O procurador-geral da República ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), a Reclamação (RCL) 15500, com pedido de liminar, contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) que anulou processo a partir da audiência de instrução e julgamento, na qual o acusado teria permanecido algemado. A ação pede que sejam restabelecida a validade de todos os atos processuais proferidos pelo juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Viamão (RS).
Segundo a Reclamação, o TJ-RS, ao julgar apelação interposta contra sentença condenatória, teria aplicado de forma equivocada a Súmula Vinculante 11, do STF. A súmula considera lícito o uso de algemas apenas em casos de resistência, fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física do preso ou de terceiros. Seu descumprimento pode resultar em responsabilidade disciplinar, civil e penal da autoridade e na nulidade da prisão ou ato processual a que se refere.
Para anular a sentença, o TJ-RS considerou ter havido prejuízo à defesa por ampliar a possibilidade de sugestionar vítimas e testemunhas em casos de reconhecimento e por provocar abatimento físico e psicológico no acusado. O acórdão destaca que o acusado, à época réu primário e com 19 anos, foi preso em flagrante por populares, sem qualquer registro de que tenha reagido ou tentado reagir. “Nada, portanto, indica ser ele pessoa perigosa ou violenta, que represente uma ameaça à sua própria integridade física ou a dos demais presentes na solenidade”.
O procurador-geral ressalta que, ao aprovar a Súmula Vinculante 11, o STF procurava resguardar a dignidade humana e a intimidade do preso, refreando abusos relacionados ao emprego de algemas, evitando que ele fosse exposto a uma situação de execração pública ou arbitrária por parte das autoridades públicas. Segundo o autor da Reclamação, o uso de algemas era legítimo, uma vez que é “impossível desconhecer que as más condições físicas e estruturais do Fórum de Viamão constituem um fator de risco à integridade física de todos os presentes à audiência”.
Também de acordo com a ação, não se configurou, no caso, prejuízo à defesa, pois o acusado não foi julgado pelo Tribunal do Júri, mas por juízo singular, que teria apreciado o caso de modo imparcial e objetivo, sem presumir a culpabilidade do acusado. Sustenta, ainda, que as três testemunhas ouvidas na audiência de instrução são policiais militares, acostumados a lidar com situação de tensão e que “dificilmente, ficariam sugestionados a reconhecer uma pessoa como autor de determinado delito tão-somente devido ao uso de algemas”.
O procurador-geral argumenta que a decisão do TJ-RS de anular o processo a partir da audiência de instrução e julgamento demonstra descompasso com os precedentes que justificaram a edição da Súmula Vinculante 11. De acordo com ele, o uso de algemas durante a audiência somente afrontaria o enunciado do STF se impusesse ao réu “constrangimento absolutamente desnecessário, o que não ficou configurado na decisão do Juízo a quo”.
A relatora da ação é a ministra Cármen Lúcia.