. ANVISA. TIPICIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO. PROVAS. CONDUTA AMOLDADA AO TIPO DO ART. 12 DA LAT. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. LEI Nº 9.714/98. INAPLICABILIDADE. A inobservância do rito previsto no artigo 38 da Lei 10.409/2002 não gera nulidade se não restou demonstrado prejuízo para a defesa. A possibilidade, prevista na lei, de apresentação de defesa, antes do recebimento da denúncia, tem o objetivo de convencer o julgador a rejeitar a inicial acusatória. Todavia, não ocorre cerceamento de defesa se a matéria que se pretendia alegar na defesa preliminar foi efetivamente deduzida em outros momentos processuais, e antes do recebimento da inicial, quais sejam, com o interrogatório em juízo e com a apresentação da defesa prévia. O fato de a substância cloreto de etila não estar relacionada na convenção celebrada pelo Brasil, não significa, necessariamente, que o legislador pátrio esteja impedido de incluí-la entre as substâncias entorpecentes proibidas. É que os tratados internacionais celebrados pelo Brasil, ou os que venha a anuir, não impedem que a legislação nacional se conduza conforme suas necessidades. Os tratados têm o condão apenas de estabelecer diretrizes genéricas da política legislativa nacional, a qual, soberana que é, determinará as substâncias a serem proscritas no País. Portanto, o cloreto de etila é, sim, substância entorpecente capaz de causar dependência física ou psíquica, relacionada na portaria nº 344/98 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e, por conseguinte, de uso proibido no território nacional. Para a configuração do crime descrito pelo artigo 12, caput, da Lei nº 6.368/76, tipo penal de conteúdo múltiplo, bastante a plena subsunção da conduta do acusado a um dos verbos ali presentes, no caso, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar . Excluída, em face do princípio da especificidade, a aplicação da Lei 9.714/98 aos crimes de que trata a Lei 8.072/90, resta vedada a substituição da pena privativa de liberdade pela de restrição de direitos. Apelação desprovida“ (fls. 373/374). No presente recurso especial, alega o recorrente que o v. acórdão reprochado violou a Convenção Única sobre Entorpecentes e a Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas, incorporada ao ordenamento nacional, respectivamente, pelos Decretos nº 54.216/64 e 79.388/77, bem como o art. 12 da Lei nº 6.368/76 (antiga Lei de Tóxicos) e, ainda, o art. 44 do Código Penal. Sustenta, em primeiro lugar, que o cloreto de etila, por não estar incluído na referida convenção internacional, não poderia ser considerado substância psicotrópica por meio de ato administrativo expedido por ente da Administração, tendo em vista ser tal norma hierarquicamente inferior àquela. Ainda, assevera que seria necessário demonstrar que tal substância é causadora de dependência física ou psíquica. Outrossim, defende que a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos se aplica aos crimes hediondos ou equiparados. Requer “o provimento do recurso para: a) cassar o acórdão recorrido para decretar a absolvição do Recorrente, eis que, data maxima venia, homologou condenação por fato atípico; b) não havendo reconhecimento da atipicidade da conduta, espera-se que o apelo extremo seja provido para que seja convertida a pena aplicada ao Recorrente em restritivas de direitos, na forma do art. 44 do Código Penal; c) por fim, se essa Colenda Corte entender que a substituição nessa sede implicará em supressão de instância, espera o provimento do recurso para, cassando o v. acórdão vergastado, determinar que o Tribunal local, analisando os requisitos exigidos pela lei, proceda a substituição da pena privativa de liberdade imposta ao Recorrente por restritiva de direitos, nos termos do dispositivo legal ao qual negou vigência“ (fls. 408/409). Contra-razões ofertadas às fls. 414/421. Admitido na origem, subiram os autos a esta Corte. A douta Subprocuradoria-Geral da República se manifestou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.

