Mantido Interrogatório De Acusados Para O Fim Da Instrução Criminal

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram aplicar nova regra do Código de Processo Penal (CPP), modificada pela Lei 11.719/08, que alterou o momento de realização do interrogatório dos acusados para o fim da fase de instrução criminal. Por unanimidade dos votos, eles negaram provimento a um recurso (agravo regimental) interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) na Ação Penal (AP) 528.

O MPF pedia para que os interrogatórios dos dois acusados fossem ultimados antes da apresentação da defesa prévia, destacando que um dos réus teria perdido o direito de exercer o ato de autodefesa justamente por não ter comparecido a audiência previamente designada em Belém (PA), apesar de devidamente citado. Afirma que o outro sequer foi encontrado naquela localidade, apesar de diversas tentativas do oficial de Justiça.

No recurso, o MPF sustentava que os argumentos da norma especial – Lei 8.038/90, que mantém o sistema tradicional, prevalecem sobre a geral (CPP), que coloca o interrogatório do réu ao final da instrução.

A Ação Penal tem por objeto a condenação de dois acusados por suposto cometimento do crime de peculato, disposto no artigo 312, parágrafo 1º, do Código Penal. A denúncia foi recebida à unanimidade do Plenário do Supremo no dia 19 de novembro de 2009.

De acordo com o relator, ministro Ricardo Lewandowski, o Plenário do Supremo já iniciou a discussão se a mudança legislativa do CPP afeta a lei especial (Lei 8038/90), mas ainda não houve conclusão do debate. O Supremo sinalizou que o interrogatório é um instrumento de defesa do réu e, portanto, deve ser colocado ao final.

Assim, em vista da previsão da Lei 11719/08 que modificou o artigo 400 do CPP e transferiu o interrogatório para o final do processo, Lewandowski, no dia 20 de outubro de 2010, despachou na AP 528 no sentido de que os réus sejam interrogados ao final do processo, considerando a nova sistemática mais favorável à defesa. Isso porque, frisou, os interrogatórios até o momento não ocorreram tendo em vista o não comparecimento de um à audiência e uma vez que o outro não foi encontrado.

Voto

“Não se pode negar que se trata de um tema de altíssima relevância dado o reflexo que a referida inovação legal exerce sobre o direito constitucional, a ampla defesa, embora não tenha tido ainda o Supremo Tribunal Federal a oportunidade de posicionar-se definitivamente a respeito dele, nem mesmo em sede de questão de ordem”, avaliou o ministro Ricardo Lewandowski. Ele lembrou que o tema chegou a ser debatido pelos ministros na sessão plenária do dia 7 de outubro de 2010, em uma questão de ordem suscitada na AP 470, contudo, como naquela ação penal o interrogatório já havia sido realizado e a discussão prosseguiu.

Para o relator, a PGR não tem razão. “Parece-me relevante constatar que, se a nova redação do artigo 400, do CPP, possibilita ao réu exercer de modo mais eficaz a sua defesa, tal dispositivo legal deve suplantar o estatuído no artigo 7º, da Lei 8038, em homenagem aos princípios constitucionais que são aplicáveis à espécie”, afirmou.

Segundo Lewandowski, é mais benéfico à defesa possibilitar que o réu seja interrogado ao final da instrução, depois de ouvidas as testemunhas arroladas, bem como após a produção de outras provas como eventuais perícias. Nesse caso, conforme o relator, o acusado terá a oportunidade de esclarecer divergências “que não raramente afloram durante a edificação do conjunto probatório”.

Quanto à discussão sobre o aspecto formal, o ministro entendeu que o fato de a Lei 8038 ser norma especial em relação ao CPP (norma geral), “em nada influencia o que até aqui se assentou”. “É que, a meu sentir, a norma especial prevalece sobre a geral apenas nas hipóteses em que estiver presente alguma incompatibilidade manifesta insuperável entre elas, nos demais casos, considerando a sempre necessária aplicação sistemática do direito, cumpre cuidar para que essas normas aparentemente antagônicas convivam harmonicamente”, explicou Ricardo Lewandowski.

Dessa forma, o relator negou provimento ao agravo regimental interposto pelo MPF, entendendo que o interrogatório deve ocorrer no final do processo.

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