Durante o 71º Curso Internacional de Criminologia, que acontece nesta quarta-feira (21) em Belém (PA), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, e o vice presidente da Corte, Cezar Peluso, defenderam mudanças nas regras para tratamento de presos no Brasil.
O curso acontece ao mesmo tempo em que também se realiza em Belém a Assembleia Geral do Comitê Permanente da América Latina para Revisão das Regras Mínimas da ONU (Organização das Nações Unidas) para Tratamento de Presos, do qual o ministro Peluso é presidente.
Na abertura do curso, o ministro Gilmar Mendes lembrou o trabalho realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio dos mutirões carcerários em todo o país com o objetivo de identificar os problemas existentes nos presídios. Ao todo, o CNJ analisou 67.336 processos em 17 estados, resultando em 20.656 benefícios, sendo 12.039 alvarás de soltura em favor de presos que já haviam cumprido sua pena.
“Se somente um homem estivesse preso injustamente, já teria valido a pena o esforço, pois além de não haver como mensurar o valor de um dia de liberdade, estar-se-ia reiterando o apreço da nação à higidez do Estado de Direito”, afirmou o ministro Gilmar Mendes.
Ele destacou ainda a necessidade de reinserção social para dar oportunidade de recuperação aos egressos do sistema penitenciário. Lembrou que ontem foi assinado com a Fifa um convênio para treinamento e ocupação de postos de trabalhos por presos que já tenham cumprido sua pena (ver matéria).
De acordo com o ministro, o Brasil precisa se adequar à exigência de atendimento a um patamar de regras mínimas para tratamento de prisioneiros. Ele destacou a situação de degradação com sujeira, agressões sexuais, abuso de autoridade que resultam em motins e violência gratuita, além dos custos elevadíssimos para a manutençao de presos, falta de assistência jurídica e o frontal e rotineiro desrespeito a lei de execução penal e à Constituição Federal.
O ministro relatou diversos flagrantes de desrespeito a direitos dos presos como pessoas inocentes há anos à espera de julgamento.
Segundo ele, apesar de o Brasil ainda estar longe de cumprir ao menos satisfatoriamente as regras mínimas para tratamento de presos, há uma boa notícia que é o trabalho desenvolvido nessas atividades do CNJ, que “começam a reverter esse quadro da ineficiência crônica do sistema quanto à capacidade do estado de sair da letargia”.
“O Judiciário não se contentará com medidas emergenciais, pois o que se busca é o correto cumprimento da lei penal com plena e efetiva reintegração à comunidade”, garantiu.
Comitê da ONU
O ministro Cezar Peluso discursou no encontro como presidente do Comitê Permanente da América Latina para Revisão das Regras Mínimas da ONU para tratamento de presos. Em sua opinião, não só o Brasil, mas todos os países precisam observar determinados padrões de punição civilizada. Peluso apresentou uma proposta para que seja celebrada uma convenção internacional para que os países se comprometam a adotar as regras, assim, “elas passam do plano de meros projetos e meras referências ao plano de implementações efetivas em cada país”.
Essa proposta do ministro deverá ser discutida no âmbito da ONU para atualizar as regras que não acompanharam a vida moderna. O ministro criticou ainda o sistema carcerário no país, que classificou como “desastroso”, uma vez que não cumpre a sua função. Lembrou que CNJ tem demonstrado isso corretamente e que só o fato de manter pessoas que já cumpriram pena ou que não têm sequer processos, já justifica o reconhecimento do fracasso do sistema carcerário brasileiro.
Outra reflexão do ministro Peluso em seu discurso é de que a criminologia deve ser estudada como uma ciência empírica e deve buscar novas propostas, bem como o direito penal deve estar pronto para se reinventar. O relatório final do trabalho deste comitê será submetido ao 12º Congresso das Nações Unidas sobre o tema que se realizará em Salvador (BA), em abril de 2010.
O ministro Peluso acredita que esse congresso será uma oportunidade ímpar para discutir o tema, pois ali estarão reunidos diversos chefes de estado e outras autoridades dos países membros da ONU. Ele citou Norberto Bobbio ao dizer que “o mais importante não é fundamentar os direitos do homem, mas protegê-los“.
“Creio que está maduro o tempo de ultrapassar do plano das recomendações acerca do tratamento de presos”, afirmou o ministro ao defender regras mínimas específicas, mas com caráter mandatório, cuja implementação seja assumida pela comunidade internacional. Após a participação no curso de criminologia, o ministro Peluso preside reuniões do Comitê que são reservadas apenas aos seus membros e acontece no Hotel Hilton, em Belém.
CM/EH
0 Responses