 
VOTO - O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER:
Em relação ao primeiro tópico, razão não assiste ao recorrente. Confira-se o que restou dito no d. voto condutor do increpado acórdão, no punctum saliens: “Quanto à alegação de atipicidade da conduta imputada ao apelante, sob o argumento defensivo de que o cloreto de etila não é substância entorpecente capaz de causar dependência física ou psíquica, também não merece acolhimento. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, já decidiu que “...O 'cloreto de etila', vulgarmente conhecido como 'lança-perfume', continua sendo substância proibida pela Lei de Tóxicos, sendo que a sua posse pode caracterizar a prática, em tese, de tráfico interno de entorpecente...“ (STJ - 5ª Turma - HC nº 8180/MS - Rel. Min. Gilson Dipp - 29/06/1999 - unânime - In DJ de 16/08/1999, pág. 77). Confira-se, ainda, julgado recente: “CRIMINAL. RESP. “CLORETO DE ETILA“. SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. RESOLUÇÃO RDC 104. ATO NULO. INOCORRÊNCIA DE ABOLITIO CRIMINIS . RECURSO DESPROVIDO. O “cloreto de etila“, vulgarmente conhecido como “lança-perfume“, continua sendo substância proibida pela Lei de Tóxicos. Ressalva de que a resolução RDC 104, de 06/12/2000 configurou a prática de ato regulamentar manifestamente inválido, tanto que não foi referendado pela própria Diretoria Colegiada, que manteve o cloreto de etila como substância psicotrópica. A posse de cloreto de etila, vulgarmente conhecido como lança-perfume, pode caracterizar a prática, em tese, do crime do art. 16, da Lei n.º 6.368/76. Recurso desprovido.“ (STJ - 5ª Turma - REsp 601937/SP - Rel. Min. Gilson Dipp - 15/06/2004 - unânime - In DJ de 02/08/2004, pág. 537) Ademais, a substância cloreto de etila é relacionada na “...Lista das Substâncias Psicotrópicas (Lista B1) e na Lista de Insumos Químicos Utilizados para Fabricação e Síntese de Entorpecentes e/ou Psicotrópicos (Lista D2) da Resolução-RDC nº 200, de 17/08/2004, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária...“ (fl. 144 - Laudo de Exame em Substância), o que é suficiente para cumprir o disposto no artigo 36 da Lei nº 6.368/76, de modo que, no caso, a conduta do apelante - ter em depósito e fornecer com fim de difusão ilícita - sem autorização legal, “lança-perfume“ amolda-se ao tipo do artigo 12, caput, da mesma Lei. No tocante à alegação de que o ato administrativo da ANVISA, que considera o cloreto de etila substância causadora de dependência química, viola o princípio da hierarquia das leis, eis que o Brasil é signatário de Tratados Internacionais que não prevêem a aludida substância como entorpecente, sem razão o apelante também nesse ponto. O fato de a substância cloreto de etila não estar relacionada na convenção celebrada pelo Brasil, não significa, necessariamente, que o legislador pátrio esteja impedido de incluí-la entre as substâncias entorpecentes proibidas. É que os tratados internacionais celebrados pelo Brasil, ou os que venha a anuir, não impedem que a legislação nacional se conduza conforme suas necessidades. Os tratados têm o condão apenas de estabelecer diretrizes genéricas da política legislativa nacional, a qual, soberana que é, determinará as substâncias a serem proscritas no País. Portanto, o cloreto de etila é, sim, substância entorpecente capaz de causar dependência física ou psíquica, relacionada na portaria nº 344/98 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e, por conseguinte, de uso proibido no território nacional“ (fls. 378/380). Com efeito, na linha de precedentes desta Corte, o “cloreto de etila“, vulgarmente conhecido como “lança-perfume“, continua sendo substância proibida pela Lei de Tóxicos. Nesse sentido: “HABEAS CORPUS . DIREITO PENAL. ABOLITIO CRIMINIS . CLORETO DE ETILA. RETROATIVIDADE BENÉFICA. INOCORRÊNCIA. RESOLUÇÃO Nº 104. ANVISA. ATO DECLARADO INVÁLIDO. ERRO DE PROIBIÇÃO. INOCORRÊNCIA. 1. Na compreensão da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a Resolução nº 104/2000 editada pelo Diretor da ANVISA é inválida, por não referendada pelo colegiado. 2. O cloreto de etila é substância entorpecente de porte para uso próprio e comércio clandestino proibidos pela Lei de Tóxicos. 