O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ao magistrado responsável pelo Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Especial Criminal da Comarca de Natividade (RJ) que prossiga na instrução da ação penal instaurada contra um homem acusado de agredir a companheira. A decisão, de caráter liminar, ocorreu no âmbito de Reclamação (RCL 15890) apresentada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
O homem foi denunciado pela prática da contravenção de vias de fato contra sua companheira (artigo 21 do Decreto-Lei 3.688/1941, combinado com os artigos 5º e 7º da Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha), mas durante a audiência de instrução e julgamento, a vítima disse que o tinha perdoado. Diante da retratação da mulher, o juiz julgou extinta a punibilidade do agressor, alegando falta de justa causa para a ação penal. O magistrado ainda destacou que a recente decisão do STF, no sentido de que a ação penal independe de representação da vítima e não pode ser extinta quando esta perdoa o agressor, não poderia retroagir para prejudicar o acusado.
Para reformar a decisão de primeira instância, o Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), mas este manteve o entendimento do juiz de Natividade. No acórdão do TJ-RJ, foi dito que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) se consolidou no sentido de que o crime de lesão corporal leve, ainda que aplicada a Lei Maria da Penha, exige representação da vítima, entendimento que foi alterado pelo STF. Segundo o TJ-RJ, o juiz declarou extinta a punibilidade com base no entendimento do STJ, tendo o Ministério Público recorrido com base na decisão do Supremo.
Decisão
Ao conceder a liminar na Reclamação, o ministro Lewandowski afirmou que a decisão do TJ-RJ afrontou a autoridade das decisões do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4424 e na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 19, quando a Corte assentou a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal praticado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher.
O ministro transcreveu parte do acórdão, que ainda não foi publicado, enfatizando o entendimento majoritário na Corte no sentido de que não seria razoável deixar a atuação estatal a critério da vítima porque a proteção à mulher se esvaziaria se ela pudesse, depois de procurar a política e denunciar a agressão, voltar atrás e retirar a queixa.
“O órgão ora atacado [TJ-RJ], por sua vez, seguiu a linha de orientação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidada no sentido de que o crime de leão corporal leve, ainda que aplicada a Lei 11.340/2006, exige representação da ofendida. Ignorou-se, portanto, que esse entendimento fora alterado pelo Supremo Tribunal Federal nas referidas ações de controle concentrado de constitucionalidade, cujas decisões são dotadas de efeitos vinculantes e erga omnes”, concluiu o relator.
O ministro Lewandowski suspendeu os efeitos do acórdão do TJ-RJ (Primeira Câmara Criminal) e determinou ao magistrado do Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Especial Criminal da Comarca de Natividade (RJ) que dê seguimento à ação penal, devendo, contudo, “abster-se de proferir sentença de mérito até o julgamento definitivo desta Reclamação”.
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