Representando a Clínica de Direitos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a professora de Direito Constitucional Cristina Telles trouxe em sua apresentação na audiência pública sobre a interrupção voluntária da gravidez reflexões sobre a atuação do Legislativo, Executivo e Judiciário sobre o tema. Em exposição, enumerou 20 países onde o Judiciário analisou o mérito da descriminalização do aborto, destacou a baixa participação feminina no Legislativo brasileiro e a atuação necessária do Judiciário em temas relativos a direitos fundamentais.
Entre os países enumerados, estavam Estados Unidos, Reino Unido, França, Itália, Argentina e Portugal, Bélgica, Canadá, Espanha, México e também países menores como Costa Rica e Macedônia. “A verdade é que poucos temas poderiam ser mais aderentes ao papel de uma Suprema Corte do que a descriminalização do aborto”, afirmou. Ela citou entendimentos adotados por algumas dessas supremas cortes – como a dos EUA, em decisão de 1973, reiterada em 1992, entendendo que não cabe ao Estado impor sua visão sobre o destino da mulher, ou do judiciário alemão, para quem o nascituro pode ter outras formas de proteção do que a penal.
No caso brasileiro, afirmou haver peculiaridades que tornam a atuação do Judiciário não só legítima como necessária. "A nossa legislação penal é dos anos 1940, momento em que a mulher não era titular plena de direito em diversos aspectos." Além disso, segundo estudo do Banco Mundial, o Legislativo figura na 152º colocação em participação feminina no Congresso, atrás de países como Congo e Arábia Saudita, informou a especialista. Há, segundo ela, 10% de participação feminina no Congresso e 16% no Senado. Além disso, classificou o tema como um tabu na política brasileira: “É considerado um risco eleitoral, gera perda de votos. É por isso que é mais do que legítimo que a matéria seja tratada por uma instituição que não depende de votos”, disse.