É necessária a comprovação de dolo do agente – ao menos de dolo genérico – para caracterizar improbidade administrativa por violação dos princípios da administração pública. O entendimento foi manifestado pela Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao dar provimento a recurso especial do ex-prefeito Celso Tozzi, de Andirá (PR).
A questão teve início com ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Paraná, com vistas a condenar o então prefeito por ato de improbidade administrativa, caracterizado pelo recebimento de verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) sem, contudo, abrir contas específicas para movimentar tais valores. Essa atitude teria ofendido o artigo 3º da Lei nº 9.424/96.
Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente, tendo o juiz reconhecido a prática de ato de improbidade pelo ex-prefeito, nos termos do artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA).
O ex-prefeito apelou, mas o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR) negou provimento à apelação. “Mesmo sendo inexistente o dano patrimonial ao erário, deve ser admitida a prática de ato de improbidade administrativa, mormente quando tal ato infrinja direitos de natureza não patrimonial, como a legalidade e a moralidade, seja por ato doloso ou culposo”, afirmou o TJPR.
Para o tribunal estadual, o ex-prefeito não agiu com dolo no caso, mas com culpa. Os desembargadores consideraram que a ocorrência de dolo é irrelevante – “porque a culpa também serve para validar a prática de ato ímprobo que contrarie os princípios da administração pública” – e que também seria irrelevante a demonstração de dano patrimonial.
No recurso especial dirigido ao STJ, a defesa de Celso Tozzi alegou ofensa ao artigo 11 da LIA. Segundo argumentou, é necessária a comprovação de dolo do agente administrativo ou mesmo a ocorrência de dano para a caracterização de improbidade administrativa por violação dos princípios norteadores da administração.
O recurso especial foi provido. “As infrações tratadas nos artigos 9º e 10 da Lei 8.429/92, além de dependerem da comprovação de dolo ou culpa por parte do agente supostamente ímprobo, podem exigir, conforme as circunstâncias do caso, a prova de lesão ou prejuízo ao erário”, afirmou, ao votar, o ministro Castro Meira, relator do caso. Esses artigos tratam dos atos de improbidade que causam enriquecimento ilícito e prejuízo ao erário.
Já com relação ao artigo 11 da LIA (relativo aos atos que atentam contra os princípios da administração), o ministro observou que a Segunda Turma do STJ adotava a tese de que não seria relevante saber se o gestor público agiu com dolo ou culpa, ou se houve prejuízo material ao erário ou enriquecimento ilícito. Esse entendimento, porém, foi alterado.
No julgamento do recurso especial 765.212, cujo relator foi o ministro Herman Benjamin, a Turma considerou que, para efeito do artigo 11, há, sim, necessidade de estar configurado na conduta do agente pelo menos o dolo genérico, ou seja, a vontade manifesta de praticar ato contrário aos princípios da administração.
Como o TJPR considerou que o ex-prefeito agiu com culpa, o relator votou pelo provimento do recurso, no que foi acompanhado pela maioria dos ministros da Segunda Turma. “Não há falar em tipicidade da conduta do recorrente, já que não foi comprovado ao menos o dolo genérico”, concluiu Castro Meira.
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