Em julgamento realizado na sessão desta terça-feira (18), a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade de votos, julgou improcedente a Ação Penal (AP) 1018, apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o senador Renan Calheiros (MDB/AL), acusado de utilizar verbas parlamentares para pagar gastos particulares. Os ministros Edson Fachin (relator), Celso de Mello (revisor) e Ricardo Lewandowski absolveram o parlamentar por ausência de provas, enquanto o ministro Gilmar Mendes votou pela absolvição por atipicidade da conduta.
De acordo com a acusação, entre janeiro e julho de 2005, o senador teria desviado em proveito próprio e alheio recursos da verba parlamentar indenizatória, cuja finalidade é unicamente a de custear despesas no exercício do mandato. Para ser ressarcido, o parlamentar apresentou ao Senado Federal notas fiscais da empresa Costa Dourada Veículos Ltda., locadora de automóveis de Maceió (AL), em valores de R$ 6,4 mil pagos em espécie, e cujos serviços não teriam sido prestados. Tal fato, no entender do MPF, configura o delito de peculato, previsto no artigo 312 do Código Penal (CP).
O senador foi denunciado pelos crimes de peculato, falsidade ideológica (artigo 299 do CP) e uso de documento falso (artigo 304 do CP). Em dezembro de 2016, ao julgar o Inquérito (INQ) 2593, o Plenário do STF recebeu a denúncia apenas pelo delito de peculato.
Defesa
No julgamento desta terça-feira, o advogado de defesa lembrou que Renan Calheiros teve a vida devassada por conta desse processo, em que se divulgou que ele estaria usando verba parlamentar para pagar pensão para a filha que teve com a jornalista Mônica Veloso. O defensor revelou que, no início das investigações, a acusação feita pelo Ministério Público chegou a dizer que a empresa não existia ou que sequer teria carros, fatos posteriormente desmentidos pela defesa. Só então, segundo o advogado, o MPF alterou a acusação para dizer que o serviço não teria sido prestado, o que também não foi comprovado.
O advogado ressaltou que juntou aos autos cópia do livro-caixa da Costa Dourada, comprovando a entrada dos valores na empresa, e que, de acordo com um perito ouvido em juízo, não se poderia atestar se houve ou não a prestação dos serviços. Ele lembrou que depoimentos dos funcionários do gabinete do senador em Maceió revelaram que eles usavam os carros locados na empresa para realizar seu trabalho. Apontou ainda que o fato de os pagamentos terem sido feitos em espécie não caracteriza qualquer delito. Segundo ele, não se pode criminalizar transações feitas em dinheiro, principalmente em se tratando de valores razoáveis.
Ausência de provas
Em seu voto, o relator, ministro Edson Fachin, salientou que o conjunto de indícios apresentados pelo MPF na denúncia não se transformou em provas durante a ação penal. Fachin explicou que o cenário fático apresentado pela acusação questiona se teria havido a efetiva locação de veículos, pelos quais o parlamentar foi comprovadamente ressarcido. Contudo, frisou que o perito ouvido durante a instrução processual disse que, do ponto de vista contábil, não era possível atestar que os serviços contratados foram realmente prestados.
“O conjunto probatório tem, sim, indícios que não se transformarem em prova capaz de gerar o pretendido édito condenatório”, disse Fachin. Nesse ponto, lembrou que a Constituição Federal prevê o princípio da não culpabilidade e ressaltou que cabe ao Ministério Público comprovar, na ação penal, a ocorrência de todas as características do tipo penal. Se assim não acontecer, prevalece em favor do denunciado a dúvida e, diante da ausência de prova, a absolvição. Assim, o relator votou pela improcedência da denúncia por ausência de provas, com base no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (CPP).
Revisor da AP 1018, o ministro Celso de Mello concordou com o relator. Para o decano, o MPF não se desincumbiu de sua obrigação de juntar provas que permitissem um juízo de condenação. Ao também votar pela absolvição do senador por ausência de provas, o presidente da Turma, ministro Ricardo Lewandowski, ressaltou que os fatos são típicos, mas o MPF não conseguiu provar os fatos adequadamente.
Atipicidade
Ao também acompanhar o relator pela improcedência da ação, o ministro Gilmar Mendes divergiu quanto ao fundamento, por entender que o senador agiu dentro da legalidade e provou que não houve crime algum, e que o MPF imputou ao parlamentar uma conduta atípica. Por isso, Mendes adotou como fundamento da absolvição o artigo 386, inciso III, do CPP.
Leia a íntegra do voto do ministro Celso de Mello (revisor).
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