Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) negou, nesta quinta-feira, o pedido de liberdade formulado no Habeas Corpus (HC) 102164 em favor de Rodrigo Gomes Quintella, preso preventivamente há um ano e três meses por ordem do juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, sob acusação de chefiar uma quadrilha dedicada ao tráfico internacional de entorpecentes.
A defesa alegava constrangimento ilegal, porquanto a ordem de prisão não estaria devidamente fundamentada nem individualizada em relação a Rodrigo e se teria baseado tão somente na gravidade do delito e em conjecturas, como a hipótese de fuga do autor para o exterior.
No HC, a defesa contestava especificamente negativa de igual pedido (um HC) pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Anteriormente, também o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) havia negado requerimento de soltura para Rodrigo responder em liberdade ao processo. Os dois tribunais consideraram bem fundamentada a ordem de prisão decretada pelo juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.
Manifestação do procurador-geral da República
Ao confirmar parecer pela denegação da ordem soltura de Rodrigo Quintella, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também citou os quatro fatos que embasaram a ordem de prisão preventiva para observar que o que pesou no mandado de prisão não foi só a gravidade do delito, mas a sua reiteração e continuidade. Segundo ele, esses fatos trazem “a certeza de que, solto, Rodrigo daria continuidade à prática delitiva”. Daí a necessidade de ele continuar preso preventivamente.
Contrapondo-se a vários precedentes do STF citados pela defesa para alegar que Rodrigo estaria cumprindo antecipadamente uma pena a que sequer ainda foi condenado, o procurador-geral da República citou os HCs 95169, 98304 e 9499, relatados, respectivamente, pelos ministros Ricardo Lewandowski, Cezar Peluso e Ellen Gracie, para justificar a manutenção da prisão preventiva.
Fundamentação
O mesmo entendimento do STJ e do TRF-2 manifestou a relatora do HC 102164, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha. Ao negar o pedido formulado no habeas, ela fez questão de mostrar que a ordem de prisão, além de enfocar a gravidade do crime, apontou também a periculosidade de Rodrigo, bem como a reiteração e a continuidade da prática criminosa. Isto porque ele seria fornecedor atacadista e varejista de entorpecentes. Entre outros, seria fornecedor estável de drogas ao controlador de uma boca de fumo no Morro do Turano, na Tijuca.
Fatos incriminadores
A ministra Cármen Lúcia citou quatro fatos concretos narrados na denúncia que embasaram a ordem de prisão. A primeira delas foi uma viagem do próprio Rodrigo Quintella à Europa – Suíça, Alemanha e Holanda –, em agosto de 2008, para exportação de droga (cocaína) do Brasil em troca de entorpecentes sintéticos.
O segundo fato foi a prisão em flagrante, em 27 de setembro de 2008, de uma pessoa procedente de Bruxelas, portando 27 mil comprimidos de ecstasy – maior apreensão dessa droga feita no aeroporto de Confins, Minas Gerais, em 2008 –, além de quantidades menores de skunk e LSD. Essa pessoa informou que quem organizou e financiou sua viagem foi Rodrigo Gomes Quintella, que seria dono da droga.
O terceiro fato foi a prisão em flagrante, em 14 de junho de 2008, em Salvador, de um portador de 54 mil comprimidos de LSD, além de quantidades menores de skunk e haxixe, que também informou estar a serviço de Rodrigo Quintella.
Por fim, o quarto fato mencionado pela ministra foi a prisão de outro portador de drogas de Rodrigo Quintella no aeroporto de Confins, que estava embarcando para Bruxelas levando dois quilos de cocaína.
Dos autos consta que, além de drogas, os 15 autos de prisão em flagrante de 36 pessoas envolvidas na quadrilha de Rodrigo, lavrados pela Polícia Federal, dão conta da apreensão também de armas de uso restrito. Isso provaria, também, o poder de intimidação da quadrilha e o risco à aplicação da lei penal, caso Rodrigo permaneça solto.
A relatora, ministra Cármen Lúcia, acrescentou diversos precedentes em que foi mantida pelo STF a prisão preventiva do réu, diante da habitualidade e reiteração da prática criminosa.
Divergência
Voto discordante, o ministro Marco Aurélio votou pela concessão do HC a Rodrigo Quintella. Ele sustentou que “não há, na lei brasileira, prisão automática em função da gravidade do delito”. Tampouco existe, segundo ele, a extensão, ao acusado, da prisão em flagrante de outros envolvidos. Isto porque, como lembrou, Rodrigo foi preso em função da prisão em flagrante de outros membros do grupo criminoso.
No entender do ministro Marco Aurélio, “as suposições e o subjetivismo no caso não servem para respaldar a ordem de prisão preventiva”. Quanto à possibilidade de ele voltar à prática delitiva depois de solto, o ministro disse não acreditar nela, pois “os holofotes estão focados para a sua pessoa”.
Uso de algemas – Súmula Vinculante 11
Após examinar o HC, o Plenário do STF julgou improcedente uma Reclamação (Rcl 7814), também ajuizada por Rodrigo Quintella, contra a parte final do mesmo decreto de prisão preventiva expedido pela 7ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro. De acordo com a defesa, o magistrado federal teria autorizado o uso de algemas, em violação à Súmula Vinculante nº 11, do STF*.
Além disso, os advogados sustentavam que o decreto não atendeu ao binômio necessidade/utilidade “que acabou por fulminar de morte o princípio e assumir contorno de um direito penal do inimigo em flagrante afronta à dignidade da pessoa humana, incompatível com o regime democrático de direito em que vivemos”. Dessa forma, a defesa pedia a cassação do decreto, por desrespeito à Súmula nº 11 e, com isso, que fosse revogada ou relaxada a prisão preventiva de Quintella.
A relatora, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, entendeu que a 7ª Vara Criminal autorizou o uso de algemas, mas não o determinou. Para a ministra, o ato questionado deixou à descrição da autoridade policial – que efetivamente haveria de cumprir a decisão tendo em vista as circunstâncias do momento da prisão – o uso de algemas.
“Sob tal aspecto nada se percebe no conteúdo da decisão de abusivo ou desrespeitoso à súmula”, afirmou a relatora, ao votar pela improcedência da Reclamação. Por fim, a ministra observou que o uso de algemas não foi abolido no exercício jurídico policial brasileiro, mas a partir da edição da Súmula nº 11 há limitação a abusos em razão de desproporcionalidade na maioria das vezes. A decisão foi unânime.
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