A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta terça-feira (29), o julgamento do Inquérito (INQ) 3980, em que o Ministério Público Federal (MPF) denuncia políticos do Partido Progressista (PP) – João Pizzolatti, Mário Negromonte, Negromonte Júnior, Luiz Fernando Faria, José Otávio Germano, Roberto de Britto e Arthur Lira – por corrupção passiva e lavagem de dinheiro por supostos recebimentos de vantagem indevida decorrente da cobrança percentuais sobre os valores dos contratos firmados pela Diretoria de Abastecimento da Petrobras, entre 2006 e 2014. Na sessão de hoje, o relator do inquérito, ministro Edson Fachin, leu seu relatório, e foram feitas sustentações orais pelo órgão acusador (o MPF) e pelos advogados dos sete acusados. O julgamento será retomado na próxima terça-feira (5), com o voto do ministro Fachin.
De acordo com a denúncia, o núcleo político do PP – inicialmente encabeçado por José Janene e, com sua morte, por João Pizzolatti e Mário Negromonte, e outros deputados influentes como José Otávio Germano, Luiz Fernando Faria, Roberto de Britto e Arthur Lira –, sustentavam politicamente Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento da Petrobras, para que este garantisse que apenas empresas dispostas a pagar percentual (1%) dos contratos celebrados fossem contratadas. Aponta-se o montante estimado de R$ 357.945.680,52 que teria sido desviado em vantagens ilícitas. Do percentual de 1% desviado do valor total dos contratos fraudulentos, 60% teriam sido destinados a parlamentares do PP. Ainda de acordo com a denúncia, era Alberto Yousseff quem operacionalizava a saída do dinheiro de uma ponta (empresários) a outra (políticos), na maioria das vezes em espécie.
Para isso, ainda de acordo com a denúncia, Youssef utilizava-se de empresas inexistentes que celebravam contratos ideologicamente falsos com empresas cartelizadas – Andrade Gutierrez, Odebrecht/Braskem, Unipar, Queiroz Galvão e Jaraguá Equipamentos Industriais – para ter acesso aos valores que, em um segundo momento, eram redistribuídos aos parlamentares, descontadas a sua comissão (6%) e a de Paulo Roberto Costa (14%), calculada sobre o valor desviado. Ainda de acordo com a acusação, além dessa modalidade de repasse, e aproveitando o fato de ser ano eleitoral (2010), algumas empresas faziam doações eleitorais oficiais como forma de pagar as vantagens ilícitas devidas, emprestando à operação aparência de legalidade.
Segundo o MPF, Youssef administrava um “banco de propina” em favor de parlamentares do PP, o que viabilizava as retiradas de altos valores em espécie (em seu escritório) e também entregas nas residências oficiais dos parlamentares em Brasília ou em suas cidades de origem. De acordo com a denúncia, teriam sido feitos pagamentos por rede bancária, mas de maneira a impedir ou dificultar o rastreamento pelos órgãos de controle, na medida em que se utilizavam depósitos em dinheiro, de forma pulverizada, em contas pessoais ou titularizadas por pessoas próximas e por parentes. Seria o caso, segundo o MPF, de Negromonte Júnior nos crimes imputados a seu pai. Negromonte Júnior também é acusado de obstruir as investigações, pois teria mandado recados ameaçadores ao deputado Luiz Argolo, pela iminência de realizar acordo de colaboração premiada.
Sustentações orais
A subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio Marques defendeu a denúncia – qualificada de inepta pelos advogados dos acusados em resposta preliminar – afirmando que a peça contém todos os fatos que dizem respeito a cada um dos acusados, identificando condutas, métodos de obtenção de dinheiro e o modo como a propina era entregue. “Houve uma descrição minuciosa de tudo. A denúncia pode ter pecado por excesso de descrição do esquema, jamais por inépcia”, asseverou. A subprocuradora também rebateu argumento comum a todas as defesas – o de que a denúncia se basearia apenas nas colaborações premiadas de Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef e de executivos das empresas envolvidas. Segundo ela, há um grandioso acervo probatório – formado por provas testemunhais, quebras de sigilos, registros de entrada dos denunciados no escritório de Youssef –, sem contar que os conteúdos das colaborações são convergentes.
A defesa do ex-deputado João Pizzolatti comparou a denúncia do MPF, de mais de 280 laudas, a uma “metralhadora giratória” para transformar “indícios débeis” em prova indiciária capaz de levar a seu recebimento, num crescente processo de criminalização da política. Para a defesa, é muito estranho que nada se investigue acerca dos supostos valores recebidos pelo deputado José Janene, pois seu espólio poderia perfeitamente figurar no polo passivo da demanda. Os acordos de colaboração premiada, segundo a defesa firmados invariavelmente após longas prisões cautelares, também foram questionados. Para ela, os delatores selecionam o que lhe interessam ou não dizer, sem especificar as circunstâncias em que teriam ocorrido os supostos atos de corrupção passiva atribuídos a seu cliente.
O advogado de Mário Negromonte e de seu filho, o deputado federal Negromonte Júnior, apontou a necessidade de haver um lastro probatório mínimo a sustentar a acusação, pois é preciso haver justa causa para a instauração da ação penal. Para a defesa, o acesso aos dados bancários de Negromonte Júnior ocorreu de forma ilícita, pois ele não tinha conta conjunta com seu pai, mas sim uma conta aberta com seu CPF quando era estudante, em que seu genitor figurava como a pessoa de ligação com o banco. A defesa apresentou diversos documentos que, segundo alega, teriam sido desconsiderados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal ao elaborar a denúncia, que comprovariam a origem lícita dos depósitos feitos em sua conta corrente.
A defesa dos deputados federais Luiz Fernando Faria e José Otávio Germano afirmou que a denúncia é absolutamente inepta em relação aos dois parlamentares, dedicando apenas cinco páginas aos dois, num total de 280. Afirmou que Faria e Germano não faziam parte da “cúpula” do PP, como alega o MPF, e receberam doações eleitorais, devidamente registradas na Justiça Eleitoral, da Queiroz Galvão, não podendo tal recebimento caracterizar os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A defesa afirmou que anotações dando conta de três pagamentos por caixa-dois a um certo Otávio, não são podem ser presumidas como destinadas a Germano, e salientou que não há conjunto probatório minimamente independente, salvo a palavra de Youssef.
A defesa do deputado federal Roberto de Britto enfatizou que nas 280 laudas da denúncia, seu nome é citado apenas em três momentos: quando afirma que ele integra o PP e quando aponta que, em 2010, ele recebeu doações eleitorais da Queiroz Galvão (R$ 100 mil) e da Jaraguá Equipamentos Industriais (R$ 50 mil). Para a defesa, a acusação decorre de “acusação leviana” de Youssef, não havendo qualquer comprovação de que os deputados do PP que receberam doações de campanha sabiam que se tratava de propina.
A última sustentação foi feita em favor do deputado federal Arthur Lira. Para seu advogado, a denúncia não traz indícios mínimos de autoria, materialidade e participação. Além disso, despreza o fato de que Lira não fazia parte do grupo que nomeou e deu sustentação a Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento da Petrobras; muito pelo contrário, fazia oposição a esse grupo. Prova disso seria a exoneração de Costa quando seu grupo assumiu o comando do partido. Segundo a defesa, isso explicaria a inimizade que Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef nutrem por Arthur Lira, comprometendo sua reputação em suas colaborações premiadas.
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