A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou decisão do ministro Joaquim Barbosa que determinou ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) que reexamine a denúncia oferecida pelo Ministério Público estadual contra o juiz de Direito W.S.P., com base em prova que aponta a prática, em tese, dos crimes de prevaricação, advocacia administrativa e favorecimento pessoal, pelo envolvimento com delegado de polícia que vinha sendo alvo de interceptação telefônica.
Os ministros da Segunda Turma rejeitaram agravo regimental apresentado pelo magistrado no Agravo de Instrumento (AI) 626214. Com isso, foi confirmada decisão individual do relator que, dando provimento a este agravo, acolheu o recurso extraordinário do Ministério Público e declarou legítimo o uso de prova obtida casualmente em interceptação telefônica judicialmente autorizada. O TJ-MG havia rejeitado a denúncia contra o juiz sob a alegação de ilegitimidade da prova, com base na Lei de Interceptação de Comunicações Telefônicas (Lei nº 9296/96), já que os crimes imputados ao juiz são punidos com detenção.
“O acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais rejeitou a denúncia lastreada em provas de interceptação telefônica licitamente conduzida, considerando ilegítimo seu uso na comprovação de crimes apenados com detenção, diante de expressa vedação legal. Porém, este entendimento afrontou o teor do art. 5º, XII e LVI, da CF, por conferir-lhes interpretação excessivamente extensiva, incompatível com a que já lhes foi dada por este Supremo Tribunal Federal, guardião maior da Constituição”, disse o ministro Joaquim Barbosa.
A Lei de Interceptação de Comunicações Telefônicas (Lei nº 9296/96), que regulamentou a parte final do inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, estabelece em artigo 2º, inciso III, que “não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção”. A lei foi invocada pelo juiz denunciado no STF, que alegou ainda a existência de precedentes da Corte contrários à possibilidade de utilização de prova obtida fortuitamente no caso de o crime descoberto ser punido com detenção. O juiz também alegou que o crime objeto da interceptação não guardaria qualquer nexo com o crime que veio a ser fortuitamente descoberto.
O ministro Joaquim Barbosa esclareceu que no precedente invocado pelo magistrado, o ministro Nelson Jobim assentou seu entendimento no sentido de ser “plenamente constitucional a utilização de material de interceptação telefônica para embasar a denúncia dos crimes apenados com pena de reclusão e os crimes que, embora sejam punidos com detenção, sejam conexos àqueles”.
“Também em meu voto destaquei que a interceptação no caso dos presentes autos foi decretada para que se investigassem crimes apenados com reclusão, tendo sido constatada incidentalmente a ocorrência de outros delitos, estes punidos com detenção. O exame desta questão também deve ser feito à luz do princípio da razoabilidade. No caso em exame não era possível, a princípio, ter certeza sobre a eventual descoberta de crimes apenados com detenção no decorrer das investigações. Assim, embora não decretada para este fim específico, a interceptação serve como prova dos crimes punidos com detenção em vista da licitude da medida”, concluiu o ministro.
De acordo com o Ministério Público estadual, a Justiça autorizou a interceptação das ligações telefônicas feitas por um delegado de polícia que estaria envolvido em vários delitos. No curso da diligência, constatou-se que o juiz de Direito estaria praticando “atos tendentes a subtrair o policial civil à ação da justiça”, razão pela qual lhe foram imputados os crimes de prevaricação, advocacia administrativa e favorecimento pessoal, considerados conexos aos crimes do delegado alvo da investigação.