Por unanimidade de votos, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento ao Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 137368, no qual a defesa do ex-deputado estadual paranaense Luiz Fernando Ribas Carli Filho pedia que fosse reconhecida a nulidade da denúncia ou, pelo menos, da sentença de pronúncia que o submeteu a julgamento pelo Tribunal do Júri sob acusação de duplo homicídio doloso. Na madrugada de 7 de maio de 2009, Carli provocou um acidente de trânsito que resultou na morte de dois jovens, em Curitiba (PR).
Embora haja outros elementos de prova que demonstrem a embriaguez de Carli Filho no momento do acidente, a Justiça do Paraná determinou a exclusão do exame de alcoolemia dos autos, por considerar que a coleta de tecido sanguíneo enquanto ele estava em coma, e a subsequente realização da perícia, mesmo autorizada judicialmente, ofendem o direito à intimidade e o direito a não produzir prova contra si mesmo. No STF, a defesa alegou que o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) determinou que fossem apenas riscadas dos autos as referências à prova ilícita, quando deveriam ser excluídas
A defesa sustentou que a circunstância fará com que os jurados despertem a curiosidade para o fato, ao passo em que deveriam ignorá-lo. Mas, para o relator do recurso, ministro Gilmar Mendes, a alegação da defesa de Carli Filho não procede. O relator afirmou que, a despeito de o exame de alcoolemia ter sido considerado prova ilícita, há um conjunto de fatos notórios – como depoimento de socorristas, testemunhas e do próprio Carli Filho – de que ele estava embriagado no momento do acidente. Para o ministro Gilmar, esse conjunto de fatos é insuscetível de eliminação.
Em seu voto, o ministro explicou que o acerto ou o desacerto da decisão que determinou a exclusão do exame de alcoolemia do processo não está em análise nesta impetração. O que se discute, segundo o relator, são as consequências dessa exclusão. Para a defesa, as peças processuais que fazem referência ao exame são, elas mesmas, ilícitas, e devem ser desentranhadas dos autos.
“Tenho que não procede o argumento de que todas as peças do processo que fazem alguma referência ao exame de alcoolemia devem ser desentranhadas e substituídas. A denúncia, a pronúncia, o acórdão [do recurso em sentido estrito] e as demais peças judiciais não são provas do crime, pelo que, em princípio, estão fora da regra constitucional da exclusão das provas obtidas por meios ilícitos (artigo 5º, inciso LVI). A legislação, ao tratar das provas ilícitas e derivadas, tampouco determina a exclusão de peças processuais que a elas façam referência (artigo 157 do Código de Processo Penal). O TJ-PR já acolheu interpretação teleológica favorável à defesa, ao determinar que as referências ao resultado do exame fossem riscadas das peças processuais. O que se quer na presente impetração é algo mais: impedir que os jurados tenham conhecimento da própria realização da prova ilícita e dos debates processuais que levaram à sua exclusão”, ressaltou o ministro Gilmar Mendes.
O relator acrescentou que a legislação processual aponta em sentido contrário, ou seja, em favor da liberdade de debate no Júri. As limitações ao debate em plenário, segundo lembrou, estão mencionadas nos artigos 478 e 479 do Código de Processo Penal, e são pontuais. Durante os debates, as partes não podem fazer referências à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado.
Também não pode ser objeto do debate o silêncio do acusado ou a ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo. O artigo 479 dispõe que durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de três dias úteis, dando-se ciência à outra parte.
Não conhecimento
O pedido de mérito relativo à suspensão do julgamento pelo Tribunal do Júri até a preclusão da sentença de pronúncia, ou seja, até que não haja mais possibilidade de recurso contra a medida, não foi conhecido pelo relator. O ministro Gilmar Mendes lembrou que essa questão foi dirigida ao Plenário do STF, por meio do Habeas Corpus (HC) 132512, por isso não comporta conhecimento em razão da litispendência (existência simultânea de duas ou mais demandas, provocando litígio a propósito da mesma relação jurídica).
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