3. Não há falar em erro de proibição, quando a conduta do agente, ela mesma, o exclui de forma evidente, primus ictus oculi. 4. Ordem denegada.“ (HC 35664/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 19/12/2005). “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS . ARTIGO 12 DA LEI 6368/76. CLORETO DE ETILA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INOCORRÊNCIA. PREVISÃO COMO SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. NEGATIVA DE AUTORIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. LIBERDADE PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. CRIME HEDIONDO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Em que pese a celeuma gerada com a expedição da Resolução RDC 104, de 06/12/2000 (DJ 07/12/2000) em que o Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA excluiu da lista de substância entorpecente F2 o cloreto de etila, ter configurado ato manifestamente inválido, tanto que não foi referendado pela própria Diretoria Colegiada, que o manteve como substância psicotrópica. Percebe-se que os fatos ocorreram em 2005, quando superada qualquer controvérsia sobre o tema. Ademais, esta Corte firmou entendimento de que o “cloreto de etila“, vulgarmente conhecido como “lança-perfume“, continua sendo substância proibida pela Lei de Tóxicos. 2.O exame de negativa de participação em tráfico de entorpecentes é questão que, para ser analisada, necessita de aprofundada análise do conjunto probatório. O trancamento da ação penal em sede de habeas corpus é medida excepcional, somente admitida quando constatada, prima facie, a atipicidade da conduta ou a negativa de autoria. 3. Inobstante haja previsão legal de proibição da concessão de liberdade provisória no caso de cometimento dos crimes hediondos, se faz necessária a análise in concreto, de acordo com os requisitos do art. 312 da Lei Processual Penal. In casu, ausentes os motivos ensejadores da custódia cautelar. 4. Ordem parcialmente concedida para que o paciente possa aguardar em liberdade o julgamento da ação penal, sem prejuízo de eventual custódia cautelar, por fatos supervenientes.“ (RHC 17938/SC, 6ª Turma, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJU de 07/11/2005). “CRIMINAL. RESP. “CLORETO DE ETILA“. SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. RESOLUÇÃO RDC 104. ATO NULO. INOCORRÊNCIA DE ABOLITIO CRIMINIS . RECURSO DESPROVIDO. O “cloreto de etila“, vulgarmente conhecido como “lança-perfume“, continua sendo substância proibida pela Lei de Tóxicos. Ressalva de que a resolução RDC 104, de 06/12/2000 configurou a prática de ato regulamentar manifestamente inválido, tanto que não foi referendado pela própria Diretoria Colegiada, que manteve o cloreto de etila como substância psicotrópica. A posse de cloreto de etila, vulgarmente conhecido art. 16, da Lei n.º 6.368/76. Recurso desprovido.“ (REsp 601937/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 02/08/2004). Outrossim, forçoso asseverar que o argumento do recorrente - no sentido de que as Convenções Internacionais incorporadas ao ordenamento nacional pelos Decretos nº 54.216/64 e 79.388/77 não admitem a proibição do “cloreto de etila“ - está equivocado. A uma, porque, no âmbito interno, tratando-se de norma penal em branco de complementação heteróloga, a lei confere ao ato administrativo emitido pelo ente estatal legitimidade para definir o que seja substância entorpecente ou psicotrópica. A duas, uma vez que as Convenções Internacionais não proíbem - nem o poderiam - o combate a outras substâncias que não estejam nelas expressamente previstas. Cuidam as referidas convenções de um conteúdo mínimo que será alvo de cooperação na fiscalização pelos Estados celebrantes. Ou seja, nada impede que, na órbita interna, em que prevalece a soberania da República Federativa do Brasil, substância tal ou qual tenha o seu consumo irregular ou comércio clandestino proibidos. É irrelevante, nesse particular, que a mesma substância seja de produção e comercialização permitidos em outro país. Destarte, inexistindo na hipótese o alegado conflito de normas, não há que se falar em prevalência das Convenções Internacionais, seja em razão do critério da hierarquia, seja por outro motivo. Por outro lado, quanto ao segundo tópico, a irresignação, a meu ver, merece ser acolhida. Com