Pedido de vista do ministro Luiz Fux adiou o julgamento, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), do Habeas Corpus (HC) 101798, impetrado em favor de J.R.G.F. e R.F.B. Eles foram denunciados pela prática do crime de lavagem de dinheiro (artigo 1º, incisos V e VII, da Lei 9.613/98).
Segundo o HC, com o recebimento da denúncia, uma ação penal contra eles está em curso na 6ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro. A defesa solicita ao Supremo o encerramento desta ação penal por falta de justa causa.
Consta da ação que os advogados impetraram habeas perante o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, alegando inépcia da denúncia e falta de justa causa para a ação penal, sob o argumento da impossibilidade de configuração do necessário crime antecedente do delito de lavagem de dinheiro.
O Tribunal Regional, conforme os autos, indeferiu a ordem porque a denúncia oferecida pelo Ministério Público “contém narrativa relacionada à existência de quadrilha organizada para o cometimento de delitos”. Além disso, o TRF-2 entendeu que essa organização criminosa está ligada à prática de crime de lavagem de dinheiro, tendo em vista que os denunciados retificaram declarações de rendimentos “exatamente para lavarem dinheiro decorrente de atividades de associação criminosa”.
Outra conclusão daquele tribunal teria sido a de que “a finalidade da lavagem de dinheiro é exatamente obter da Receita Federal a legitimação dos capitais amealhados, ainda que mediante artifício, sendo que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF informou operação atípica em relação ao nome da segunda paciente”. Por fim, o Tribunal Regional Federal entendeu que não é apenas aquele que pratica o crime antecedente que pode ser autor de lavagem de dinheiro, “mas também com ele respondem todos aqueles que, de alguma forma, concorrem para a conduta de dissimulação, emprestando nomes”.
Com os mesmos motivos, a defesa apresentou habeas ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) no qual a relatora indeferiu o pedido de liminar, por entender que o caso demandaria aprofundamento no exame do mérito. Contra essa decisão, foi impetrado o presente HC no Supremo. Nele, os impetrantes reiteram as teses sustentadas nas instâncias anteriores, solicitando o trancamento da ação penal por falta de justa causa.
Voto do relator
Para o relator do processo, ministro Marco Aurélio, os fundamentos do ato questionado servem para qualquer situação jurídica. “Na decisão, não se contém uma única linha a revelar o exame das peculiaridades do caso”, observou.
O crime previsto no artigo 1º da Lei 9.613/98 [lavagem de dinheiro], de acordo com o ministro Marco Aurélio, “pressupõe recursos decorrentes dos tipos constantes dos incisos”. Segundo ele, “sem o crime antecedente, enquadrável em um dos incisos do citado artigo, não cabe versar lavagem de dinheiro e tê-lo como configurado”.
Inicialmente, o relator excluiu a possibilidade de se cogitar que o tipo seja rotulado como “organização criminosa”. Isto porque, explicou, até o momento esse crime não foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro.
“Resta saber se a movimentação enquadrável no artigo 1º da Lei 9.613/98 decorreu de conduta tida como crime no sistema financeiro. Da leitura da denúncia, depreende-se que assim não ocorreu”, salientou o ministro. Conforme ele, o Ministério Público Federal (MPF) explicitou que os acusados requereram a retificação da declaração do imposto de renda com o objetivo de “dar contornos de legalidade a certo valor, depósito de R$ 500 mil”. A quantia seria fruto do jogo ilegal, de bingo, de jogo do bicho e de caça-níqueis.
“Ora, a prática do jogo ilegal não está prevista em qualquer dos incisos do artigo 1º da Lei 9.613/98”, analisou o relator. O ministro Marco Aurélio votou pela concessão da ordem para assentar que, no caso, inexiste justa causa para a persecução criminal.