Pedido de vista da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha interrompeu o julgamento de Habeas Corpus (HC 95058) em que um advogado pede o arquivamento de ação penal que responde na 1ª Vara Criminal de São Mateus, no Espírito Santo. O advogado é acusado de estelionato, por ter cobrado honorário advocatícios de um cliente beneficiado por assistência jurídica gratuita, e por celebrar acordo tido por fraudulento. O relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, votou pela concessão da ordem, entendendo que não houve nenhuma ilegalidade.
De acordo com os autos, após o falecimento do pai em um acidente de trabalho, dois filhos menores constituíram advogado para ajuizar ação de indenização contra a empresa na qual o pai trabalhava. Neste momento, o advogado teria assinado contrato de risco com os menores, conforme revelou a defesa do advogado – prevendo que no caso de sucesso na ação, o advogado teria seus honorários pagos.
Quando o advogado entrou com a ação em juízo, foi feito pedido de assistência judicial gratuita, por conta da hipossuficiência dos menores. O juiz concedeu o benefício, nomeando o advogado como defensor dativo. A seguir, já com a ação em curso, a defesa conseguiu um acordo com a empresa – tido como fraudulento pelo Ministério Público – para pagamento da indenização. O juiz cível homologou este acordo. Com isso, os autores da ação indenizatória receberam cerca de R$ 33 mil, e pagaram os honorários de seu advogado – cerca de R$ 6 mil.
Para o Ministério Público, como estavam cobertos pela assistência jurídica gratuita, os autores da ação não poderiam pagar os honorários do advogado dativo. E o acordo conduzido pelo advogado teria sido fraudulento. Assim, o MP denunciou o advogado pela prática de dois crimes de estelionato (artigo 171 do Código Penal).
Relator
Em seu voto, o relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski votou pelo arquivamento da ação penal. O ministro ressaltou que o juiz cível homologou o acordo, reputando o ato válido e isento de nulidade. O ministro salientou ainda que os autores da ação indenizatória não teriam sofrido prejuízo, e que com o sucesso da ação, os honorários eram devidos e foram pagos regularmente. Neste sentido o relator citou a Súmula 450, do STF, que diz que “são devidos honorários de advogado sempre que vencedor o beneficiário de justiça gratuita”.
Lewandowski lembrou, ainda, que para caracterizar o crime de estelionato é indispensável a presença de fraude e de induzimento da vitima a erro, o que não teria havido no caso.
Assim, com base na jurisprudência do STF, no sentido de que o trancamento de ação penal só é possível, por meio de HC, quando for flagrante - sem necessidade de exame de provas - a atipicidade da conduta, a extinção da pretensão punitiva ou falta total de indícios e materialidade, o relator votou pelo arquivamento do processo contra o advogado. O ministro Dias Toffoli acompanhou o relator.
Divergência
O ministro Marco Aurélio divergiu do relator e votou pelo indeferimento o HC. O decano da Turma expôs o entendimento de que, no caso concreto, os honorários não seriam devidos, e que seria cedo para se chegar ao trancamento da ação penal, “fulminando a persecução”. O ministro concluiu que é preciso deixar que o MP comprove o que alegou na decisão.
A ministra Cármen Lúcia pediu vista e interrompeu o julgamento.