efeito, não mais subsiste o questionamento acerca da obrigatoriedade de os condenados pela prática de crimes hediondos ou a eles equiparados cumprirem a pena privativa de liberdade integralmente no regime fechado. Ocorre que, em 23/02/2006, o Plenário do Pretório Excelso finalizou o julgamento do HC nº 82.959/SP, proferindo decisão no sentido de, por maioria, declarar a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, para afastar o óbice previsto no mencionado dispositivo, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão. Confira-se, a respeito, o constante do Informativo nº 417 do STF, verbis: “Em conclusão de julgamento, o Tribunal, por maioria, deferiu pedido de habeas corpus e declarou, incidenter tantum , a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos crimes hediondos definidos no art. 1º do mesmo diploma legal - v. Informativos 315, 334 e 372. Inicialmente, o Tribunal resolveu restringir a análise da matéria à progressão de regime, tendo em conta o pedido formulado. Quanto a esse ponto, entendeu-se que a vedação de progressão de regime prevista na norma impugnada afronta o direito à individualização da pena (CF, art. 5º, LXVI), já que, ao não permitir que se considerem as particularidades de cada pessoa, a sua capacidade de reintegração social e os esforços aplicados com vistas à ressocialização, acaba tornando inócua a garantia constitucional. Ressaltou-se, também, que o dispositivo impugnado apresenta incoerência, porquanto impede a progressividade, mas admite o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena (Lei 8.072/90, art. 5º). Considerou-se, ademais, ter havido derrogação tácita do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 pela Lei 9.455/97, que dispõe sobre os crimes de tortura, haja vista ser norma mais benéfica, já que permite, pelo § 7º do seu art. 1º, a progressividade do regime de cumprimento da pena. Vencidos os Ministros Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de Mello e Nelson Jobim, que indeferiam a ordem, mantendo a orientação até então fixada pela Corte no sentido da constitucionalidade da norma atacada. O Tribunal, por unanimidade, explicitou que a declaração incidental de inconstitucionalidade do preceito legal em questão não gerará conseqüências jurídicas com relação às penas já extintas nesta data, já que a decisão plenária envolve, unicamente, o afastamento do óbice representado pela norma ora declarada inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão. HC 82959/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 23.02.2006. (HC-82959) “. Tem-se que, em virtude da superveniência do entendimento firmado pelo STF, no julgamento citado, não mais subsiste razão para impedir a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. Vale mencionar que o Pretório Excelso, antes mesmo de concluir o julgamento do HC 82.959/SP, já admitiu, por algumas vezes, a aplicação do art. 44 do CP aos condenados por crimes hediondos ou equiparados. Confira-se, a propósito o seguinte precedente: “EMENTA: SENTENÇA PENAL. Condenação. Tráfico de entorpecente . Crime hediondo. Pena privativa de liberdade. Substituição por restritiva de direitos. Admissibilidade . Previsão legal de cumprimento em regime integralmente fechado. Irrelevância. Distinção entre aplicação e cumprimento de pena. HC deferido para restabelecimento da sentença de primeiro grau. Interpretação dos arts. 12 e 44 do CP, e das Leis nos 6.368/76, 8.072/90 e 9.714/98. Precedentes. A previsão legal de regime integralmente fechado, em caso de crime hediondo, para cumprimento de pena privativa de liberdade, não impede seja esta substituída por restritiva de direitos .