Em decisão unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou nesta terça-feira (10) que a regra da continuidade delitiva (mais benéfica) deve ser aplicada a um condenado a 12 anos de reclusão pelos crimes de atentado violento ao pudor e estupro. Com a decisão da Turma, o condenado deverá obter uma pena menor, a ser definida pelo juiz de execuções da causa.
Os ministros aplicaram ao processo nova regra da Lei 12.015, que, em 2009, unificou em um mesmo dispositivo penal os crimes de atentado violento ao pudor e estupro.
Até julho de 2009, esses delitos estavam enunciados em dispositivos penais diferentes: os artigos 213 e 214 do Código Penal (CP). Com a Lei 12.015, de agosto de 2009, restou somente o artigo 213 do CP, que fixa pena de reclusão de seis a dez anos para quem for condenado por “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”.
Antes da nova lei, a doutrina e a jurisprudência do Supremo não admitia a aplicação da continuidade delitiva entre o crime de estupro e atentado violento ao pudor por considerar que eles constituíam crimes de espécies diversas. No caso, era aplicado o concurso material, quando as penas de todos os crimes são calculadas cumulativamente.
“Agora, realmente, com essa alteração legislativa, há que se operar, na verdade, uma substancial transformação da própria jurisprudência da Corte”, ressaltou hoje o ministro Celso de Mello, decano do Supremo.
O ministro Joaquim Barbosa, relator do processo, havia negado o pedido de liminar ao considerar que, para conceder o pedido, seria necessário o reexame de fatos e provas, o que não é permitido por meio de Habeas Corpus (HC 96818), o tipo de processo apresentado pela defesa do condenado, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
Barbosa lembrou ainda que a matéria objeto do habeas não chegou a ser analisada pelas instâncias judiciais anteriores ao Supremo, outro óbice para a concessão de habeas corpus. Mas, nesta tarde, ele defendeu a concessão do pedido de ofício (quando o pedido é concedido por iniciativa do próprio tribunal).
Disse ele: “Nada impede a concessão de habeas corpus de ofício para conferir ao juízo da execução a incumbência de enquadrar o caso ao novo cenário jurídico trazido pela Lei 12.015, devendo, para tanto, proceder à nova dosimetria da pena fixada, afastando o concurso material entre os ilícitos penais pelos quais o paciente foi condenado, e aplicando a regra do crime continuado”.
O ministro acrescentou que, diante da nova lei, tem-se espaço para aplicar o direito constitucional à retroatividade da lei penal mais benéfica e, assim, admitir-se a continuidade delitiva no caso. Ele destacou que, tanto a sentença condenatória quanto a decisão colegiada do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que confirmou a sentença contra o condenado “evidenciam que os fatos atribuídos ao paciente [ao condenado] foram praticados nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução”.
Além de Joaquim Barbosa e Celso Mello, participou do julgamento o presidente da Turma, ministro Gilmar Mendes.