Stf Autoriza Extradição De Religioso Acusado De Torturar Crianças Em Israel E Na Palestina

O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, autorizar a extradição do clérigo Elior Noam Hen, também conhecido como Eliyahu Abu Hazera. Ele é acusado pelo Estado de Israel de torturar crianças na cidade palestina de Beitar Illit no ano passado em supostos rituais de purificação.

A extradição (EXT 1122) foi pedida pelo governo israelense, e o principal tema discutido no julgamento do Supremo foi a jurisdição penal do país numa área administrada atualmente pela Autoridade Nacional Palestina – que não tem acordo de reciprocidade para extradição com o Brasil nem pediu a entrega de Hen (a Justiça brasileira só admite extraditar pessoas a territórios que têm tratado com o Brasil nesse sentido).

O relator do caso, ministro Carlos Ayres Britto, entendeu que Hen pode ser entregue a Israel porque alguns dos crimes teriam sido cometidos na parte ocidental de Jerusalém e em Tiberíades, áreas sob domínio israelense. Além disso, ele acredita que Israel tem domínio exclusivo de Beitar Illit, uma vez que nos acordos de paz firmados entre os dois países essa área da Cisjordânia foi inteiramente administrada por Israel.

Ayres Britto contou que a consultoria do Ministério das Relações Exteriores concluiu em seu parecer que “o poder judiciário de Israel possui competência para julgar fatos delituosos ocorridos em territórios alegadamente ocupados pela Autoridade Nacional Palestina”.

Segundo o ministro-relator, a própria natureza do crime de tortura autoriza a flexibilização da regra geral da competência jurisdicional penal e a cada Estado cabe decidir e aplicar as leis pertinentes aos acontecimentos dentro do seu território. “Em matéria de delito de tortura abre-se a oportunidade para que os Estados-partes estabeleçam a sua própria jurisdição criminal, ainda que os delitos objeto de eventual pedido de extradição extrapolem os limites das respectivas fronteiras”, disse, citando a Convenção contra Tortura, da qual o Brasil é signatário.

De acordo com o governo de Israel, mais de 300 supostos criminosos de Beitar Illit foram julgados por autoridades israelenses sem que fosse levantada a hipótese de falta de competência para fazê-lo pelo fato de a cidade estar na Cisjordânia. Além disso, os crimes teriam sido cometidos por um cidadão israelense contra crianças da mesma cidadania – razão pela qual o Estado israelense sustenta que deve ser aplicado a ele o código penal vigente na nação, que dá direito de defesa aos réus, como a lei brasileira.

Violência e abuso

A Corte aceitou a extradição para que Hen responda pelos crimes de violência a menor ou pessoa incapaz, abuso a menor ou pessoa incapaz e conspiração para cometer crime – três delitos tipificados na lei penal brasileira. Ele é acusado de, na companhia de mais quatro pessoas, ter submetido oito crianças a intenso sofrimento físico e mental por supostamente estarem possuídos pelo demônio. Entre os métodos de tortura estão agressão física, espancamentos na cabeça, na face, queimadura nas mãos e diversos castigos. Um dos menores submetidos ao tratamento perdeu permanentemente a consciência e se encontra em estado vegetativo.

Por outro lado, Hen não poderá cumprir pena em Israel por incitamento à violência a menor ou pessoa incapaz e por incitamento a abuso de menor ou pessoa incapaz, já que essas duas condutas, embora sejam crime em Israel, não encontram tipicidade na lei penal brasileira.

A base da defesa de Hen foi o fato de o acordo que colocava Israel no controle das áreas palestinas ter expirado e que, nas atuais circunstâncias, o território passa por uma guerra civil, o que levaria à aplicação da Convenção de Genebra, segundo a qual a legislação penal do território ocupado continuará em vigor e seus tribunais continuarão a funcionar.

Votaram no julgamento os ministros Ayres Britto, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso.

MG/LF

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