“ (HC 84928/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, DJU de 11/11/2005). Nesta mesma linha, a 6ª Turma desta Corte: “PENAL E PROCESSUAL. ENTORPECENTES. TRÁFICO. AFASTAMENTO DA MAJORANTE DA ASSOCIAÇÃO EVENTUAL. ART. 18, INCISO III, LEI 6.368/76. IMPOSSIBILIDADE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. POSSIBILIDADE APENAS PARA O TERCEIRO PACIENTE, QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 44 DO CP. CRIME HEDIONDO. PROGRESSÃO DE REGIME. PERMISSÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DA VEDAÇÃO LEGAL. ORDEM CONCEDIDA. O habeas corpus é ação constitucional destinada a proteger o direito deambulatório do cidadão, quando experimenta ameaça ou efetiva coação ilegal ou por abuso de poder. Marcado por cognição sumária e rito célere, não comporta o exame de questões que, para seu deslinde, demandem aprofundado exame do conjunto fático-probatório dos autos, posto que tal proceder é peculiar ao processo de conhecimento. Alegações tendentes à declaração de afastamento da majorante da associação eventual desborda da via eleita, porque exige aprofundado exame de fatos e provas. É aplicável o art. 44 do Código Penal aos crimes hediondos e equiparados, visto que não há impedimento legal, nem incompatibilidade com a Lei 8.072/90 no tocante ao cumprimento do regime integralmente fechado; não obstante, apenas se preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal. A vedação à execução progressiva da pena, nos moldes no que dispõe a Lei 8.072/90, é discriminatória e, por isso, violadora dos princípios constitucionais da legalidade, da individualização, da isonomia e da humanidade da pena. Ordem CONCEDIDA tão somente para substituir a pena privativa de liberdade do paciente RICARDO DE MEDEIROS GACCIONE e afastar a proibição quanto à progressão de regime dos outros pacientes.“ (HC 41939/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Paulo Medina, DJU de 06/09/2005). “Política criminal. Pena de prisão (limitação aos casos de reconhecida necessidade). Tráfico de entorpecentes. Substituição da pena (possibilidade). Art. 44 do Cód. Penal. 1. A norma penal prevê a possibilidade de se aplicarem sanções outras que não a pena privativa de liberdade para crimes de pequena e média gravidade, como meio eficaz de combater a crescente ação criminógena do cárcere. 2. A disciplina da Lei nº 8.072/90 e o disposto no Cód. Penal (art. 44) não são incompatíveis . 3. Em se tratando de delinqüente sem periculosidade, não há falar em óbice à substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. 4. Recurso especial improvido.“ (Resp 754630/BA, 6ª Turma, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJU de 21/11/2005). Diante dessas considerações e ressalvado o entendimento pessoal deste relator, dou parcial provimento ao recurso especial para determinar que o e. Tribunal a quo analise, à luz dos requisitos do art. 44 do Código Penal, a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. É o voto.

 
EMENTA -
PENAL. RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 12 DA LEI Nº 6.368/76 (ANTIGA LEI DE TÓXICOS). “CLORETO DE ETILA“. SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. NORMA PENAL EM BRANCO DE COMPLEMENTAÇÃO HETERÓLOGA. CONVENÇÕES INTERNACIONAIS. VALIDADE DA PORTARIA Nº 344/98-SVS/MS. INEXISTÊNCIA DE CONFLITO DE NORMAS. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI Nº 8.072/90 DECLARADA PELO STF. I - O cloreto de etila é substância entorpecente de porte para uso próprio e comércio clandestino proibidos pela Lei de Tóxicos. (Precedentes). II - As Convenções Internacionais incorporadas ao ordenamento nacional pelos Decretos nº 54.216/64 e 79.388/77 não proíbem o combate a outras substâncias que não estejam nelas expressamente previstas, restringindo-se a estabelecer um conteúdo mínimo que será alvo de cooperação na fiscalização pelos Estados celebrantes. III - Assim, nada impede que, na órbita interna, em que prevalece a soberania da República Federativa do Brasil, o cloreto de etila tenha o seu consumo irregular ou comércio clandestino proibidos, sendo irrelevante que a mesma substância seja de produção e comercialização permitidos em outro país. IV - O Pretório Excelso, nos termos da decisão Plenária proferida por ocasião do julgamento do HC 82.959/SP, concluiu que o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, é inconstitucional. V - Tendo em vista o entendimento acima, não mais subsiste razão para que não se aplique aos condenados por crimes hediondos ou a ele equiparados, a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, desde que preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal. Recurso especial parcialmente provido.

 
ACÓRDÃO -
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp. Brasília, 15 de março de 2007. (Data do Julgamento).

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