O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a abertura de inquéritos contra o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) e o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. A investigação foi aberta a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para apurar o envolvimento das autoridades em possível crime eleitoral de falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Ao determinar a abertura dos inquéritos, o decano da Corte destacou pontos relevantes sobre a investigação criminal.
Colaboração premiada
Quanto à utilização do instituto da colaboração premiada, o ministro Celso de Mello destacou que “o Supremo Tribunal Federal tem admitido a utilização do instituto da colaboração premiada, ressalvando, no entanto, bem antes do advento da Lei nº 12.850/2013 (art. 4º, parágrafo 16), que nenhuma condenação penal poderá ter por único fundamento as declarações do agente colaborador”. Ressaltou ainda, que “o legislador brasileiro procurou neutralizar, em favor de quem sofre a imputação emanada de agente colaborador, os mesmos efeitos perversos da denunciação caluniosa revelados, na experiência italiana, pelo “Caso Enzo Tortora” (na década de 80), de que resultou clamoroso erro judiciário, porque se tratava de pessoa inocente, injustamente delatada por membros de uma organização criminosa napolitana (“Nuova Camorra Organizzata”) que, a pretexto de cooperarem com a Justiça (e de, assim, obterem os benefícios legais correspondentes), falsamente incriminaram Enzo Tortora, então conhecido apresentador de programa de sucesso na RAI (“Portobello”)”.
Investigação criminal como dever e resposta do Estado
Ao tratar sobre a abertura do inquérito, o ministro Celso de Mello salientou que, “havendo suspeita de crime, e existindo elementos idôneos de informação que autorizem a investigação penal do episódio delituoso, tornar-se-á essencial proceder à ampla apuração dos fatos, satisfazendo-se, desse modo, com a legítima instauração do pertinente inquérito, a um imperativo inafastável fundado na necessidade ético-jurídica de sempre se promover a busca da verdade real”.
“As circunstâncias expostas no depoimento que venho de mencionar, que evidenciariam a suposta ocorrência de práticas delituosas perseguíveis mediante ação penal pública incondicionada, tornam indispensável, em sede de regular “informatio delicti”, o aprofundamento da investigação dos delitos noticiados (crime eleitoral de falsidade ideológica e delito de lavagem de dinheiro)”, disse o decano ao fundamentar a abertura dos inquéritos.
Presunção de inocência
O ministro Celso de Mello lembrou, contudo, que “mera instauração de inquérito, tanto quanto a abertura de processo penal em juízo, não afetam a presunção constitucional de inocência, eis que qualquer pessoa, sem exceção, presume-se inocente, independentemente da natureza e da gravidade dos crimes cuja prática lhe tenha sido imputada, subsistindo essa presunção de inocência, que tem fundamento na própria Constituição da República (CF, art. 5º, LVII), até que sobrevenha o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Regime de sigilo
Os inquéritos abertos permanecerão sob sigilo, a pedido do procurador-geral da República, entretanto, a decisão garante ser “plenamente legítima a pretensão de acesso aos autos daquele cuja suposta participação em alegada prática delituosa constitui objeto da delação manifestada ao Ministério Público e/ou à Polícia Judiciária, cabendo ao Poder Judiciário garantir-lhe a possibilidade de conhecimento das peças (inclusive das declarações do agente colaborador) a ele referentes”. O ministro destacou, ainda, que é garantido àquele que “sofre persecução penal – ainda que submetida esta ao regime de sigilo – o direito de conhecer os elementos de informação já existentes nos autos e cujo teor possa ser, eventualmente, de seu interesse, quer para efeito de exercício da autodefesa, quer para desempenho da defesa técnica”.
“É que a prova penal, uma vez regularmente introduzida no procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas integra os autos do respectivo inquérito ou processo, constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de persecução penal por parte do Estado”, ressaltou o decano do STF.
Desmembramento das investigações
Por fim, o ministro relatou que o procurador-geral da República “requer o desmembramento destes autos em relação àqueles que não detêm prerrogativa de foro ratione muneris perante o Supremo Tribunal Federal”. “Esse pleito do chefe do Ministério Público da União encontra apoio no art. 80 do CPP, que autoriza a separação do feito presente motivo relevante que torne conveniente a adoção de tal providência, como sucede nas hipóteses em que se registra pluralidade de investigados e/ou denunciados”, decidiu o ministro.
Desta forma, foi concedido o pedido do procurador-geral da República para desmembrar a investigação penal em relação a envolvidos que não dispõem de prerrogativa de foro perante o STF, para que a apuração desses crimes seja feita pela primeira instância da justiça eleitoral.
A decisão proferida pelo ministro Celso de Mello também acolheu pedido da defesa do senador Aloysio Nunes, autorizando o acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos. Por último, atendendo também pleito da PGR, o ministro autorizou a abertura de inquéritos individualizados em relação ao senador Aloysio Nunes e ao ministro Aloizio Mercadante.